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Avanços necessários

 

 


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Custo Brasil e ausência de política que estimule a cadeia de fornecedores do setor tornam o Brasil menos competitivo frente ao mercado internacional

 

As encomendas previstas para os próximos anos através dos programas da Petrobras e Transpetro, como Promef e EBN, além dos navios-sonda e projetos de empresas privadas, trazem perspectivas animadoras para o setor naval.

Os fornecedores de navipeças percebem um aquecimento no mercado, o catálogo Navipeças tem certificado cada vez mais empresas nacionais aptas a atender à cadeia e as companhias estrangeiras têm demonstrado interesse em se estabelecer no país. Mas apesar do momento favorável, fatores como o Custo Brasil e a ausência de uma política que estimule a cadeia de fornecedores do setor tornam a indústria brasileira menos competitiva.

 

“Há um volume razoável de projetos em andamento no país com horizontes para 20 a 30 anos, mas há também notória falta de competitividade das nossas indústrias por problemas que estão do lado de fora dos portões delas. Se não houver uma política industrial que estimule o conteúdo local, perderemos a oportunidade de crescimento e caminharemos para a ‘reprimarização’ da nossa economia”, opina o presidente da Câmara Setorial de Equipamentos Navais e de Offshore da Associação Brasileira de Máquinas e Equipamentos (Abimaq), Cesar Prata. O executivo destaca também que o Brasil necessita também de ministérios que criem políticas a favor do setor de bens de capital. “Se não houver política industrial consistente, desmontaremos nosso secular parque industrial.”

A implantação de uma política de conteúdo local mais clara é o principal desafio do setor de navipeças, na avaliação do vice-presidente da Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan), Raul de Sanson. O índice nacional é definido através do percentual sobre o valor do navio. Para Sanson, deveria haver metas específicas para os componentes. “Saber que se vai fazer aqui 60% do navio que custa 100 milhões de dólares não quer dizer nada para nós. Achamos que o casco e os serviços já absorvem quase tudo. Conteúdo local não é feito para colocar em serviços, mas em equipamentos, precisamos enxergar a demanda um pouco mais real”, salienta.

Essa adoção de índices específicos para os equipamentos que podem ser fabricados no país é uma das sugestões do Sindicato Nacional da Indústria de Construção e Reparação Naval e Offshore (Sinaval) à Petrobras. A instituição realizou no ano passado um mapeamento sobre a situação do conteúdo local nos fornecimentos a navios e plataformas. “Vamos começar a destrinchar essas famílias de equipamentos para ver onde é que podemos desenvolver o conteúdo local delas”, diz o vice-presidente do Sinaval, Franco Papini.

O documento mostra que para navios petroleiros o índice já atingiu 70%. No caso de navios de apoio e plataformas tipo FPSO, o percentual é de 61% e 63%, respectivamente. A participação dos fornecimentos locais no valor total de navios e plataformas é, em média, de 64% nesses três grupos. “Já atingimos 60% de conteúdo local, isso é página virada. Vamos buscar os 40% que faltam ou tentar buscar um número aproximado”, afirma.

De acordo com dados do Sinaval, os itens de maior participação no fornecimento local na estrutura de custos são os serviços industriais dos estaleiros e o valor do pessoal empregado na produção. No caso de um navio petroleiro e uma embarcação de apoio, eles correspondem a 50,4% e 43,7%, respectivamente.

O Sinaval atualmente trabalha para aumentar a participação de fornecedores locais em motores para geração de energia elétrica. Existem componentes para os quais não há escala de produção, como, por exemplo, eixo principal e eixo de manivelas. No entanto, os periféricos podem ser fornecidos. Se esses motores forem montados no país, o seu conteúdo local poderia atingir até 60% de conteúdo local em até quatro anos.

Para os itens em que não há escala de produção, opina Papini, as importações devem ser mantidas. Prata, da Abimaq, complementa dizendo que muitas máquinas requerem investimentos para produzi-las, que extrapolam o tamanho do mercado naval brasileiro. Sanson, da Firjan, também concorda com os executivos. “Uma válvula de quatro polegadas da China colocada no Brasil é mais barata do que a matéria-prima do Brasil. Aí é vocação, deixa o produto ser importado, tem escala, tecnologia e custo e não vamos conseguir nunca igualar ao preço dele”, exemplifica.

