O projeto de construção da ponte Santos-Guarujá, que fará a interligação seca entre as duas cidades do litoral paulista, enfrenta forte resistência antes de sair do papel.
Enquanto o governo de João Doria (PSDB) está empenhado para, enfim, conseguir licenciamento e viabilizar a obra, outra ala tenta derrubar o sonho após 92 anos do primeiro projeto, um túnel, registrado em 1927, pelo engenheiro e arquiteto Enéas Carneiro.
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“Acredite, isso não é só mais um projeto ou uma aventura. É algo totalmente viável para o momento, pois não mexeria com recursos públicos”, disse à Folha o secretário estadual de logística e transporte João Octaviano Machado Neto.
Nesta terça-feira (16), na primeira de uma série de audiências públicas previstas no processo ambiental em Santos, a nova solução foi acusada de “atender somente a interesses políticos” pelo suposto favorecimento a Ecovias e, também, chamada de antiquada sob sustentação de que o projeto do túnel submerso, que passaria por baixo de canal do Porto, funcionaria melhor.
“Somos totalmente contrários. Digo mais, essa obra não é mais desejada. Foi um sonho, hoje virou pesadelo, algo obsoleto. A cidade de Roterdã [na Holanda] começou fazendo pontes e as derrubou, trocou pelos túneis. Imagine para um caminhão subir uma rampa de 85 metros de altura? Isso não funciona”, disse Eduardo Lustosa, diretor de portos da Associação de Engenheiros e Arquitetos de Santos.
O encontro durou quase cinco horas e teve até mesmo troca de farpas, após apresentação do projeto por Rui Klein, diretor superintendente da Ecovias.
Klein, apresentou os principais aspectos técnicos da obra, mas não citou em nenhum momento a palavra pedágio, substituindo o termo por “bloqueios de pagamento”. Um dos presentes, ao pedir a palavra, rebateu dizendo que é necessário falar a verdade sobre a existência das cobranças e que, mesmo assim, a concessão de 30 anos a Ecovias não é justificável.
“Eles estão querendo impor a ponte e a Ecovias como responsável pela obra, isso nos causa estranheza. Não tem outras empresas interessadas? Não houve processo licitatório para que ter oportunidade para que outros realizassem, também? Estão direcionando tudo, não há legitimidade nisso”, disse Lázaro Roberto Lirmas, 58, advogado e membro do conselho do Sindicato dos Servidores da Previdência e Saúde do Estado de São Paulo.
A estrutura, estimada em R$ 2,9 bilhões, será erguida pela própria concessionária, responsável pelo sistema Anchieta-Imigrantes, em troca da extensão do contrato para exploração dos serviços, que inicialmente vence em 2026, por mais 30 anos.
Atualmente, a Agência de Transporte do Estado de São Paulo (Artesp) e a Companhia Docas do Estado de São Paulo (Codesp) estão em tratativas e análise sobre os impactos da construção.
Em nota, a Artesp limitou a dizer que analisa estudos e projetos encaminhados pela Ecovias para avaliação da viabilidade técnica do projeto.
Representantes sindicais foram os principais críticos ao projeto alegando que o processo tem sido tocado de forma acelerada, mesmo com proposta inferior a do túnel submerso.
“Já vimos isso, o custo será muito menor do que o do túnel submerso”, rebate João Octaviano Machado.
Caso o projeto do túnel fosse retomado, a Ecovias não conseguiria por em prática o plano de extensão de contrato. O governo, por sua vez, além de rebater que precisaria de recursos próprios, que hoje diz não ter, alega que um túnel demandaria desapropriações e outros entraves ambientais.
Há, ainda, temor de que a ponte crie dificuldades no trânsito de navios e projetos de expansão no canal do Porto. “Falam que não diminuirá o fluxo de navios, mas só é possível saber e calcular após a construção”, afirmou um dos participantes.
Antes de usuários contraporem o projeto, a consultoria responsável explicou que o processo de licenciamento ambiental é realizado sem que haja desapropriação.
De acordo com a Ecovias, o projeto totaliza 7,5 km e é composto por uma ponte e trechos elevados em viadutos. A estrutura conecta a Via Anchieta, no km 64, à Rodovia Cônego Domênico Rangoni, no km 250.
A concessionária explicou que o percurso reduzirá de 45 km para menos de 10 km, tornando a travessia mais rápida. Além disso, desafogaria em cerca de 50% o fluxo de balsas, problema considerado caótico por usuários. A previsão inicial é de que, se aprovadas, as obras durem 36 meses.
Em nota, a Ecovias disse que que desenvolveu o projeto com base em estudos entregues em dezembro a Artesp, contrariando acusações de que não há estudos prévios para a execução do projeto.
Fonte: Folha SP