O acordo que mudou a regra de distribuição de recursos do megaleilão do pré-sal e beneficiou o Estado do Rio contou com ampla mobilização da bancada fluminense e vinha sendo articulado desde a semana passada. Uma emenda apresentada por senadores fluminenses definiu que o estado ficará com R$ 2,5 bilhões do que o governo espera arrecadar.
O critério que tinha sido aprovado na Comissão de Constituição e Justiça ( CCJ ) do Senado na semana passada destinava apenas R$ 326 milhões ao Rio. Conduzidas pelo presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), as negociações envolveram também o senador Flávio Bolsonaro (PSL) e o governador Wilson Witzel.
PUBLICIDADE
Logo após a apresentação do relatório de Cid Gomes (PDT-CE), Witzel pediu mudanças para assegurar uma fatia maior de recursos ao estado. A ideia inicial era uma divisão exclusivamente pelos critérios do Fundo de Participação dos Municípios (FPM) e do Fundo de Participação dos Estados (FPE).
Se este critério - que privilegia entes menos desenvolvidos e de menor renda per capita - tivesse prevalecido, o Rio receberia bem menos do que a Bahia, por exemplo, que teria uma fatia de R$ 905,5 milhões. Witzel chegou a propor um outro critério, que beneficiaria também outros estados do Sul e do Sudeste, mas retirava dinheiro do Norte e do Nordeste.
Essa modificação tinha poucas chances de avançar, na avaliação de parlamentares. A emenda apresentada pelos senadores Flávio Bolsonaro (PSL), Romário (Podemos) e Arolde de Oliveira (PSC) prevê que o estado produtor, que abriga as áreas que serão leiloadas, fica com 3% da renda que seria destinada à União, além da fatia referente à divisão pelo Fundo de Participação dos Estados (FPE).
A mudança de regra não inclui outros estados da federação. O governo espera arrecadar R$ 106 bilhões, mas pretende usar parte da arrecadação para acertar contas com a Petrobras e repassar R$ 33 bilhões à estatal. Preocupado com o critério de divisão dos recursos, Maia chegou a afirmar que o leilão poderia ficar para o próximo ano e que o Rio não poderia ser prejudicado. Foi a senha para alterar o texto.
'Agradeço ao Flávio Bolsonaro', diz Witzel
Deputados e senadores do Rio argumentaram que o estado acabaria sendo prejudicado na distribuição de recursos do petróleo sem compensação, de acordo com a regra original. Os critérios do Fundo de Participação dos Estados (FPE), por exemplo, não são atualizados há décadas. E o repasse de royalties será alvo do Supremo Tribunal Federal. Para completar, o Rio está em recuperação fiscal.
A bancada do Rio e Witzel já se mobilizavam em busca de um critério mais vantajoso para o estado na Câmara. No entanto, uma eventual alteração no texto lá faria a proposta voltar ao Senado. Sem acordo, o projeto chegaria a um impasse, com cada Casa defendendo um texto.Para evitar que outros estados perdessem recursos, o governo federal aceitou abrir mão de cerca de R$ 2 bilhões, e os líderes do Senado permitiram a alteração no texto.
O governador do Rio, Wilson Witzel, comemorou:
— Agradeço muito ao Flávio Bolsonaro e ao Rodrigo Maia, que articularam esse acordo. Certamente vai contribuir para pagarmos as dívidas do estado e fazermos investimentos fundamentais. Vamos usar uma parte para fazer saneamento e infraestrutura para as comunidades mais pobres.
Para o deputado Christino Áureo (PP/RJ), um dos articuladores do acordo e líder da bancada do Rio na Câmara dos Deputados, a medida reduz os prejuízos para o estado com recursos, uma vez que o critério para os repasses dos royalties está judicializado em uma ação no STF.
— Conseguimos construir uma situação positiva dentro do quadro que tínhamos. O timing da cessão onerosa já tinha sido perdido na Câmara lá atrás, recuperar isso foi importante. O estado ainda está buscando uma forma de ser reparado em cima das outras perdas da cessão onerosa.
Espírito Santo tentará mudar texto na Câmara
O governador de São Paulo, João Doria, não se manifestou. O do Espírito Santo, Renato Casagrande, disse que gostaria que a Câmara ampliasse a fatia de outros estados:
— Não temos nada contra, mas a medida aprovada ficou devendo aos demais estados do Sul e Sudeste. O Rio é onde estão as jazidas, é compreensível, mas o critério do FPE prejudica demais os estados e municípios do Sul e Sudeste. Se eu tiver espaço na Câmara, vou melhorar a situação do Espírito Santo.
Com a aprovação do Senado, a PEC será apreciada pela Câmara dos Deputados. É preciso alterar a Constituição para repassar o dinheiro para os governos regionais por conta do teto de gastos. Essa regra limita as despesas da União, como serão contabilizados o pagamento à Petrobras e o repasse a governadores e prefeitos. Para não descumprir a regra, será preciso criar uma exceção.
'Foi uma decisão correta', diz Pires
Para especialistas, o acordo fechado corrige possíveis distorções.
- Divisão de arrecadação é sempre uma discussão calorosa. Todos os estados estão numa penúria enorme, mas a área está no Rio. Foi uma decisão correta — avaliou Adriano Pires, do Centro Brasileiro de Infra Estrutura (CBIE).
Para a gerente de petróleo da Firjan, Karine Fragoso, a PEC segue a linha da divisão de royalties prevista na Constituição, cuja contestação será julgada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em novembro:
— A atividade de petróleo e gás não afeta o Mato Grosso da mesma forma que o Rio. O peso tem de ser diferenciado.
O edital do megaleilão deve ser publicado até esta sexta-feira, mas a equipe econômica só quer concretizá-lo após a aprovação final da PEC devido ao pagamento que a União tem que fazer à Petrobras.
O atraso da votação pode atrasar o leilão, mas o governo já não conta com a arrecadação dele para as contas deste ano.
Fonte: O Globo