A iniciativa do Sinaval, cuja data para apresentação do levantamento à Petrobras ainda não foi marcada, também tem como objetivo atrair investimentos de empresas do exterior para o Brasil para itens sem fabricação nacional. Papini afirma que existe um grande interesse de investidores estrangeiros em vir para o Brasil, sobretudo pelo mau momento dos mercados europeu e norte-americano, enquanto que a demanda do pré-sal deve ser musculosa entre 30 e 40 anos.

 

Em abril, o governo anunciou algumas medidas para incentivar a indústria nacional. Uma delas foi a isenção de impostos na folha de pagamento de alguns setores, como o de máquinas e equipamentos e para a indústria naval. Para Prata, as reduções de tributos serão sempre bem-vindas, mas isoladamente a medida representará um centésimo do que o câmbio e os juros poderiam fazer. “As ações pontuais do governo não caracterizam uma política industrial. São apenas ações isoladas para apagar pequenos incêndios. Deixar de recolher 20% sobre a folha e pagar uma alíquota de 1% sobre o faturamento significa que haverá algum ganho, caso a folha represente mais de 5% do faturamento. Haverá uma leve redução de custos somente para aquelas atividades que possuem mão de obra intensiva, como a dos estaleiros”, afirma.

Os associados ao Sinaval, conta Papini, mostraram-se satisfeitos com a desoneração. Já Sanson avalia que a medida do governo é inócua, uma vez que a diferença entre os produtos é grande. “A política industrial em qualquer país do mundo tem uma didática, é algo mais amplo, tem que estudar o mercado. Falta compreensão de realmente trabalhar estes assuntos como um todo para depois ver as partes”, opina.

Os estudos da Abimaq quantificam que o custo Brasil sobre máquinas é de 43,8%. Este é um dos motivos para o país não conseguir competir nas mesmas condições com o mercado externo. Mas, segundo Prata, o principal vilão que dificulta o crescimento dos fornecedores de navipeças é o câmbio. Ele afirma que a indústria brasileira pode se enfraquecer em função da forte exposição de commodities e da falta de políticas compensatórias. “Outros países, quando se veem ameaçados de se desindustrializar por causa do câmbio, criam políticas, restrições, barreiras e regras para se protegerem, o que no nosso caso levou 150 anos para construirmos. O parque industrial brasileiro tem 150 anos e corre o risco de se desmontar em 20”, diz.

Outro gargalo para os fabricantes nacionais é a pressão exercida pelos concorrentes do exterior que, por falta de opção e de outros mercados ativos, concentram parte de seus esforços no Brasil, reduzindo os preços em dólares. Prata lembra que o Brasil tem portas abertas que estimulam as importações, isentando os produtos estrangeiros de todos os impostos, através dos regimes tributários Registro Especial Brasileiro (REB) e Repetro. Com isso, é razoável que os estaleiros optem por comprar pacotes fechados de fornecedores estrangeiros.

Mas o Brasil também poderá contar com um regime tributário especial para navipeças nos próximos anos. De acordo com o coordenador geral das Indústrias de Transporte Aéreo, Aeroespacial e Naval do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Carlos Eduardo Macedo, o governo estuda a implementação de um modelo que traga isonomia tributária entre empresas brasileiras frente ao fornecedor internacional. “Não queremos dar subsídios, queremos colocar em pé de igualdade, porque é uma forma de se igualar as condições para buscar competitividade, a produtividade e a sustentabilidade. Se não buscarmos esses três itens, estaremos fora do mercado, seremos apenas montadores de equipamentos importados”, diz o executivo.

O desenvolvimento dos subfornecedores também tem sido uma das dificuldades encontradas no setor. E com a quantidade de novos estaleiros que devem surgir nos próximos anos e junto com eles as encomendas, o prazo de entrega das embarcações pode sofrer atrasos, dizem os especialistas.

“Na hora que esse tsunami vier em cima da gente, teremos problema de prazo, porque se o primeiro nível nosso de equipamentos, que seria de bombas, válvulas, compressores e painéis, ainda está tentando sobreviver, imagina para se chegar na matéria-prima, que infelizmente não está sendo preparada para esse volume de encomendas que vão vir de uma vez só?”, indaga.

