A tragédia de Brumadinho, que completou dois meses nesta semana, tornou difícil fazer qualquer previsão sobre a produção da Vale em 2019. O desastre, ocorrido em 25 de janeiro, tem dois efeitos contrários para a mineradora. Por um lado, reduz os volumes produzidos. Ontem a Vale confirmou que depois da ruptura da barragem a produção anualizada da empresa sofreu redução de 92,8 milhões de toneladas, quase um quarto da estimativa originalmente prevista para este ano, que era de 400 milhões de toneladas. Agora ninguém sabe dizer ao certo quanto a Vale vai produzir. O corte se traduziu, por sua vez, em aumento de US$ 11 por tonelada nos preços à vista do minério com 62% de teor de ferro na China - o mercado de referência - no primeiro trimestre em relação ao quarto trimestre de 2018. É aí que entra o segundo efeito de Brumadinho para a Vale e que consiste na perspectiva de uma geração de caixa maior neste ano como resultado dos preços mais altos da commodity.
Faltando poucos dias para terminar março, o preço médio do minério com teor de ferro de 62% no mercado à vista da China é de US$ 82,5 por tonelada no acumulado do primeiro trimestre, 19% acima da média do preço para o mesmo produto no ano de 2018, de US$ 69,5 por tonelada. Na comparação com a média do quarto trimestre, a alta é de 15%. O aumento é resultado do corte de produção da Vale, a maior produtora de minério de ferro do mundo.
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Embora o mercado ainda não disponha de informações sobre qual deve ser a produção efetiva de minério de ferro da companhia no ano, o novo cenário de preços pós-Brumadinho leva bancos a rever projeções para o lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização (Ebitda). O BTG estimou ontem que a Vale está operando entre US$ 3 bilhões e US$ 3,5 bilhões acima do cenário base do banco antes de Brumadinho, e que considerava um Ebitda da ordem de US$ 20 bilhões no ano. Há outros bancos que ainda não fizeram a revisão e que trabalham com Ebitda para a Vale na faixa de US$ 17 bilhões em 2019. No acumulado de nove meses de 2018, o número era de US$ 12,2 bilhões. Em 2017, o Ebitda da mineradora foi de US$ 15,3 bilhões, com alta de 28% sobre o ano anterior.
Hoje serão conhecidos os números da Vale referentes a 2018. O balanço financeiro, a ser divulgado depois do fechamento da B3, irá refletir a situação operacional da empresa pré-Brumadinho e, portanto, são números que não representam, integralmente, a situação da mineradora pós-desastre. Um analista disse que se o balanço for bom permitirá indicar que, no primeiro trimestre de 2019, a situação contábil da empresa deverá continuar confortável uma vez que o aumento nos preços do minério de ferro tende a compensar a perda de produção de janeiro a março deste ano, que ainda não será tão relevante.
Hoje a Vale deve apresentar resultados operacionais consistentes relativos ao quarto trimestre de 2018. O desempenho será apoiado por melhores preços do minério de ferro. Oito bancos e corretoras ouvidos pelo Valor projetam receita média de US$ 9,89 bilhões para a Vale no quarto trimestre de 2018, alta de 8% sobre os US$ 9,16 bilhões de igual período de 2017.
As instituições projetam ainda lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização (Ebitda) de US$ 4,61 bilhões, em média, no quarto trimestre do ano passado, com alta de 12% sobre outubro-dezembro de 2017. Naquele período, o Ebitda da Vale foi de US$ 4,1 bilhões. O lucro líquido médio da mineradora, projetado pelos oito bancos, é de US$ 2,73 bilhões, alta de 254% sobre US$ 771 milhões obtidos no quarto trimestre de 2017. Naquele período, houve efeitos de variações cambiais e monetárias sobre o resultado, além de baixas contábeis.
A maior projeção de receita prevista para a Vale na amostra é do banco J.P. Morgan, que estimou faturamento de US$ 10,7 bilhões para a mineradora no período outubro-dezembro de 2018. A menor projeção, por sua vez, é a da corretora Itaú BBA, de US$ 9,52 bilhões. O maior Ebitda estimado para a Vale no quarto trimestre é do banco Scotia, de US$ 5 bilhões. E o menor número parte do Morgan Stanley, de US$ 4,41 bilhões. No lucro líquido, a maior projeção é do J.P. Morgan, de US$ 3,2 bilhões enquanto a menor estimativa é a do Santander, com US$ 2,1 bilhões (ver quadro acima).
Permanece a dúvida no mercado, porém, se a mineradora poderá fazer algum provisionamento, no balanço do quatro trimestre, relacionado aos eventos de Brumadinho, o que teria efeitos sobre o resultado do exercício. Normalmente os analistas têm dificuldades de prever se a companhia fará provisões no balanço e, se de fato isso ocorrer, a estimativa de lucro no balanço da mineradora pode se transformar em prejuízo. Tradicionalmente, a Vale costuma fazer provisões no quarto trimestre.
No relatório de produção do período outubro-dezembro do ano passado, a Vale informou que a venda de finos de minério alcançou 80,5 milhões de toneladas, com queda de quase 4% sobre o terceiro trimestre. Essa redução foi motivada, como explicou a companhia, por vendas que foram "deliberadamente" postergadas para o primeiro trimestre de 2019 para fins de "otimização de margens". Os dados de 2018 mostraram ainda uma produção total de minério de ferro de 384,6 milhões de toneladas, muito próximo da meta de produção para o ano (390 milhões de toneladas).
Fonte: Valor