Propostas consideradas prioritárias pelo governo no início do ano ainda não foram destravadas apesar da ampliação da base governista no Congresso, que está sob comando de aliados do presidente Jair Bolsonaro (sem partido).
Em fevereiro, foram eleitos, com apoio de Bolsonaro, os presidentes da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG). Logo depois, o governo enviou a eles uma lista com as pautas consideradas mais importantes.
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De 17 projetos econômicos, 8 seguem travados. Não foram votados pelo plenário de nenhuma das Casas até o momento.
Entre eles, estão as medidas estruturantes colocadas como pilares da gestão do ministro Paulo Guedes (Economia). Ainda não há previsão para votação da reforma administrativa (que muda regras no funcionalismo público). A reforma tributária, por sua vez, não avançou e aguarda o envio de propostas pelo governo.
Também está travada a criação da BR do Mar, iniciativa que busca reduzir a dependência do transporte rodoviário no país e ampliar a navegação entre portos nacionais (cabotagem).
Quatro propostas ainda dependem do aval de uma das Casas, sendo que uma delas é a MP (medida provisória) que abre caminho para a privatização da Eletrobras, a ser votada nesta segunda-feira (21) pela Câmara.
Cinco itens da lista já foram aprovados, como a nova lei do gás e a que concede autonomia ao Banco Central.
Procurado, o Ministério da Economia não quis comentar o desempenho da agenda econômica no Congresso.
Reservadamente, auxiliares de Guedes afirmam que certas pautas prioritárias enfrentam dificuldades mesmo com a presença de aliados do governo no comando do Congresso. É o caso das novas regras para ferrovias. Interlocutores do ministro dizem que o projeto é alvo de forte lobby, que está travando as negociações.
Um membro da pasta inclui as mudanças de normas ambientais na lista de projetos considerados de difícil aprovação. O texto, que flexibiliza as regras de licenciamento ambiental, foi aprovado pela Câmara em maio, mas enfrenta resistência de senadores.
Líderes governistas afirmam que a pauta de votações no Senado ficou emperrada desde que foi instalada a CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) da Covid, no fim de abril. Por isso, as votações têm focado em medidas provisórias, que perdem validade se não forem aprovadas dentro do prazo.
A reforma tributária, que estava em estágio avançado na Câmara, empacou. Por articulação do governo, a proposta encabeçada por líderes partidários ligados ao ex-presidente da Casa Rodrigo Maia (DEM-RJ) foi praticamente enterrada.
Há quase um ano e meio, o ministro Paulo Guedes (Economia) prometeu enviar a proposta dele ao Congresso em uma ou duas semanas. Até hoje, porém, só um projeto —de um total de cinco ou seis— foi apresentado.
A proposta que já está na Câmara unifica PIS e Cofins num novo tributo, a CBS. O texto, no entanto, sequer tem indicação de quem será o relator. Lira aguarda o envio dos demais projetos da reforma tributária de Guedes para destravar essa agenda.
Aliados de Guedes no Congresso chegaram a sondar o deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB) para relatar a criação da CBS. Ribeiro recusou. Ele foi relator da PEC (proposta de emenda à Constituição) do grupo de Maia e que desagradava a equipe econômica.
A expectativa agora é que a segunda fase da proposta de reforma tributária chegue ao Congresso até quarta-feira (23). O texto deve tratar das mudanças no Imposto de Renda para pessoa física, jurídica e nos dividendos de empresas.
Nessa área, Guedes já reconhece que não será possível fazer uma reforma ampla. O time do ministro deve deixar de lado uma ampla desoneração de encargos trabalhistas e outras mudanças mais radicais no sistema tributário para focar em medidas de simplificação e ajustes mais tímidos de alíquotas.
Na reforma administrativa, o governo enfrentou dificuldade logo na primeira sessão da comissão especial da Câmara que vai analisar o projeto. Membros de partidos aliados a Bolsonaro são ligados a corporações do funcionalismo público, como o líder da bancada da segurança pública, deputado Capitão Augusto (PL-SP).
Em 22 de fevereiro, Lira estimou que a reforma administrativa seria votada no plenário da Casa antes do fim do primeiro trimestre. No dia 10 de maio, afirmou que sua intenção era enviar o texto para o Senado até julho.
O relator da PEC, deputado Arthur Maia (DEM-BA), quer concluir o parecer até o fim de agosto. Mas a pressão da base bolsonarista ameaça empurrar a reforma administrativa só para 2023.
Em relação à criação da BR do Mar, o projeto foi aprovado pela Câmara no fim do ano passado. O plano é flexibilizar as regras para a navegação entre portos nacionais e aumentar a frota de embarcações no país.
Mas falta passar pelo Senado, onde a proposta deverá ser modificada pelo relator, Nelsinho Trad (PSD-MS). Com isso, o texto ainda deverá voltar para a Câmara depois que o governo conseguir reduzir as resistência a ele no Senado.
Em evento promovido pela Abras (Associação Brasileira de Supermercados), Guedes voltou a defender na quinta (17) a aprovação de marcos regulatórios, como o de ferrovias e de cabotagem, para melhorar a logística e o escoamento da produção brasileira. Ainda não há previsão de votação dessas propostas.
Outro projeto do ministro é a mudança no regime de exploração de petróleo. Desde o fim de 2019, após um megaleilão frustrado, o ministro defende a licitação com concessão nos blocos em que esse regime for mais vantajoso para o Brasil e instituir a disputa em igualdade de condições nas licitações de partilha da produção.
Mas a proposta, de autoria do senador José Serra (PSDB-SP), está parada, apesar de no ano passado o Ministério da Economia ter enviado um ofício ao Senado pedindo celeridade.
Guedes também tem dificuldade para destravar a proposta de cortar salário acima do teto do funcionalismo (R$ 39,3 mil). O projeto está pronto para votação no plenário da Câmara, mas enfrenta forte lobby de servidores, especialmente do Judiciário.
No Congresso, líderes governistas admitem que a janela para aprovar medidas de grande impacto na economia fica aberta até o início de 2022, ano eleitoral. Por isso, consideram o segundo semestre deste ano fundamental para o andamento da agenda governista.
Membros do Ministério da Economia afirmam que a aprovação de toda a lista de projetos prioritários “fecharia o governo com chave de ouro”, sob a visão liberal de Guedes. No entanto, reconhecem que o prazo é curto e que parte das medidas deve ficar pelo caminho.
Fonte: Folha SP