As tradings do agronegócio precisarão se diversificar e crescer cada vez mais, investir em novos produtos e em novos mercados para "aguentar as bagunças" provocadas pela volatilidade nos mercados de commodities. A avaliação, do brasileiro Alberto Weisser, foi feita em entrevista ao Valor pouco depois de anunciada sua aposentadoria como CEO global da americana Bunge Limited em 1º de junho, quando deverá ser substituído no cargo pelo americano Soren Schroder, que está no grupo desde 2000 e atualmente é CEO da Bunge América do Norte.
A Bunge é uma das quatro grandes tradings mundiais do agronegócio - grupo conhecido como "ABCD", formado também pelas americanas ADM e Cargill e pela francesa Dreyfus - e é a maior exportadora desse setor no Brasil, com fatia de 25% no mercado de grãos (incluindo a soja) no país.
Weisser, que está na Bunge desde 1993, foi apontado CEO global da multinacional em janeiro de 1999 e presidente do conselho da empresa em julho daquele ano. Desde que a companhia foi listada em Wall Street, em agosto de 2001, o valor da empresa aumentou 5,5 vezes, o preço de suas ações subiu quase 500% e o retorno médio dos acionistas foi de 16,4% por ano.
Em seus 14 anos de comando, Weisser afirmou que a companhia cresceu dez vezes e as operações passaram de quatro para 40 países. Investimentos e diversificação também aumentaram. Mas, ainda assim, a empresa não está livre de intempéries. No quarto trimestre de 2012, por exemplo, registrou prejuízo de US$ 599 milhoes, em parte por causa de problemas no mercado de etanol no Brasil.
"Os ruídos do trimestre são tudo coisa de contabilidade, coisas ridículas, não têm nada a ver com a qualidade dos negócios", disse Weisser, defendendo sua gestão. "O momento é perfeito [para a aposentadoria]. A empresa está com boas posições, o balanço é muito bom e o processo interno da sucessão foi bem pensado, é robusto e estruturado".
O anúncio da mudança de comando não foi surpresa, de acordo com Weisser. "É minha decisão de não querer continuar. É preciso muita energia, viajo a metade do ano, trabalhei duríssimo. Colocamos o Soren na operação da América do Norte para ver; ele fez bem, é um lider, está superpreparado".
Aos 57 anos, Alberto Weisser vai, porém, continuar na empresa. Primeiro como presidente do conselho de administração até o fim do ano em tempo integral, e a partir do ano que vem, como não executivo e de forma parcial. Ao mesmo tempo, buscará fazer "algo diferente", que diz que vai pensar depois.
Na entrevista ao Valor, Weisser examinou os desafios das tradings e deixou claro, na prática, que seu sucessor terá que encontrar meios de fazer a trading continuar crescendo e ampliando mercados em meio a um cenário diferente, com produtores mais independentes, melhor informados e com poder de barganha.
"As tradings precisam ter um balanço muito grande e forte nesses mercados", afirmou. "Acho que todas as tradings vão entrar em mais produtos. Bunge e Cargill estão entrando na área de tomate no Brasil, Cargill e ADM tambem estão em processamento de milho".
Na avaliação do executivo, o resultado é que as tradings vão ajudar a reduzir "dramaticamente" os custos da logística, por exemplo. "A Bunge opera 11 terminais portuários no Brasil. Reduzimos pela metade o custo da logística no país. E isso permitiu que a agricultura fosse mais longe. A função das tradings é fazer a cadeia mais eficiente e com isso baixar o custo".
Sobre a maior independência dos produtores, que em muitos casos podem passar sem intermediários, ele retruca: "Não temos influencia sobre os produtores, porque eles sempre têm a chance de vender para onde e quem quiserem", disse o executivo. "A margem de lucro das tradings independe dos preços das commodities. Se o preço sobe, quem ganha é o produtor, se baixa o ganhador é o consumidor. Nossa margem é mais ou menos a mesma".
Para Alberto Weisser, o que os preços agrícolas estão sinalizando é que a oferta mundial está baixa e é necessário produzir mais. "A demanda aumentou muito, o mundo está mais rico. O Brasil também tem de produzir mais'. E, enquanto analistas apontam desafios para as tradings na China, maior comprador mundial e que tenta eliminar intermediários, Weisser tem outra interpretação, que considera que os países estao é mais fáceis de trabalhar.
"A China precisa de alimentos e sabe a vantagem do intermediário. Quando tem uma seca, não sabe onde comprar mas sabe que nós conseguimos o produto em qualquer parte do mundo. Nós somos a solução para esses problemas".
O Brasil representa quase 50% dos negócios da Bunge, e a empresa sofre alguns percalços. "Tem problemas de armazenagem, de logística, o governo não permitia investir em portos e agora tem o problema da Petrobras, com o preço da gasolina muito baixo. Ninguém expande as usinas de álcool porque o preço não dá para cobrir os custos de produção (...) O etanol está dando prejuízo [para a Bunge] por causa do preço, mas também temos de melhorar sua produção para baixar o custo no Brasil".
Fonte: Valor / Assis Moreira
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