Uma nova tecnologia 100% nacional aplicada à indústria siderúrgica começa a ser testada e poderá se converter, a médio prazo, em alternativa menos custosa para a produção de ferro-gusa, produto a partir do qual se faz o aço. A ideia surgiu há mais de três décadas pelas mãos de pesquisadores brasileiros e ganhou força com a entrada da Vale no projeto. Este mês, uma usina-piloto que utiliza a tecnologia, chamada de Tecnored, fez, em Pindamonhangaba (SP), ferro-gusa por cinco dias seguidos. É o começo de um processo que mostra-se promissor.
"Do ponto de vista técnico, a tecnologia funciona, mas o desafio [para garantir a viabilidade comercial] é muito grande", disse Pedro Gutemberg, diretor global de marketing de materiais básicos da Vale. O projeto-piloto de Pindamonhangaba tem capacidade de produção de 75 mil toneladas de gusa por ano. Se a usina for bem-sucedida depois de uma fase de operação pré-comercial prevista para durar entre um e dois anos, a Vale poderá instalar em Carajás, no Pará, entre 2013 e 2014, unidade com a mesma tecnologia apta a produzir 300 mil toneladas anuais de ferro-gusa.
O desenvolvimento da tecnologia abre diferentes oportunidades para a Vale, que tem a exclusividade no uso da tecnologia. Uma delas é produzir gusa para vender ao mercado. A tecnologia Tecnored também poderia ser utilizada por uma siderúrgica equipada com alto-forno para produção adicional de gusa, disse Gutenberg. E outra opção é utilizar a nova tecnologia em projeto de novas usinas siderúrgicas.
"A tecnologia pode ser uma vantagem competitiva para atrair projetos siderúrgicos", disse o executivo. Mas o desafio neste caso é que a Tecnored é aplicada em módulos de 300 mil toneladas. Portanto, para abastecer uma aciaria de 2 milhões de toneladas por ano seria preciso construir 6 ou 7 módulos Tecnored, o que aumenta a complexidade logística da usina.
A Vale entrou no projeto no fim de 2009, ao desembolsar R$ 80 milhões e assumir participação de 37% na Tecnored Desenvolvimento Tecnológico S.A., empresa cujo principal ativo é a planta-piloto de Pindamonhangaba. Em junho de 2011, a Vale aumentou sua fatia na empresa para 43,04%. Os outros acionistas são a BNDESPar, braço de participações do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), com 31,79%, e a Logos Tecnocom, com 25,17%. A Logos reúne pesquisadores que desenvolveram a tecnologia e é a detentora de sete patentes com alcance em 35 países.
Desde o surgimento da ideia em 1980 até hoje, o projeto da Tecnored passou por várias fases. A planta-piloto foi construída pela Aços Villares, nos anos 2000, e depois foi assumida pela Gerdau , que terminou vendendo o projeto à Vale. A BNDESPar aportou R$ 85 milhões no projeto, que considera importante por desenvolver nova tecnologia no setor siderúrgico. No total, desde o começo, foram investidos no projeto cerca de R$ 250 milhões, dos quais R$ 130 milhões pela Vale.
A tecnologia diferencia-se dos métodos tradicionais usados nos altos-fornos siderúrgicos, que chegam a ter mais de 30 metros de altura. O novo método se apoia em um forno menor, com cinco metros de altura, e dispensa o uso de coqueria e sinterização, processos utilizados na siderurgia convencional. A coqueria é composta de fornos nos quais se aquece uma mistura de carvões minerais. Já a sinterização consiste em aglomerar finos de minério de ferro.
A nova tecnologia permite produzir gusa usando briquetes (espécie de tijolos cilíndricos) que fazem a aglomeração das matérias-primas a frio. O briquete é formado por um aglomerado composto por partículas finas de minério de ferro, carvão e um elemento redutor. O redutor retira o oxigênio do minério que, ao ser aquecido no forno, transforma-se em gusa.
Na visão da Vale, a tecnologia também ajuda a reduzir o impacto ambiental uma vez que possibilita produzir gusa a partir de minérios com diferentes teores e qualidades, inclusive ultrafinos de ferro, hoje estocados em barragens de rejeitos. Segundo a Vale, uma planta industrial Tecnored pode emitir 85% particulados a menos se comparada com uma siderúrgica tradicional. A redução de óxido de nitrogênio (NO) pode chegar a 95%, segundo a mineradora. "É uma tecnologia ambientalmente mais amigável", disse Gutemberg.
Ele estimou ainda que a nova tecnologia pode reduzir em 20% a 30% o capital necessário na fase de redução das matérias-primas siderúrgicas uma vez que são dispensadas a coqueria e a sinterização.
Fonte: Valor Econômico/Francisco Góes | Do Rio
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