A opinião é compartilhada pelo diretor de Ship Power da Wärtsilä Brasil, Luiz Barcellos. O executivo destaca que a indústria nacional tem capacidade, mas não tem escala. “A cadeia de subfornecedores ainda não está totalmente preparada, então vão ter que seguir aquela curva de aprendizado. Se compararmos preço local com o importado, temos uma discrepância bem grande”, diz. Visando a diminuir essa diferença, a Wärtsilä tem visitado seus fornecedores potenciais  orientando-os sobre o método de fabricação dos componentes necessários para a produção de motores e estudando com eles a maneira mais eficiente de se produzir de forma que o custo seja reduzido.

Há mais de 20 anos no Brasil e com portfólio dos produtos importados, a companhia iniciará a partir do próximo ano a montagem de thrusters e grupos geradores no país. A produção dos equipamentos será feita paralelamente à preparação da fábrica, que está sendo montada em Itaguaí, no Rio de Janeiro. Está prevista para este mês a visita do CEO da Wärtsilä para finalizar o acerto com a Nuclep. “Está tudo preparado, falta só a formalização que ainda depende de a Nuclep obter algumas aprovações para a constituição da joint venture, mas o plano está pronto”, declara Barcellos. Inicialmente será utilizada uma área existente da Nuclep, onde serão inseridos equipamentos para montagem e testes. Posteriormente, uma expansão poderá acontecer.

Para as sondas de perfuração licitadas pela Petrobras, por exemplo, a Wärtsilä pode oferecer os grupos geradores, propulsores azimutais e sistemas de automação. As primeiras unidades devem estar prontas no início de 2013. Alguns estaleiros têm realizado consulta de preços com a empresa para equipar as sondas. Segundo o executivo, cada parque tem um conceito em relação ao conteúdo local. “O que estamos entendendo do mercado é que eles estão adequando preço e conteúdo local, então em alguns casos fizemos proposta com conteúdo mínimo e máximo e deixamos o estaleiro selecionar o que ele prefere”, explica. Uma das dificuldades percebidas por Barcellos é que a contratação dos equipamentos para as sondas é decidida por cada estaleiro, o que impossibilita a negociação com um subfornecedor de um lote para atender a todas as sondas.

 

A existência de uma base de fabricantes locais de peças e equipamentos navais é fundamental para a competitividade das empresas. Para ter maior participação nos projetos e atender às encomendas, muitas vezes é necessário o capital de giro. A Petrobras lançou no ano passado o programa Progredir, que viabiliza a oferta de crédito bancário a custo reduzido às empresas que integram a cadeia de suprimento da estatal. O programa já ultrapassou a marca de R$ 1,8 bilhão em financiamentos. Já foram realizadas, segundo a Petrobras, 362 operações até o final do mês de abril.

Prata, da Abimaq, avalia que o programa pode compensar a falta de capacidade financeira da estatal para proporcionar um fluxo de caixa neutro nos contratos com seus fornecedores e, ao mesmo tempo, transferir a eles os custos de obtenção destes financiamentos ou antecipações de recebíveis. Ele diz também que alguns fabricantes acabam financiando parte da construção das máquinas ao cliente, o que onera sobremaneira os custos de capital de giro em decorrência dos altos juros brasileiros. “Como os prazos de fabricação são longos, parte dos nossos custos fica com os bancos e não na produção”, diz.

Já o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) passou a financiar, desde outubro de 2010, a aquisição de navipeças para industrialização, modernização e manutenção de embarcações. O objetivo é contribuir para o aumento da competitividade das empresas do setor naval. Com a iniciativa, o banco espera ajudar na ampliação, eficiência e segurança da frota existente.

Até o momento já foram realizadas cerca de 1,18 mil operações e o valor financiado através do Cartão BNDES já chega a R$ 87,8 milhões. Podem ser financiadas as seguintes navipeças: ancoragem e casco; casa de máquinas; equipamentos de propulsão e de salvatagem; geradores, alternadores, transformadores, guinchos, guindastes, iluminação, motores, reversores, sistemas hidráulicos e sinalização para embarcações. Segundo o Banco, já são 11 os fornecedores credenciados e cerca de 60 itens disponíveis, cujos mais financiados são os motores marítimos e suas partes.

 

Por conta do pré-sal, cerca de 20 empresas já demonstraram ao Sinaval  interesse em instalar unidades no país ou ampliar as já existentes. A suíça ABB (motores), a italiana Pelegrini (guindastes), a norte-americana Raytheon (radares), a japonesa Daihatsu (motores) e a alemã CSA-ThyssenKrupp (aço) são alguns dos exemplos.

