A recessão se generalizou no segundo trimestre, mas tornou também mais evidente a longa crise da indústria - e dos investimentos - no país. A Formação Bruta de Capital Fixo (FBCF, medida das contas nacionais do que se investe em máquinas, equipamentos, construção civil e pesquisa) cai há oito trimestres consecutivos, sequência mais longa desde o início da série atual das Contas Nacionais, que teve início em 1996. Entre abril e junho, o recuo foi de 8,1% na comparação com os três primeiros meses do ano e de 11,9% em relação ao segundo trimestre de 2014.
Com o desempenho bastante dependente dos investimentos, o Produto Interno Bruto (PIB) da indústria de transformação também encolhe há oito trimestres.
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Para Julio Gomes de Almeida, professor da Unicamp, chama a atenção o espalhamento da crise. "A construção está sofrendo de tudo que é lado. A indústria está sofrendo de tudo que é lado. Talvez nunca tenhamos tido, com exceção de episódios muito marcantes, como as crise de 1929 ou 2009, uma generalização tão grande da recessão. Isso que dá esse sabor tão amargo na boca de todo mundo que comenta a cena brasileira."
Segundo análise do Centro de Estudos do Instituto Ibmec (Cemec), existem fortes razões para acreditar que o principal fator para a recessão da economia doméstica hoje é queda forte dos investimentos, "seja por seu efeito direto sobre a demanda, seja pelo seu efeito multiplicador de renda".
A partir da consolidação dos balanços de todas as 320 companhias abertas não-financeiras e de mais de 400 empresas fechadas, estudo do Cemec, dirigido por Carlos Antônio Rocca, sugere que a queda se concentrou no investimento privado, principalmente na indústria de transformação e naquelas que sofrem influência de políticas públicas, caso da Petrobras e Eletrobras.
"Sem dúvida, o quadro de atividade que a gente observa é fruto das diretrizes de política econômica nos últimos anos até 2014. É um equívoco acreditar que as decisões tomadas em 2015 são as responsáveis", comenta Alexandre Bassoli, economista-chefe do Opportunity. Para ele, a longa e intensa recessão dos investimentos resulta de dois fatores. De um lado, medidas que reduziram a produtividade da economia, como nível maior de protecionismo econômico, participação maior de bancos públicos no crédito e maior intervenção do governo no sistema de preços. "Todos esses fatores, aparentemente, produziram redução da eficiência da economia, e tiveram efeitos negativos sobre a produtividade."
O segundo aspecto, diz Bassoli, é a piora da previsibilidade do ambiente macroeconômico, com aumento da inflação e redução da geração de superávits primários.
Bráulio Borges, da LCA Consultores, pondera que também a Operação Lava-Jato teve grande efeito sobre a derrubada do investimento neste ano. Apenas o PIB da construção, lembra, caiu 8,2%, responsável por 0,4 ponto percentual da queda de 1,9% do PIB no segundo trimestre "A gente só vai ter ideia mais clara do quanto os efeitos diretos e indiretos da investigação tiraram do PIB a posteriori, mas faz sentido esperar que o impacto seja considerável", comenta.
O cenário da LCA está em revisão, mas as estimativas atuais são de que metade da queda de 2,2% esperada para o PIB no ano venha da Lava-Jato. Outro 0,8 ponto percentual, diz Borges, pode ser atribuído à queda de 20% da produção da indústria automotiva.
É por isso que, no ano que vem, diz o economista, o PIB pode ter desempenho melhor do que espera hoje a média do mercado. "O setor automotivo deve se estabilizar ano que vem, ainda que em nível muito baixo, mas já deixa de atrapalhar." Antes da divulgação pelo IBGE, a LCA estimava alta de 0,6% do PIB em 2016.
Cristiano Oliveira, economista-chefe do Fibra, avalia que o cenário é bem mais negativo. Ele projeta queda de 3,1% do PIB neste ano e retração de 1% no ano que vem. Em sua avaliação, uma das consequências mais negativas da queda nos investimentos é a retração do produto potencial do país. Nas contas do Fibra, que leva em consideração a média de dois modelos, o PIB potencial chegou a 1,2% no segundo trimestre deste ano, contra uma média de 3,2% nos últimos dez anos.
"Infelizmente, ainda não parece que estamos próximos a um ponto de inflexão, e o Brasil não vai sair dessa recessão pelo consumo", diz Bassoli, do Opportunity. Para ele, é essencial criar as condições para retomada do investimento, com redução do nível de incerteza, o que ainda não está dado. Por isso, diz, o PIB pode cair neste e no próximo ano.
Fonte: Valor Econômico/Tainara Machado, Camilla Veras Mota e Ligia Guimarães | De São Paulo