A guerra entre Rússia e Ucrânia deverá agravar e prolongar a crise na cadeia logística global, que se arrasta desde o início da pandemia. Com isso, o cenário de congestionamento em portos, falta de contêineres, atrasos de navios e fretes pressionados deverá persistir em 2022.
Há alguns meses, a expectativa era que a situação melhorasse durante a baixa temporada deste ano (de janeiro a março). Havia uma projeção de que, durante este período de menor demanda, as filas fossem reduzidas e houvesse a liberação de 12% a 15% da capacidade global de contêineres, que atualmente está “presa” em congestionamentos portuários, afirma Leandro Barreto, sócio da consultoria Solve Shipping.
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Essas perspectivas, porém, foram frustradas. As novas ondas da variante ômicron, em janeiro, já vinham gerando atrasos nas operações e, agora, com a guerra, a previsão volta a ser de caos na logística global neste ano.
“O mercado está com tolerância zero a qualquer tipo de imprevisto. Em 2021, o setor já teve problemas na baixa temporada, como o bloqueio do Canal de Suez e os ‘lockdowns’ na China. Neste ano, novamente tivemos ‘lockdowns’ e, agora, a guerra. Em suma, o mundo entra em 2022 sem perspectiva de resolver os congestionamentos antes da volta da temporada alta”, afirma Barreto.
Os principais grupos de navegação já suspenderam as reservas de carga para importações e exportações da Rússia - algumas empresas mantiveram operações parciais para transportar bens essenciais. Muitos portos também não estão recebendo as embarcações russas.
Porém, como se tratam de viagens longas, há uma série de navios em trânsito, que deixaram os locais de origem antes da declaração das sanções, e que provavelmente não conseguirão completar a viagem. A situação deverá gerar uma nova onda de filas nos portos e armazéns. Há expectativa de problemas principalmente no Norte da Europa, onde é feito o transbordo das cargas russas. As viagens de contêineres entre Brasil e Rússia, por exemplo, passam pelos portos europeus.
Por ora, a extensão dos impactos da guerra na cadeia logística é pequeno, mas tudo vai depender das sanções impostas à Rússia pela Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte), avalia Luigi Ferrini, vice-presidente sênior da Hapag-Lloyd no Brasil.
“Se o conflito se resolver amanhã, a situação será tranquila. Já se houver sanções como as impostas ao Irã os problemas se agravam, porque vai mudar a configuração do mercado de commodities no mundo, de produtos como o trigo. Vai depender também dos países que vão aderir [aos boicotes]”, afirma o executivo. “É um novo problema mundial que surge, justamente quando achávamos, de novo, que a situação ia melhorar”, diz.
Para o comércio brasileiro, a expectativa é que os efeitos negativos da guerra se darão no médio prazo, avalia Marcella Cunha, diretora-executiva da Abol (Associação Brasileira de Operadores Logísticos). No caso da importação de fertilizantes - principal produto comprado da Rússia -, as empresas de logística já veem uma leve redução dos pedidos, mas a percepção é que não haverá impacto de imediato ao agronegócio. “Gera uma insegurança, caso a guerra perdure. Mas esse peso deverá vir mais nas safras de verão, em outubro”, diz ela.
Os operadores logísticos também já perceberam uma queda nos pedidos de itens exportados à Rússia e à Ucrânia, como carnes e amendoim, mas a previsão também é de efeitos mais significativos no médio e longo prazo, a depender da extensão das sanções.
Para o Centronave, entidade que reúne as grandes companhias de navegação, a preocupação mais evidente neste momento é o “rápido aumento dos custos de combustíveis”, diz Claudio Loureiro de Souza, diretor-executivo da associação, em nota.
Trata-se de um efeito que impacta todo o setor logístico, desde navios de longo curso até caminhões que abastecem a demanda interna. Os operadores já vêm sofrendo com a disparada do preço de combustíveis desde o ano passado, e a tendência é que o problema persista em 2022.
Já quanto ao preço dos fretes marítimos, já bastante pressionados, não há expectativa de que a guerra provoque um grande aumento, afirma Ferrini, da Hapag-Lloyd. Barreto, da Solve Shipping, também compartilha da visão de que o pico ficou para trás, mas ele avalia que os valores seguirão altos neste ano.
No auge da crise, a rota Ásia-Brasil chegou ao patamar recorde de US$ 10 mil por TEU (contêiner de 20 pés) no mercado de curto prazo. Em fevereiro, o valor ficou entre US$ 7 mil e US$ 8 mil por TEU, nível ainda alto, mas já com uma redução, puxada pela desaceleração do mercado interno brasileiro e pela criação um novo serviço entre China e o Brasil, diz Barreto. O serviço passa por terminais como o TCP (Terminal de Conteineres de Paranaguá), Santos, entre outros.
Fonte: Valor