A Cargill, maior exportadora de soja e milho do Brasil, avalia que o setor de trading de commodities está sendo desafiado em 2022 pela alta de custos de combustíveis para o escoamento da produção, o que tende a reduzir a lucratividade, mas vê a demanda da China por grãos brasileiros como "sólida" e a margem de esmagamento no país sul-americano em um dos níveis mais altos da história.
Em entrevista à Reuters, o presidente da Cargill no Brasil, Paulo Sousa, disse ainda que a segunda safra de milho do país estimada para ser recorde em 2021/22 pode dar um impulso nos negócios. Mas a questão dos custos com combustíveis –o frete rodoviário em um país continental é chave para o setor– pode comprometer os resultados, algo que tem impactado o escoamento da colheita de soja, bem menor em função da severa seca no Sul, no último verão.
PUBLICIDADE
"A safrinha promete, mas as dificuldades de executar a safra de verão foram significativas, e grande parte da safrinha foi negociada no ano passado, quando não tinha a visão de frete (mais caro) que temos hoje. Não quero ser pessimista para o setor. Mas a realidade é que na nossa visão a execução geral da exportação neste ano é menos lucrativa do que no ano passado", disse Sousa.
O lucro da Cargill no Brasil registrou queda de 15% em 2021 na comparação com 2020, para R$ 1,8 bilhão, informou a empresa nesta segunda-feira (25), citando maior pressão de custos de operação, como energia mais cara e outros insumos industriais. Mas o principal fator, o "gigante" para a redução da lucratividade, foi a quebra de safra de milho no ano passado, disse Sousa.
"A redução no volume foi o principal fator que levou a uma redução no nossa lucratividade (em 2021). A situação normal é esperar: se cai o volume, cai também o custo variável, mas por conta das altas dos insumos os custos variáveis não caíram na mesma proporção que se esperava com a redução do volume", disse ele, explicando que o segmento precisa de grandes volumes para diluir seus custos.
Com a queda na safra de milho, atingida por seca e geadas em 2021, a redução geral dos volumes de grãos de exportação da Cargill em 2021 foi de 10%, disse o CEO. Em soja, com a colheita recorde do ano passado, a Cargill expandiu os embarques para o exterior em 2%, enquanto as exportações de farelo de soja pela empresa avançaram 17% –a companhia não revelou os totais gerais nem dados específicos da redução do milho.
A lucratividade foi menor em 2021 apesar de a Cargill ter superado pela primeira vez a marca de R$ 100 bilhões na receita operacional no Brasil, com aumento dos preços das commodities levando a um crescimento de aproximadamente 50% no faturamento ante 2020, para R$ 103 bilhões.
Segundo o presidente da Cargill no Brasil, mesmo com a safra de milho vindo boa, "o custo de execução está muito alto". "É algo que não afeta só a gente, em volumes, somos até mais afetados. Mas, pelo nosso tamanho e capilaridade, talvez nós tenhamos mais flexibilidade para tentar minimizar o impacto".
Ele apontou também alta nos custos de escoamento da soja, cujas vendas foram fortemente antecipadas pelo produtor no ano passado, enquanto os compradores não conseguiriam imaginar na época do fechamento dos negócios a disparada dos combustíveis em meio aos impactos da guerra na Ucrânia.
"Com isso, a execução da safra de verão, que está acontecendo, em termos de custos foi bem pior do que o setor planejava, quase seria um pesadelo em relação ao projetado o que está acontecendo agora."
Ele mencionou também que chuvas na colheita de soja do Centro-Oeste dificultaram o escoamento da produção neste início de ano, já marcado por perdas significativas pela seca no Sul.
"A safra começou mais arrastada pela chuva na colheita e acaba jogando mais combustível em um negócio que está pegando fogo, os valores de frete por conta da alta dos insumos para o transportador."
Dessa forma, o executivo avaliou que uma queda nas exportações de soja do Brasil estaria mais relacionada ao atraso nos fluxos para os portos e à redução da safra, e disse acreditar que a demanda da China segue "sólida". "A margem de esmagamento na China não foi tão boa, o chinês corretamente joga com isso, mas a demanda pela soja brasileira continua muito saudável."
Fonte: Folha SP