Siderurgia: Análise aponta peso dos impostos sobre a competitividade
A siderurgia brasileira vai mostrar ao governo, em números, o que diz ter alertado em palavras há muito tempo sobre o impacto dos tributos na competitividade do setor. Contratou há quatro meses um estudo de análise comparativa da carga tributária na cadeia do aço em seis países - Estados Unidos, Brasil, Alemanha, Turquia, Rússia e China. O resultado do trabalho que acaba de ser entregue pela Booz & Company aponta que o aço brasileiro está entre os mais competitivos do mundo quando se avalia apenas o custo direto de produção, mas perde força e fica em último lugar ao sofrer o peso da carga de tributos brasileira.
E a sobrecarga maior da tributação existente no país, identifica o estudo, concentra-se em quatro tipos de impostos bem conhecidos: o ICMS, aplicado sobre vendas, o IPI (sobre o processo de industrialização), o PIS e a Cofins (contribuições sociais). O percentual atinge o dobro e , em alguns casos, até o triplo, do montante cobrado nos demais países selecionados para a pesquisa realizada pela consultoria americana.
O levantamento encomendado pelo Instituto Aço Brasil (IABr), entidade que representa as siderúrgicas no país, considerou dois produtos que são referência na indústria siderúrgica mundial: bobina laminada a quente e vergalhões. O aço laminado é usado em diversas aplicações, como fabricação de autopeças, e como matéria-prima de produtos mais nobres do aço, caso das chapas utilizadas para fazer carrocerias de automóveis, geladeiras e fogões. O vergalhão é tradicionalmente conhecido pelo seu uso em obras na construção civil em geral - desde uma pequena casa à barragem de uma hidrelétrica.
"O estudo identificou todos os impostos relevantes na cadeia do aço", diz Marco Polo de Mello Lopes, presidente-executivo do IABr. Inclusive aqueles aplicados sobre os novos investimentos, na compra equipamentos e serviços, bem como a incidência de despesas financeiras e taxas de juros nesses projetos. "O Brasil tem a mais elevada taxa do mundo", observa Lopes. "Enquanto o efeito do tributo aqui é de 50% sobre o investimento das empresas, a média dos índices dos outros cinco países é 13%", acrescenta. A vice-campeã é a Rússia, com 22% (menos da metade do Brasil), e quem onera menos sãos os EUA, com 10%.
O estudo completo abrangeu toda a cadeia de tributos que atinge a produção siderúrgica nos países escolhidos para a pesquisa. São nações das regiões desenvolvidas (Europa e América do Norte) e integrantes dos Bric, a região dos emergentes formada por Brasil, Rússia, Índia e China. A China lidera disparadamente a produção de aço no mundo, com quase metade do total fabricado - deve fazer mais de 600 milhões de toneladas este ano. O Brasil é o quinto entre os seis países-alvo da pesquisa e com mercado interno aquecido. A Turquia desponta como nova potência para figurar entre os dez maiores produtores. Já EUA, Alemanha e Rússia, com a crise, sofreram forte baque.
No Brasil, a Booz analisou o impacto do imposto de renda (IRPJ), CSLL, PIS e Cofins, ICMS, IPI, encargos trabalhistas, como fundo de garantia (FGTS), previdência (INSS), SAT e outros. Incluiu também IPTU (territorial urbano), IOF (sobre operações financeiras), AFRMM (taxa da Marinha Mercante) e ISS (taxa sobre serviços). "A lista é imensa", afirma o presidente do IABr.
Ao se comparar apenas o custo de produção, sem os impostos equivalentes nos seis países, o Brasil detém o terceiro melhor custo na bobina laminada. Só perde ligeiramente para a China. No vergalhão, é o quarto, a atrás de Rússia, EUA e China. Isso é explicado por deter aqui matéria-prima próxima (minério de ferro), usinas e processos de produção modernos, gestão qualificada, a despeito de enfrentar gargalos na infraestrutura de transporte e portuária, observa o executivo.
Até aí, diz Lopes, o setor resiste à competição com o aço dos seus concorrentes. O problema, aponta ele, vem quando se adiciona o peso de toda a carga de impostos existente no Brasil na cadeia produtiva. O custo da bobina laminada tem aumento de 47,7% e o do vergalhão, de 41,2%. "Ao comparar com os outros cinco países, ficamos bem acima da média de 24,1% e 28,7%, respectivamente", explica o executivo. No caso da bobina, o aço russo é o mais próximo, com 29,9%, e o alemão tem a menor tributação, enquanto o chinês é praticamente metade do brasileiro. No vergalhão, a China - que tem um consumo interno gigante - aplica o menor índice: 19,3%.
Por conta disso, a competitividade do aço brasileiro, conforme a pesquisa da Booz, cai para último lugar nos dois produtos, com alta de 51% sobre uma base 100 na chapa laminada e de 46% no vergalhão. Ao se considerar o impacto de tributos associados a investimentos (expansões e novas unidades industriais), o índice de competitividade vai a 153 e 147%, respectivamente, nos dois produtos,
"Sofremos uma carga enorme", afirma Lopes, que deseja levar essa radiografia tributária a todas as instâncias de governo no país. "Atingimos um custo tributário total, somando impostos sobre produção, vendas e investimentos, de 51% na bobina e de 42,7% no vergalhão", informa, ressaltando que o Brasil encontra-se muito desalinhado em relação aos seus concorrentes. "O peso maior vem de quatro impostos - ICMS, IPI, PIS e Cofins -, com cerca de três quartos da carga tributária total sobre o setor".
A pesquisa identificou ainda o impacto na exportação de produtos siderúrgicos nos seis países. No caso brasileiro, abrange resíduos de ICMS e outros impostos. O custo tributário para venda de bobina a quente ao exterior chega a 12,7%, bem superior à média de 7,2% dos demais países. China e EUA são os que menos taxam.
No primeiro semestre, as importações brasileiras de aço atingiram, 2,73 milhões de toneladas, alta de 148% sobre o mesmo período de 2009. Mais de 70% desse volume é de aços laminados planos. Para o ano, a previsão do IABr é de 4,2 milhões de toneladas. "Somando importação direta de aço e bens fabricados com aço, como uma autopeça, vamos bater 8 milhões de toneladas. Esse volume corresponde a uma siderúrgica como Usiminas", afirma Lopes.
O fundamental para o país, diz o executivo, é preservar seu mercado interno, hoje alvo de cobiça de produtores de todo o mundo. "A demanda aqui está aquecida, batendo recordes, enquanto em outros países ainda não houve recuperação da economia. E há um excesso de oferta de aço no mundo".
A reforma tributária do país, ao seu ver, é fundamental, pois no mundo se pratica apenas dois modelos de cobrança de impostos - o "Sale Tax" (imposto sobre venda final) nos EUA, e o IVA (sobre valor agregado) na Europa e outros país. "A redução dos custos tributários no Brasil é questão crítica para a competitividade da indústria do aço e para seus clientes diretos e indiretos", afirma.
Fonte: Valor Econômico/Ivo Ribeiro, de São Paulo
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