Deve ficar entre US$ 16 bilhões e US$ 18 bilhões neste ano o saldo comercial brasileiro - a diferença entre exportações e importações do país, previu o ministro do Desenvolvimento, Miguel Jorge, ao comentar, para o Valor, a demanda do presidente em exercício da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), Benjamin Steinbruch, de novas barreiras a produtos importados. "São estimativas extra-oficiais", alertou o ministro, que não costuma fazer previsões sobre o saldo do comércio exterior. Ele rejeitou enfaticamente o pedido de "fechamento" da economia.
Jorge diz que os empresários preocupados com a concorrência desleal estrangeira deveriam questionar na Justiça o que ele considera "uma aberração": as vantagens fiscais concedidas por Estados como Santa Catarina e Espírito Santo para importação de mercadorias. É a decisão de reduzir o ICMS para 2% a responsável pelo acúmulo de estoques de aço em Santa Catarina, motivo de queixas de Steinbruch, comentou Jorge. "Os empresários deveriam se organizar e combater essa guerra fiscal que favorece importados, inclusive com medidas judiciais", critica o ministro.
Para o secretário de Comércio Exterior, Welber Barral, as queixas da Fiesp juntam problemas diferentes enfrentados pelos produtores brasileiros, nenhum deles solucionável com o aumento de tarifas de importação. "Não adianta fechar a economia", diz Barral. "Contrabando não se resolve com tarifa mais alta; fraudes, subfaturamento, contrabando se combatem com fiscalização", enumerou o secretário.
"Tem, ainda, distorção tributária nos Estados que reduzem o ICMS e um problema grave, que é o acúmulo de créditos não devolvidos aos exportadores", acrescentou Barral. Nesta semana, uma empresa do setor de papel comunicou ao Ministério do Desenvolvimento ter desistido de um investimento de US$ 500 milhões devido ao alto custo do ICMS. Os custos para levar uma tonelada de papel da Europa à Argentina chegam a US$ 40; para levar a mesma quantidade aos portos argentinos, saindo do Paraná, os custos sobem para US$ 120, compara Barral, citando dados levados pelos industriais ao governo.
Miguel Jorge e Welber Barral reconhecem que a valorização do real em relação ao dólar também desequilibra a competição em prejuízo aos produtores nacionais. "Apesar disso, se pegarmos o coeficiente de importação do Brasil, ele ainda é mais baixo que em países comparáveis", argumenta Miguel Jorge, exibindo um gráfico montado pelo ministério, segundo o qual as importações representaram, nos últimos anos, entre 9% a pouco mais de 11% do Produto Interno Bruto.
Mesmo a Argentina, após passar de 14,7% em 2004 para 17,5% em 2008, chegou a 12,6% com a crise no ano passado, nota o ministro. No México, está acima de 27,5% a proporção de importações em relação ao PIB, relação considerada um indicador importante da abertura da economia. E, na África do Sul, esse indicador ficou acima de 25%, após chegar a 36% em 2008.
"Temos o problema do câmbio", admitiu Barral. "Mas a proporção de bens de consumo importados é pequena, 17% do total", argumenta. "Não temos número significativo de setores ameaçados pelo aumento de importação", garante Miguel Jorge. "Quando vem aqui um setor ameaçado, em geral é subfaturamento ou fraude", complementou Barral, lembrando o caso de produtos como escova de cabelo ou óculos (estes últimos contrabandeados em quantidade equivalente a 70% do mercado nacional). "Ou falta de competitividade", critica o ministro.
Miguel Jorge nega que a competição estrangeira esteja gerando estoques de produtos sem mercado no país. O ministro e o secretário de Comércio Exterior garantem que, em novembro, deve entrar em funcionamento o novo sistema integrado de registro de exportações, que dará maior agilidade e reduzirá custos burocráticos nas vendas ao exterior. O governo, lembram eles, acelerou as barreiras anti-dumping, reforçou as alfândegas para fazer "valoração aduaneira" (estabelecimento de preços mínimos para tributar importações), aumentou gradativamente as alíquotas das autopeças e editou medida para reprimir a circunvenção - fraude para contornar barreiras anti-dumping, vendendo produtos chineses ao Brasil, por exemplo, como se fossem fabricados no Vietnã.
"Agora há importadores reclamando da medida anti-circunvenção; se estiverem importando mesmo de fábricas do Vietnã, não têm do que se preocupar", diz o ministro. "Mas quem estiver trazendo produto da China como se fosse da Malásia tem de se preocupar mesmo, vai sair do mercado".
Barral cita o exemplo do gradualismo nas autopeças como demonstração de que o governo dá prioridade à "previsibilidade" nas ações de comércio exterior. "O Brasil não entra em aventuras", diz ele. "É uma decisão do presidente da República; não cogitamos medidas fora de nossos compromissos com os tratados internacionais e a Organização Mundial de Comércio", endossa o ministro.
O diretor-titular do Departamento de Relações Internacionais e Comércio Exterior (Derex) da Fiesp, Roberto Giannetti da Fonseca, diz que Steinbruch foi mal interpretado pelos que o acusam de defender o protecionismo. "Benjamin não fala em voltar ao protecionismo geriátrico dos anos 80, faz uma defesa da industria por não estarmos em uma conjuntura competitiva, de cambio, tributos, logística e capital", argumenta Giannetti, que acusa o Ministério da Fazenda de impedir medidas de redução de tributos que prejudicam os produtores nacionais na competição com os importados.
A Fiesp apoia algumas reivindicações de aumento de tarifas, como a dos fabricantes de máquinas e equipamentos para a indústria, que querem elevar as tarifas de 16% para 35%, como forma de se proteger dos concorrentes chineses. "Teremos um déficit no setor de manufaturados de US$ 60 bilhões neste ano; em 2006 era um superávit de US$ 5,9 bilhões", critica, em referência ao estudo da Fiesp que considera o total das exportações e importações do setor industrial.
Fonte: Valor Econômico/ Sergio Leo, de Brasília
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