Os processos movidos na Justiça do Estado do Rio pela Sete Brasil contra três ex-administradores da companhia - João Carlos Ferraz, Eduardo Costa Vaz Musa e Pedro Barusco - ainda estão em fase inicial e a tendência é que tenham tramitação longa dada a complexidade das ações. Nos processos, a Sete Brasil atribuiu às três causas valores superiores a R$ 30 milhões com base em bônus que os ex-diretores receberam e que a companhia quer que eles devolvam.
Pedro Barusco e Eduardo Musa fizeram acordos de delação premiada no âmbito da Operação Lava-Jato, que apura denúncias de desvios de recursos na Petrobras. Ferraz admitiu, em uma notificação extrajudicial dirigida à Sete Brasil que, quando presidiu a empresa, em um "momento de fraqueza", aceitou receber "gratificações" de estaleiros entre maio e dezembro de 2013 que totalizaram US$ 1.985.834,55. Nos processos cíveis movidos pela Sete, a empresa entende ter sido lesada pelos três ex-diretores. A Sete foi criada para gerir um portfólio de sondas para a Petrobras. Nas ações, a empresa pede que os ex-executivos revertam à companhia comissões que receberam de estaleiros nos contratos de construção das sondas e devolvam bônus pagos.
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Os processos contra os ex-diretores tramitam em segredo de justiça em três varas empresariais do TJ-RJ. O Valor apurou que até o momento dois dos réus na ação, Eduardo Musa e Pedro Barusco, apresentaram as contestações à denúncia feita pela Sete Brasil. Musa não teria negado os atos ilícitos apontados pela Sete, mas alegou que não pode ser obrigado a devolver os bônus que recebeu porque faria parte de sua remuneração. Procurada, a defesa de Musa, via advogado Eduardo Abrahão, disse que não iria se manifestar.
Barusco também considera que não pode devolver os bônus. O advogado de Barusco no processo, Armando de Souza Santana Junior, disse estar questionando a competência da Justiça do Estado do Rio para julgar o caso. Disse que a competência na ação é da Justiça Federal. Segundo Santana, Barusco aceitou fazer um amplo acordo de delação premiada que tem cláusulas que o protegem. Nesse processo, Barusco aceitou fazer devoluções de dinheiro ao Estado, disse o advogado. Há, segundo ele, uma discussão na ação cível da Sete na Justiça do Rio sobre direitos trabalhistas (bônus) que não podem ser apurados agora. "É uma longa discussão porque se trata de pedido de indenização dentro de um acordo de delação premiada", afirmou.
A Sete Brasil não vê mérito na discussão sobre a competência que buscaria levar o processo movido pela empresa para a Justiça Federal de Curitiba, onde foram feitas as delações premiadas da Lava-Jato. "Não há nenhuma conexão entre os dois processos [cível e criminal] contra Barusco, sobretudo porque no processo cível a companhia exerce um direito previsto na lei societária e não pede indenização pelos atos ilícitos praticados por ele [Barusco]", disse uma fonte. O que a Sete pede é o que está previsto na Lei das S.A., que os valores recebidos por eles [ex-diretores] à revelia da assembleia geral de acionistas [da Sete] sejam revertidos à companhia.
A causa envolvendo João Carlos Ferraz, ex-presidente da Sete, está em uma fase anterior em relação aos outros dois ex-diretores da companhia. Até ontem as informações eram de que as tentativas para intimar Ferraz no processo da Sete foram mal-sucedidas, disseram fontes. "O oficial de Justiça não conseguiu encontrá-lo." O Valor tentou falar com Ferraz por meio de ex-assessores do executivo, mas não conseguiu contato.
Em março deste ano, Ferraz registrou em cartório uma carta de notificação em face da Sete Brasil, à qual o Valor teve acesso, na qual ele admitiu ter recebido "gratificações" de estaleiros no valor de US$ 1.985.834,55. Na notificação, Ferraz pediu que a Sete indicasse uma conta bancária para que ele depositasse o valor integral das "gratificações". A Sete não quis indicar nenhuma conta porque quer que, em juízo, se apure efetivamente o que, de acordo com a lei societária, deve ser revertido à empresa.
Ferraz, um ex-funcionário da Petrobras, assumiu a Sete Brasil em junho de 2011 e se desligou em julho de 2014. Quando assumiu a Sete, Ferraz desagradou aos sócios privados. O executivo exigiu o pagamento de R$ 20 milhões, a título de uma espécie de "bônus de fundador" da empresa. Após protestos de uma parte dos sócios, foi contratada uma consultoria que afastou esse bônus de fundador e fixou metas e prazo para Ferraz para levar a Sete à bolsa de valores. Se o executivo as cumprisse, teria sua recompensa. Sob a gestão de Ferraz, a Sete, uma empresa ainda pré-operacional, decidiu aumentar de 7 para 28 o número de sondas que iria construir. Em vez de apenas atender a Petrobras, o objetivo seria internacionalizar os seus negócios. Aqui houve grande discordância entre os sócios e hoje, suspeita-se que esse aumento do número de sondas pode estar de alguma forma relacionado ao esquema de desvio da empresa.
Enquanto os sócios se dividiam sobre a estratégia futura, Ferraz continuava surpreendendo. Em 2013, por e-mail, informou os sócios da Sete que a empresa havia sido convidada para patrocinar um camarote na Copa das Confederações, no estádio do Maracanã, no Rio. No e-mail, ele se dizia conflitado para tomar a decisão, que deveria ser dele, porque era torcedor do Flamengo. Muitos sócios novamente foram contrários, uma vez que não viam sentido nenhum na ação de marketing de uma empresa pré-operacional, como a Sete e sem produto a ser "vendido". Mas houve sócios privados que apoiaram e a Sete patrocinou o camarote. A essa se seguiram outras ações de patrocínio, incluindo casas de shows. Ao deixar a empresa, Ferraz exigiu o pagamento de bônus. Novamente houve grande discussão entre os sócios, pois a empresa não havia chegado à bolsa. O executivo alegou que estava sendo retirado do comando antes do tempo necessário para tanto. Recebeu um pagamento proporcional.
Fonte: Valor Econômico/Francisco Góes e Ana Paula Ragazzi | Do Rio