Indústria vai levar ao governo preocupações sobre investimentos bilionários em mineração e o risco de perda de mercado
SÃO PAULO - O movimento recente dos investidores chinesas em direção aos ativos minerais do Brasil, que anunciaram negócios de US$ 7 bilhões este ano, deixou os setores de siderurgia e mineração com o radar ligado. Esse será um dos temas do encontro do Grupo de Acompanhamento do Crescimento (GAC), formado por representantes de empresários e pelo governo, que acontece em Brasília no dia 18.
Entidades empresariais como a Confederação Nacional da Indústria (CNI) e o Instituto Aço Brasil (IABr) têm uma série de argumentos prontos para apresentar a Guido Mantega, ministro da Fazenda, Miguel Jorge, do Desenvolvimento, Sergio Rezende, de Ciência e Tecnologia, e Henrique Meirelles, presidente do Banco Central.
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Há quem defenda que a invasão chinesa é uma ameaça à soberania brasileira. Mas os riscos comerciais parecem ser o verdadeiro temor nacional. Ao explorarem o minério brasileiro, dizem os empresários, os chineses teriam condições de aumentar a produção de aço, da qual são líderes mundiais e vendê-lo no mercado internacional, inclusive no Brasil, a preços mais baixos.
Segundo Marco Polo de Mello Lopes, presidente executivo do IABr, o governo brasileiro deveria negociar com os chineses as mesmas condições encontradas pelas corporações nacionais na China. Empresas estrangeiras, por exemplo, não podem investir na exploração mineral no país asiático. No caso da compra de carvão metalúrgico (coque) usado nas siderúrgicas, o governo chinês sobretaxa as exportações em 40% para conter a possível falta da matéria-prima na China.
"Se o governo brasileiro quer deixar comprar mina no Brasil, é justo que haja reciprocidade", critica Lopes.
Para Marco Antônio Castello Branco, vice-presidente da Federação das Indústrias de Minas (Fiemg), ex-presidente da Usiminas, o pior cenário para o Brasil seria que "as empresas chinesas passem a deter uma importante posição na mineração nacional, exportem o minério a preços distorcidos e, para compensar as demandas políticas do governo brasileiro, construam usinas siderúrgicas para venderem aço no País com um sistema de precificação artificial (custo de capital negativo), levando à destruição dos produtores locais."
Dificuldades. Siderúrgicas como a Gerdau e a Villares já tentaram montar subsidiárias na China, sem sucesso. A Vale negociou a abertura de um centro de distribuição de minério de ferro e não conseguiu. "Eles não dizem não, mas demoram a responder. O tempo passa e chega uma hora que você desiste", conta José Carlos Martins, diretor de Marketing, Vendas e Estratégia da mineradora.
O executivo da Vale evita declarar rejeição ao capital estrangeiro na mineração. Afinal, a empresa está presente em cerca de 20 países e exporta 40% do minério para a China. Mas Martins concorda que haja reciprocidade. "No Canadá, por exemplo, é preciso passar por uma análise governamental antes de ter um investimento em mineração aprovado. Prefiro deixar para o governo avaliar se há risco de soberania", afirma.
Presidente da CNI, Robson Braga de Almeida faz parte do coro dos apreensivos. "Qual é o objetivo dos chineses que investem em minério e em terras para agropecuária no Brasil? Não está claro", alerta. "Posso supor que não vão investir nos produtos acabados no Brasil, mas extrair o minério, mandar para a China e exportar produtos acabados. Eles vão determinar os preços no mercado internacional", diz.
Governo. O Ministério de Minas e Energia informa que não há restrições ao capital estrangeiro. "Qualquer empresa de capital externo constituída no Brasil está em condições de igualdade com as de capital nacional, com exceção das áreas dentro da faixa de fronteira." Ainda segundo o ministério, o governo não estuda restrições aos investimentos estrangeiros em mineração.
A Vale, assim como as outras mineradoras, monitora os movimentos mais recentes. "Os projetos estão em fase embrionária, têm de ser desenvolvidos, o que não acredito que aconteça. Grande parte dos investimentos vai ser dinheiro jogado fora", diz Martins.
Segundo Martins, há muitas dificuldades no setor, mesmo para empresas que já estão na atividade há muito tempo. Além da demora para conseguir a licença ambiental do projeto, há o problema da falta de infraestrutura. "É preciso pensar na logística para escoamento da produção, com ferrovia, porto. O que temos foi construído para carregar o nosso minério", explica. Em outras palavras, quem quiser explorar a atividade mineral que invista na própria infraestrutura.
O subsecretário de Mineração e Metalurgia do governo de Minas, Paulo Sérgio Machado Ribeiro, classifica a presença chinesa em ativos minerários do País como um "movimento incipiente". Para ele, "uma verticalização dentro do Brasil não é algo tão ruim". "Hoje no Brasil não há descriminação quanto à origem do capital."
Mais apostas. Para quem está nos bastidores das negociações a onda chinesa está apenas começando. Rodrigo Maciel, sócio da consultoria Strategus, tem no momento dois mandatos de grupos chineses interessados em mineração. O advogado Reinaldo Ma, do escritório Felsberg & Associados, é especialista nos contratos com chineses e atualmente trabalha com quatro clientes na área. "Além disso temos outros três potenciais clientes e inúmeras consultas sobre mineração no Brasil", conta. Além do minério de ferro, preferência número um , os asiáticos começam a sondar as jazidas de manganês.
"Minha posição é a participação chinesa seja minoritária, o empreendimento deve ser financiado pela integralização total de capital chinês (sem financiamento do BNDES), e as máquinas e equipamentos devem ser adquiridos de fornecedores locais", diz Castello Branco.
(Fonte: O Estado de S. Paulo/Paula Pacheco, Colaborou Eduardo Kattah)