Do alto das colinas que cercam Congonhas, a visão é nítida: no fim da tarde, quando sopra um vento forte, ergue-se uma grande nuvem escura da área escavada da mina Casa de Pedra e, em poucos minutos, a sombra de minério cobre a cidade que ganhou fama pelo conjunto arquitetônico de Bom Jesus dos Matozinhos, marcada pelas 12 estátuas de profetas de Aleijadinho. A ampliação da mina Casa de Pedra, da CSN, onde se extrai ferro com altíssimo teor de pureza, é apenas um dos muitos investimentos programados para a região do Alto Paraopeba, que a médio prazo devem tornar a área de cinco municípios a cerca de cem quilômetros de Belo Horizonte no principal polo minerador e no segundo polo siderúrgico do Estado.
A CSN capitaneia investimentos em mineração e em siderurgia na área, mas está longe de ser a única investidora. Em busca de um sócio estratégico, a Ferrous Resources começa ainda este ano a extrair minério de ferro da mina Viga, também em Congonhas. Ainda este ano deve entrar em operação a usina siderúrgica franco-nipônica da Vallourec&Sumitomo (VSB), em Jeceaba, que vai produzir tubos de aço sem costura para atender a indústria de óleo e gás. No fim do ano está previsto o início das contratações da Gerdau Açominas para a instalação de dois laminadores em sua siderúrgica em Ouro Branco.
A soma de todos os investimentos, tanto os projetados quanto os que já estão em curso, se aproxima de R$ 20 bilhões. Os impactos não serão pequenos: um estudo da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), encomendado pelo consórcio formado pelas prefeituras da região, estimou um crescimento populacional de 70% em 15 anos, com a população somada passando do patamar de 200 mil para mais de 300 mil habitantes. Só o complexo siderúrgico da CSN, caso saia do papel, deverá ter cerca de 12 mil trabalhadores, entre diretos e indiretos. Os primeiros efeitos já são sentidos no aumento de oferta de emprego e na especulação imobiliária.
"A poluição provocada pela extração é o maior problema. Mas nós topamos o ônus da mineração e da sobrecarga sobre a infraestrutura, diante do bônus da industrialização", comentou o prefeito Anderson Cabido (PT), de Congonhas, cidade que concentra a maior parte dos investimentos projetados. Ele teme que o mercado de minério aquecido leve a CSN a retardar os investimentos em siderurgia. O complexo industrial que a empresa anunciou em 2007 ainda não começou sequer o processo de licenciamento ambiental prévio, porque a CSN e o governo mineiro ainda negociam o pacote de incentivos, segundo informou a empresa. De acordo com a siderúrgica, uma outra empresa foi contratada especificamente para analisar a origem da poeira que cobre a cidade e propor um plano de ação. Segundo a empresa, o plano de construir uma usina em Congonhas está mantido.
É fácil entender o que significa cada vetor de crescimento ao se comparar as cidades da região. A que tem o melhor Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) é Ouro Branco, que sedia desde 1976 a Açominas (hoje Gerdau). Bairros inteiros são formados por casas de alto padrão, pavimentação impecável e áreas ajardinadas. A de pior IDH, depois das rurais Jeceaba e São Brás do Suaçuí, é Congonhas, onde casas sem reboco se amontoam em ruas estreitas e o próprio prefeito estima que pelo menos 8% da população de 50 mil habitantes vive em área de iminente risco de desastre.
Em um estágio intermediário está Conselheiro Lafaiete, às margens da BR-040. Sem atrair nenhum investimento, desde que o polo ferroviário que existia no município se desmantelou nos anos 80, Lafaiete concentra a oferta de serviços na região e cresce indiretamente. Seu centro comercial conta com avenidas largas, de seis faixas de rolamento.
Na expectativa de atender a demanda crescente, os prefeitos programam investimentos. Surge, contudo, entre as prioridades, a construção de novas prefeituras. "O novo centro administrativo será o cerne de tudo", disse o prefeito de Jeceaba, Júlio César Reis (PT). A prefeitura teve um grande acréscimo de arrecadação nos dois últimos anos, em função do pagamento de ISS pelas empreiteiras que fizeram as obras de construção civil da siderúrgica da VSB.
O recolhimento de ICMS, entretanto, só começará em 2013 e a arrecadação deve recuar de R$ 25 milhões para um patamar em torno de R$ 10 milhões a partir deste ano. Esse é o valor projetado para a construção da nova sede do poder, a ser pago em dois anos. "O centro administrativo terá uma escola municipal, com capacidade para atender 1,5 mil alunos, o dobro da atual. Trata-se de uma obra social", justifica Reis. No pacote de investimentos em Congonhas, também consta uma nova prefeitura, que consumirá R$ 20 milhões. "Hoje os órgãos municipais funcionam em 90 imóveis alugados. Haverá uma grande economia", disse Cabido. "Nosso centro administrativo vai ficar em R$ 6 milhões, porque somos mais pobres. Vamos fazer uma obra simples", ironizou o prefeito de Conselheiro Lafaiete, José Milton (PSDB), que disse que a cidade está com a mesma rede de leitos hospitalares desde 1960. "O governo do Estado está agora construindo um hospital com cem leitos e vamos pleitear mais 150".
Unidos na busca de investimentos estaduais e federais para a região, os prefeitos competem pelos novos moradores. As cidades tentam atrair os futuros funcionários das mineradoras e siderúrgicas, e afastar os trabalhadores temporários da construção civil, que hoje lotam os postos de recrutamento do Sistema Nacional de Emprego (Sine), gente que chega disposta a não ficar. "Já estive em Cubatão (SP), Araucária (PR) e Anchieta (ES). Onde tem obra eu vou. Em Anchieta trabalhei para a Petrobras e cheguei a tirar R$ 4 mil por mês. Aqui pretendo tirar R$ 2 mil", comentou o bombeiro hidráulico Leonardo Ventura, que preenchia ficha no Sine de Ouro Branco. Ventura é nascido em Ipatinga, no Vale do Aço, como todas as nove pessoas que aguardavam na sala. "Lá não é bom trabalhar porque não estão pagando hora extra", argumentou.
Os operários da construção da Vallourec, que chegou a empregar 7 mil pessoas no pico da obra, ficaram em alojamentos em Congonhas, Ouro Branco e Lafaiete. As prefeituras das pequenas Jeceaba e São Brás do Suaçuí, próximas às obras, não permitiram construções. "É delicado dizer isso, mas queremos atrair para cá uma população com faixa de renda mais permanente", disse Reis.
Para atender a esse grande afluxo, que inclui não apenas população, mas dezenas de carretas passando pela rodovia e composições ferroviárias na metade do tempo atual abarrotadas de minério, todo o esforço das prefeituras será pouco, de acordo com Cabido. "Temos várias parcerias com o setor privado e com os governos do Estado e federal, mas nada que se aproxime da realidade que se avizinha. Seria necessário R$ 3,5 bilhões em investimentos, sobretudo em logística de transporte e habitação. Não há esse dinheiro", disse.
Fonte: Valor Econômico/Cesar Felício | De Congonhas
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