A CNI (Confederação Nacional da Indústria) tenta frear na Justiça o poder de investigação da SDE (Secretaria de Direito Econômico), braço do Ministério da Justiça que apura práticas contra a livre concorrência.
Os empresários dizem, em ação direta de inconstitucionalidade ajuizada no STF (Supremo Tribunal Federal), em outubro, que as regras representam "coação política".
Seriam também uma "afronta ao desenvolvimento do setor industrial, cuja atuação é cercada por alto grau de incerteza jurídica quanto à privacidade e ao sigilo de suas atividades e dados".
Desde 2000, a SDE tem o poder de, sem mandado judicial, entrar nos escritórios de empresas investigadas em processos administrativos e fazer cópias de documentos ou arquivos eletrônicos. Até e-mails já foram copiados.
O material acaba servindo de base para condenações posteriores no Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica), instância que julga os casos de cartel.
Para a inspeção, basta um "despacho fundamentado" por parte do secretário de Direito Econômico e aviso com 24 horas de antecedência à empresa investigada. Caso resista, fica sujeita à multa de até R$ 425 mil e à ação de busca e apreensão posterior, mediante ordem judicial.
A intenção de acabar com esse poder da SDE também se manifestou no Senado. O projeto de lei que reestrutura o sistema de defesa da concorrência foi aprovado no plenário da Casa em dezembro, embora ainda tenha de voltar à Câmara para nova rodada de votações.
A redação inicial do texto mantinha o poder de inspeção da SDE. Mas emenda do senador Wellington Salgado (PMDB-MG) excluiu o artigo.
Em plenário, os senadores endossaram a mudança.
O argumento, semelhante ao das empresas, é que as inspeções devem estar amparadas em ordem judicial.
O embate entre a CNI e os órgãos antitruste pode representar a primeira grande polêmica do governo Dilma com a indústria. Em novembro, foi empossado o novo presidente da CNI, Robson Andrade, próximo ao senador Aécio Neves (PSDB-MG).
PORTO SEGURO
O curioso é que, dois dias depois da aprovação no Senado, chegou ao STF um parecer da advocacia da própria Casa em defesa da manutenção do poder da SDE. O documento afirma que uma eventual mudança significaria um "porto seguro para a atuação irregular de empresas (...), permitindo que formadores de cartéis pudessem se beneficiar da exigência de ordem judicial para (...) se livrar do que indevidamente estivesse no estabelecimento antes da execução do mandado".
A Presidência da República, por meio da AGU (Advocacia-Geral da União), também já apresentou ao STF a defesa em favor da SDE.
Entre as justificativas, afirma que uma eventual decisão favorável à indústria pode disparar um efeito dominó em outros órgãos com poderes de inspeção, como Ibama e Receita Federal.
O gerente-executivo do departamento jurídico da CNI, Cássio Borges, diz que a ação foi movida a partir de uma demanda da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo), atendendo a reclamações de associados.
"A SDE vinha fazendo isso largamente, e a Fiesp detectou o aumento de casos nos últimos anos", afirma.
A secretaria diz não ter estatísticas sobre número de processos em que o poder de inspeção foi usado.
Fonte: Folha de São Paulo/BRENO COSTA/DE BRASÍLIA/Colaborou MÁRIO SÉRGIO LIMA
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