A Cbic (Câmara Brasileira da Indústria da Construção) apresentará à Camex (Câmara de Comércio Exterior) nos próximos dias um pedido formal para a redução do imposto para a importação de produtos feitos em aço.
A solicitação já tinha sido apresentada ao Ministério da Economia, a quem a Camex é vinculada, mas não foi discutida.
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A proposta do setor é de uma redução de 12% para 1% da tarifa de importação por seis meses, com a possibilidade de renovação por igual período.
A expectativa das construtoras é a de que a medida possa aumentar a oferta e, com isso, criar pressão por preços menores no mercado interno. Produtos como vergalhões e bobinas acumulam altas de 68% e 76%, respectivamente, em 12 meses.
“Precisamos de um choque de oferta, ou a situação só vai se reequilibrar pela redução da demanda, que virá pela quebradeira geral”, diz José Carlos Martins, presidente da Cbic.
Na rede de distribuição, segundo o Inda (Instituto Nacional dos Distribuidores de Aço), a alta acumulada até maio está entre 50% e 52% e as usinas já comunicaram que novos reajustes para junho e julho estão em estudo.
Na CSN (Companhia Siderúrgica Nacional), fontes da empresa disseram ao Valor que haverá novo aumento, de 15%, divididos em junho e julho.
Até o início do ano, as construtoras também relatavam dificuldade de abastecimento ou prazos muito longos para entregas. O Sinduscon-SP (sindicato da indústria do setor) divulgou uma carta na semana passada defendendo a repactuação de contratos públicos e privados.
Mesmo com o abastecimento normalizado, os atrasos registrados entre o terceiro e quarto trimestres do ano passado exigiram cronogramas mais longos de obras, segundo a entidade.
“O desabastecimento de alguns desses insumos diminuiu a produtividade das obras, alongou os cronogramas de execução e acarretou mais custos.”
Já a Aço Brasil, entidade que representa as siderúrgicas, afirma que não há desabastecimento. Em abril, o setor registrou produção de 3,1 milhões de toneladas de aço bruto, o melhor resultado desde outubro de 2018, e 59,3% superior ao registrado no mesmo período de 2020.
Ainda que a comparação com o ano passado se refira a um período de queda brusca na produção –era o início da pandemia–, o presidente executivo da Aço Brasil, Marco Polo de Mello Lopes, diz que os resultados do quadrimestre demonstram que a produção siderúrgica em 2021 já supera o pré-pandemia.
As vendas internas, de janeiro a abril, registraram alta de 40,5% em relação ao mesmo período de 2020.
A produção de laminados, que abastece as indústrias de automóveis, naval e de construção civil, foi de 2,3 milhões de toneladas, 77,4% superior à registrada em abril de 2020. Os setores de construção, bens de capital e veículos consomem 82,2% do aço produzido no Brasil.
No caso das obras, os principais produtos são os longos, que as grandes construtoras compram diretamente nas usinas.
A Aço Brasil diz que não discute preços, uma vez que as siderúrgicas são livres para agir conforme o mercado, mas não ignora que os produtos siderúrgicos estejam mais caros.
“Abastecimento tem. Em relação ao preço, a gente não fala porque isso cabe às empresas, mas nós temos que lembrar que nossas matérias-primas subiram 147%”, diz Marco Polo.
O presidente-executivo da Aço Brasil afirma ainda que, enquanto produtos muito utilizados em obras, como as bobinas, tiveram alta de 76% no Brasil, o mesmo produto subiu 125% em dólar no mercado doméstico nos Estados Unidos.
“Os preços estão subindo no mundo todo. Deve normalizar em algum momento. Há um ano, a tonelada de minério estava abaixo de US$ 100. Semana passada, a cotação chegou a US$ 237. É um novo ciclo das commodities.”
Para o dirigente da entidade, relatos de desabastecimento podem estar ligados ao que ele chama de estoque defensivo ou especulativo, nos quais as distribuidoras estariam aumentando o volume de compra para evitar aumentos de preços. “Como há volatilidade nos preços, pode ser que, na ponta, haja quem esteja fazendo esse tipo de estoque, até para se proteger.”
A estocagem estaria, segundo ele, no mercado de distribuição. Algumas siderúrgicas têm lojas próprias, de fábrica, mas a maioria é independente e atende consumidores que não conseguem escala suficiente –acima de 500 toneladas por negociação– para a compra direta.
O cálculo que ele faz considera o fato de a indústria siderúrgica ter aumentado a produção e reduzido as exportações, ao mesmo tempo em que a atividade econômica ainda não se recuperou e, mesmo a construção civil, que vai bem, não cresceu o suficiente para que haja um desequilíbrio.
Para Carlos Loureiro, presidente-executivo do Inda, que representa os distribuidores, a formação de estoques faria sentido se os preços estivessem muito baixos, o que permitiria aos distribuidores a proteção de altas futuras.
Na avaliação dele, esse comportamento pode estar vindo da indústria, de setores com uso intensivo de aço e que, na falta de material, correm o risco de paralisar a produção.
A previsão da Inda é que o estoque da rede de distribuição fique em 2,2 meses em maio deste ano, praticamente estável em relação ao mês anterior, quando estava em 2,1 meses. Desde dezembro de 2020, quando ficou em 2,3 meses, o indicador de disponibilidade de produtos ficou entre 2,1 meses e 2,2 meses.
Segundo a entidade, os distribuidores compraram, no quadrimestre, 27,3% mais do que no mesmo período do ano passado. Nesse mesmo intervalo, a indústria siderúrgica vendeu 43,7% mais, também em relação a 2020. Essa diferença entre os dois indicadores, diz Loureiro, vem do que é vendido diretamente para a indústria, nas usinas.
Para a Cbic, da indústria da construção, é improvável que, entre as construtoras, alguém esteja conseguindo estocar produtos em aço. Ele não descarta, porém, que alguma opte por aumentar o nível de estoque no mês que antecede um novo reajuste, por exemplo. “Estamos lidando com aumentos quase mensais. Fica um desespero”, diz Martins.
Neste ano, segundo os relatos dos construtores, houve pelo menos três aumentos de preços acima de 15%.
O representante das construtoras diz que o setor não ignora os níveis de preços das matérias-primas, como no caso do minério de ferro, mas se vê como vítima de medidas de proteção reivindicadas por outros segmentos da indústria nos últimos anos.
Apesar do pleito pelo barateamento das importações, Martins diz que essas compras também são afetadas por medidas protecionistas. “É muito difícil importar. Para trazer aço da Turquia, por exemplo, você tem que criar uma marca, o produto tem que sair de lá carimbado. Enfrentamos um monte de barreiras técnicas.”
Ainda assim, segundo estatística levantada pela Aço Brasil, 1,1 milhão de toneladas de aço foram importados de janeiro a abril deste ano. O comércio exterior de produtos planos e longos respondeu por 12,8% do consumo no quadrimestre.
Outras matérias-primas começam a arrefecer os preços, segundo a Cbic, como é o caso do cimento. Além do aço, a construção civil relata ainda enfrentar dificuldade com PVC e cobre. Esse último é negociado em dólar e não tem similar nacional.
Fonte: Folha SP