Só nos oito primeiros dias úteis de novembro, o preço do alumínio para fabricação de latas disparou 5,52% no mercado internacional. Também este mês, o açúcar já subiu 12,85% e o cacau 1,80%. O trigo, por sua vez, tem alta acumulada de 40,97% no últimos 12 meses. "É de deixar qualquer um maluco", disse Ivan Zurita, presidente da Nestlé Brasil, em entrevista recente ao Valor. Segundo o executivo, a variação de preço das commodities tem sido o maior desafio da indústria de alimentos e bebidas este ano. Para driblar essa escalada de preços, muitas empresas estão investindo no aumento de seus estoques e no que chamam de "hedge" de insumos. Nestlé, Kopenhagen, Velho Barreiro, Ambev, Vilma Alimentos, Pastifício Selmi, entre outras, são algumas das companhias adeptas dessa estratégia.
A mineira de Contagem Vilma Alimentos planeja comprar ainda este mês 80 mil toneladas de trigo argentino - o suficiente para garantir a produção até o fim de agosto de 2011. O volume é dez mil toneladas superior ao que a empresa adquiriu entre janeiro e outubro deste ano. Com uma produção de 6,5 mil toneladas mensais de macarrão, produto em que a farinha de trigo corresponde a 75% do custo, a Vilma também dobrou o seu nível de estoque de açúcar para o fim do ano, comprando 3 mil toneladas para a sua linha de mistura para bolos.
"Com a derrama de dólares na economia americana, o deslocamento de investidores para o mercado de commodities deve ser ainda maior e resolvemos adiantar o nosso processo de compra", disse o vice-presidente da Vilma, Cesar Tavares, se referindo à compra de títulos da dívida dos Estados Unidos por US$ 600 bilhões, anunciada na semana passada. "Difícil é encontrar quem queira vender, já que a perspectiva para os próximos meses é de alta", acrescentou .
O mercado do trigo já vinha em alta ao longo do ano em função da quebra das safras na Rússia, Cazaquistão e Ucrânia que derrubou a previsão da produção mundial em 5,5%. Neste semestre, a cotação da commodity subiu 37,16%. Problemas de produção na Índia também impulsionaram a alta do açúcar, que acumula elevação de 20,10% de janeiro até esta semana.
Estocar também tem sido a estratégia de empresas de menor porte, como a fábrica de pão de queijo Forno de Minas, também de Contagem. A empresa está multiplicando por cinco sua capacidade de estocagem de insumos. "Vamos poder estocar 2,5 mil toneladas de fécula de mandioca [principal insumo para o pão de queijo] e 600 toneladas de trigo a partir de fevereiro", disse Helder Couto Mendonça, presidente da Forno de Minas. A empresa, que fatura R$ 5 milhões mensais com a produção 600 toneladas de pão de queijo , investiu R$ 4 milhões em armazenagem. "Só no caso da mandioca, a alta foi da ordem de 60%, em função da seca no Paraná", afirmou.
A Ambev, maior fabricante de cerveja do país, também enfrenta problemas com insumos, tanto os usados para a fabricação da bebida, quanto os utilizados para embalagem, no caso, o alumínio das latas. "Os 'hedges' de açúcar e os maiores custos de embalagens em relação ao mesmo período do ano anterior impactaram nosso resultado", disse Nelson Jamel, diretor financeiro e de relações com investidores da cervejaria na semana passada, durante a teleconferência de resultados do terceiro trimestre da companhia.
O 'hedge', diz Ricardo Selmi, presidente do Pastifício Selmi, é uma espécie de compra adiantada de insumos, por um preço fixo. É mais usado no caso de commodities importadas, como o trigo argentino. "Aumentamos a carteira de compras, recebendo fisicamente em etapas pré-programadas. Assim, travamos pelo menos o efeito cambial", afirma. A fabricante das marcas Renata e Galo de macarrão também eleva seus estoques de trigo e açúcar, conforme a espectativa de alta dos preços. Os volumes podem chegar a 20 mil toneladas das duas matérias-primas.
Na Kopenhagen, fabricante de chocolates, o problema é o cacau. "Como boa parte do produto vem da África, de países em conflito armado, vira e mexe acontece de fecharem um porto e o cacau não chegar", diz Fernando Vichi, vice-presidente financeiro da companhia. A Kopenhagen, segundo ele, faz compras adiantadas em até 12 meses, para se proteger dessas ocorrências.
Já a Velho Barreiro tem tradição em estocar insumos. "Fazemos isso há 50 anos, porque dependemos da safra de açúcar. Se algo dá errado, temos como nos virar", diz César Rosa, presidente das Indústrias Reunidas de Bebidas Tatuzinho, dona da marca Velho Barreiro. Quando a cotação do açúcar sobe muito, os estoques reguladores também ajudam a atenuar o repasse para o preço final do produto. "Fazemos uma média e repassamos a diferença aos poucos." O mesmo acontece quando a cotação cai.
Fonte: Valor Econômico/César Felício e Lílian Cunha | De Belo Horizonte e São Paulo
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