Líder tucano na era FHC e o nome do PMDB na estatal desde 2003, ele montou o plano para dobrar frota; com a empresa, setor revive
Ao som de música clássica, que sai do iPod com caixa de som, Sérgio Machado passa 14 ou 15 horas de trabalho diárias na sede da Transpetro. O presidente da transportadora da Petrobras monitora pelas cinco telas planas de 32 polegadas em seu gabinete, em tempo real, o fluxo dos gasodutos e dos 3,6 milhões de barris de petróleo nos oleodutos da empresa, a construção do navio Celso Furtado, lançado ao mar em 27 de maio e até a posição das embarcações da empresa pelo mundo. Uma tela mostra, no mapa-múndi, em que ponto dos oceanos está a frota da Transpetro.
Entre suas atribuições, Machado comanda o Programa de Modernização e Expansão da Frota (Promef). Trata-se de um programa com orçamento de R$ 8,3 bilhões que tem por objetivo encomendar 49 novos navios, a serem construídos no Brasil. A ideia é praticamente dobrar o número de embarcações da empresa até 2014 – hoje são 52. Já foi quase tudo licitado; porém, só dois dos seis navios em construção foram batizados, e nenhum está em operação ainda. É o peemedebista Sérgio Machado que controla o programa e os recursos.
Padrinhos políticos
Líder do PSDB no Senado entre 1995 e 2001, no governo Fernando Henrique Cardoso, Sérgio Machado tem hoje em seu gabinete uma foto oficial do presidente Lula. Em 2002, Machado migrou para o PMDB e concorreu ao governo do Ceará: ficou em terceiro, com 395.669 votos, atrás do eleito Lúcio Alcântara (PSDB), com 1,6 milhão, e de José Airton Félix (PT), que teve 924 mil votos.
Em junho do ano seguinte, com a eleição de Lula, porém, assumiu o controle da Transpetro, em nome do PMDB. Com 47 terminais, 52 navios, 13.819 km de dutos, a subsidiária da Petrobras é a principal empresa de logística e transporte de combustíveis do Brasil: teve receita operacional bruta de R$ 4,3 bilhões e lucro líquido de R$ 399 milhões em 2009. Com o pré-sal, a Transpetro ganhou força e recursos e passou a ser uma “jóia da coroa” para os partidos. Na política, a presidência e as diretorias da empresa são disputadíssimas.
Sérgio Machado tem padrinhos poderosos, entre os quais se destacam o atual presidente do Senado, José Sarney (AP), e seu antecessor no cargo, Renan Calheiros (AL). O presidente da Transpetro reconhece que está no cargo por causa do partido. “Fui indicado para a função pelo PMDB. Fui quatro anos deputado, oito anos senador. Tenho relação extensa com tanta gente, de todos os partidos... O senador, ou anda de braços abertos ou não avança. Cheguei e me olhavam como político, mas hoje conheço profundamente as atividades.”
Foto: Divulgação
Sérgio Machado tem Renan Calheiros e José Sarney como padrinhos políticos na Transpetro
Quando Renan Calheiros foi alvo de um processo de cassação, em setembro de 2007, Machado esteve ameaçado de deixar o cargo na Transpetro. Com a permanência do padrinho no Congresso, ficou, mas o PMDB fez concessões.
O senador Marcelo Crivella (PRB-RJ) ameaçou votar pela cassação de Renan. Após o processo ter sido encerrado, pôde nomear para a diretoria financeira da Transpetro Rubens Teixeira, pastor da Assembleia de Deus, seu assessor direto e de confiança. Sérgio Machado admite que Teixeira é indicação do senador fluminense.
Funcionário do BNDES, Teixeira comanda 47 terminais e todos os serviços administrativos: define aluguel de carros, contratação de empresas de limpeza, segurança, manutenção predial e obras. Em discurso recente, ao receber medalha da Câmara de Vereadores do Rio – por indicação do pastor da Igreja Universal João Mendes de Jesus (PRB) –, o diretor da Transpetro agradeceu a Crivella.
Rubens Teixeira em discurso na Câmara de Vereadores do Rio
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“Destaco agora meu amigo, meu irmão, Senador Marcelo Crivella, que se constituiu um paredão em minha defesa quando fui lançado aos leões, só porque discordei de medidas que interessavam mais aos poderosos.”
No iPad comprado há um mês, Sérgio Machado baixou pessoalmente 7.807 músicas dos estilos mais variados: de clássica, Nat King Cole e Frank Sinatra a sertaneja. Também é no novo brinquedo que o peemedebista presidente da Transpetro – relator da Reforma Política no Senado e defensor do financiamento público de campanha –, mostra ao repórter uma frase do ex-vice-presidente dos Estados Unidos Hubert Humphrey (1965-69): “O financiamento de uma campanha é uma maldição. É a mais nojenta, indigna e debilitante experiência da vida de um político. Fede, repugna. Eu não tenho palavras para dizer o quanto odeio isso.”
Modelo coreano
Coube a Machado montar o Promef, que tinha como premissas básicas construir navios no Brasil, com nível de nacionalização de 65% na primeira fase, 70% na segunda e aumentar a competitividade dos estaleiros nacionais. “A filosofia do governo é a de que o petróleo não pode ser uma maldição, mas uma dádiva para transformação. Nenhum país é soberano sem marinha mercante própria: 80% do comércio mundial e 95% do brasileiro é feito por navios. O Brasil gasta anualmente US$ 16 bilhões (R$ 28,1 bilhões) – a Petrobras sozinha gasta US$ 2 bilhões (R$ 3,5 bilhões).”
Foto: Divulgação
Sérgio Machado, presidente da Transpetro, em seu escritório, à frente das telas onde monitora o fluxo dos gasolutos, oleodutos e os navios da empresa pelo mundo
A Transpetro fez estudos sobre os gargalos para tornar a frágil indústria naval no país mais competitiva e estabeleceu a Coreia do Sul como modelo. O começo foi difícil. “O grande desafio que recebi do presidente Lula foi criar uma indústria sustentável. Fui à Coreia, ao Japão, e diziam que o Brasil não tinha condição de produzir. Era uma descrença total. As pessoas me olhavam como se eu fosse um ET. Avisei: ‘Ou vão ao Brasil ou vão perder o navio da história.’ Eu começava falando com o porteiro do estaleiro, depois com o gerente, o diretor industrial, o CEO e agora falo com o dono...”, brinca.
Para Machado, fazer os navios no Brasil, pelo Promef, compensa do ponto de vista estratégico, apesar de ser 3% mais custoso, segundo seus cálculos. A estimativa é de que os preços no país só venham a ser equivalentes aos do exterior em 2018.
O Promef é bem-sucedido, segundo o presidente da Transpetro. Atualmente, 38 navios petroleiros estão contratados, seis sendo construídos no país, e a indústria naval ressurgiu, em movimento que deve gerar 15 mil empregos diretos, segundo a Transpetro. “Em sete anos, saímos do zero, e o Brasil passou a ser o quarto colocado em navios petroleiros no mundo. Nosso investment grade foi quando a Samsung comprou 10% da Atlântico Sul, e quis comprar mais.”
Fonte:Grande Prêmio/ iG Rio de Janeiro/Raphael Gomide
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