Para dar continuidade às obras da ferrovia da Transnordestina Logística a partir de março do próximo ano, os acionistas da empresa, que tem a Companhia Siderúrgica Nacional (CSN) como controladora, têm pela frente o desafio de garantir R$ 836 milhões em recursos.
As obras foram retomadas em setembro deste ano, conforme noticiou o Valor à época. Atualmente, está em andamento a construção de dois trechos da ferrovia, com investimentos de R$ 257 milhões da CSN.
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O empreendimento, que é de interesse do governo federal, vem sendo construído aos solavancos desde 2006, pois os recursos públicos previstos foram muitas vezes suspensos. O orçamento inicial dos 1.750 km de extensão, já mais que duplicou desde então. Já foram gastos cerca de R$ 6,5 bilhões e a estimativa da empresa é que faltariam ainda R$ 7 bilhões para concluir toda a obra.
A Transnordestina é uma ferrovia desenhada para unir o interior do Piauí, em Elizeu Martins, cortando os estados de Pernambuco e Ceará, desembocando nos portos de Suape (PE) e Pecém (CE). Pouco mais da metade da obra foi realizada até agora.
Segundo apurou o Valor com uma fonte conhecedora do empreendimento, os investimentos na obra estão sendo alocados em sete lotes - quatro deles no Piauí, num trecho de 200 km, e três lotes no Ceará, ao longo de 150 km. A prioridade, no momento, explicou a fonte, são obras de infraestrutura - abertura de frentes no trajeto e preparação do terreno para ser a base de recebimento futuro dos dormentes e trilhos.
Atualmente, nessas obras, estão empregadas cerca de 1,2 mil pessoas, com 500 máquinas e equipamentos mobilizados, segundo informação da CSN. O lançamento de trilhos sobre o terreno e mais obras de artes especiais, como túneis e viadutos, virão nas fases posteriores.
O último entendimento entre a CSN e o governo, tendo à frente o Ministério da Infraestrutura, é que a obra, ao menos no trecho Elizeu Martins-Pecém, seja concluída até o fim de 2022, para criar um corredor logístico na região Nordeste do país.
Para garantir o orçamento de 2020, de forma a não paralisar outra vez as obras da ferrovia, duas fontes previstas de dinheiro são o Finor e o FDNE, informou a fonte. No primeiro caso, o objetivo é a liberação de R$ 307 milhões, na forma de debêntures.
“Esses recursos fazem parte de fundo de financiamentos de projetos com parcela de lucros das empresas, quando eles fossem aprovados. Ou seja, não são recursos do Tesouro”, diz. No segundo caso, informa a fonte, trata-se de um saldo já liberado, de R$ 811 milhões, do fundo do FDNE, administrado pelo Banco do Nordeste do Brasil (BNB).
Para ambos os casos, a liberação desses recursos passa pelo crivo do Tribunal de Contas da União (TCU), que suspendeu, em 2017, qualquer liberação de dinheiro para a Transnordestina dos cofres do Tesouro. Na ferrovia, são sócias da CSN a estatal Valec e a BNDESPar, empresa de participações acionárias do BNDES.
O TCU somente irá rever sua posição após uma análise completa da ANTT, agência reguladora do setor, do projeto revisado de toda a obra, de acordo com a regulamentação pública (com base nas tabelas do Dnit). Esse projeto consolidado foi entregue à agência apenas no dia 19 de dezembro, segundo a ANTT. A análise desse tipo de documento leva, em média, 90 dias, mas diante da complexidade do empreendimento o prazo deverá ser maior.
Para destravar a obra da ferrovia foi proposto pelo governo separar um trecho em Pernambuco - de Custódia a Suape, que corta a região metropolitana do Recife - e repassá-lo, inicialmente, para a Valec e, futuramente, para outro concessionário. Isso tiraria R$ 3 bilhões dos investimentos nesse trajeto e a ideia parece ter agradado à CSN. Mas, mesmo sendo para a Valec, o trâmite depende de análise regulatória a cargo da agência reguladora.
Questionada pela reportagem sobre o assunto, a ANTT afirmou que “não há nenhum tipo de consulta formal, até o presente momento, relativa à devolução do trecho de Pernambuco”.
Para finalizar a ligação de Elizeu Martins-Pecém, em 2021, seriam necessários mais R$ 2 bilhões. Esses recursos seriam usados no trecho restante do Ceará em direção ao porto. Mais R$ 1 bilhão estariam previstos para as grandes obras de arte ao longo dos trilhos nos atuais lotes e nos trajetos restantes da ferrovia.
É para essa fase (2021-2022), segundo a fonte, que a entrada de um parceiro pode se viabilizar. Esse sócio, inclusive, poderia trazer uma parte importante do empreendimento: material rodante - locomotivas e vagões.
O governo tem pressionado fortemente a concessionária para encontrar um parceiro que viabilize o projeto, com financiamento privado, segundo pessoas que acompanham a discussão.
A empresa vem conversando com potenciais interessados em entrar no projeto, tanto grupos chineses como italianos. Estes últimos teriam o apoio da Sace, agência de fomento da Itália. “Essas negociações podem ganhar ritmo acelerado à medida que o projeto revisado for aprovado pela ANTT e a obras avançarem, dando mais segurança para os investidores”, ressaltou a fonte.
Em paralelo a essas discussões, a agência reguladora conduz um processo que apura o descumprimento de obrigações contratuais, que, em última instância, poderia levar à caducidade da concessão. Com a análise técnica sobre o tema concluído, o processo já se encontra na etapa de análise e deliberação pela Diretoria Colegiada da ANTT, segundo o órgão regulador.
Fonte: Valor