A nossa maior chance de parcerias, de acordo com Prata, é com os europeus, que sofrem fortes restrições nos mercados asiáticos. A Abimaq participou no último mês de março de um seminário organizado pelos ministérios Japoneses do Transporte e do Comércio Exterior para falar sobre o mercado brasileiro naval e as oportunidades de negócios e investimentos nesta área. Segundo ele, os empresários ainda não estão convencidos de que devem investir no Brasil. Por outro lado, o governo japonês conhece a necessidade de estimular suas indústrias a buscarem outros mercados em nações amigas como o Brasil, já que as fábricas de navipeças estão lotadas de pedidos, mas 70% deles, diz Prata, são de encomendas da Coreia e da China, que estão correndo para desenvolver suas próprias indústrias e reduzirem a dependência do Japão.

No evento, uma das propostas da Abimaq foi a instalação de um estaleiro japonês de construção naval no Brasil. Para a associação, este seria o caminho mais simples e rápido para trazerem para o país a cadeia produtiva naval do Japão, seja por instalação de empresas, seja por cooperação com os fornecedores locais. “Creio que a proposta foi recebida com surpresa, mas já provoca a vinda das grandes corporações e estaleiros ao Brasil nos próximos meses para que nós os ajudemos a buscar parcerias com investidores locais e apoio dos governos que estejam interessados em receber novos estaleiros”, adianta

Quem também ainda tem receio de se instalar no país são os noruegueses. Empresa de representações e serviços da área naval e offshore e que agencia no Brasil tradicionais fornecedoras norueguesas de equipamentos, a Macnor - Maritime Cluster of Norway vem tentando buscar junto às suas empresas alguma forma de deixá-las mais próximas dos clientes. “Eles têm interesse, mas tem que ser algum modelo pouco arriscado, porque os noruegueses são muito conservadores. Temos um mercado pela frente, está havendo um aquecimento da indústria, mas ao mesmo tempo vemos também muito projetos que são postergados”, ressalta o diretor de Vendas e de Novos Negócios, Pedro Guimarães.

Ainda assim, a empresa pretende trazer até três empresas para o país nos próximos anos. Inicialmente, diz Guimarães, poderiam criar uma unidade de montagem de componentes e, de acordo com a demanda, poderiam aumentar o negócio no Brasil. “É preciso que haja algum tipo de desenvolvimento aqui, senão daqui a 10 ou 15 anos estaremos em uma situação adversa à que o mercado está exigindo”, estima.

Das 12 empresas que a Macnor representa, duas montaram um escritório no Brasil. São a R&M Ship Interiores Navais, que faz pacotes de acomodação para navios e plataformas, e a Van Der Velden, que produz lemes. Guimarães avalia que, para as empresas cujos equipamentos não são encontrados no país, o mercado está positivo porque não tem concorrência. Por outro lado, as companhias que já fabricam produtos existentes no país têm perdido espaço porque há uma prioridade para equipamentos nacionais.

Como exemplo, ele destaca a Brunvoll, uma de suas representadas que fabrica sistemas de propulsão lateral. Segundo Guimarães, a empresa desenvolve uma tecnologia que não se faz no país. Em contrapartida, a Macnor tem perdido contratos pela preferência por conteúdo nacional no que diz respeito às luzes de navegação que, no caso, é produzida pela representada Thrumberg. “Como é um componente razoavelmente fácil de se fazer, o Brasil está fabricando com qualidade média. A qualidade norueguesa com a brasileira é incomparável, mas consegue atender ao que a Petrobras exige. Então se o armador consegue ter um produto que tenha a mesma certificação e qualidade que atende à Petrobras, ele vai comprar o produto nacional para aumentar o conteúdo exigido a ele “, afirma.

Para estar mais próximos dos clientes e facilitar o atendimento, a Wärtsilä Brasil está ampliando suas instalações. Além da fábrica em Itaguaí, a companhia está construindo desde o mês de março uma oficina em Niterói, também no Rio de Janeiro, para realizar serviços de manutenção de motores azimutais. A unidade, cuja área é de quatro mil metros quadrados, será o ponto de suporte na Região Sudeste. A companhia já tem uma unidade localizada.

Em Suape, no estado de Pernambuco, a companhia também está implantando uma oficina para atender às plantas de geração de energia do Nordeste. A Wärtsilä também possui uma unidade em Manaus, no Amazonas, que atende à região Norte.

Não só na indústria naval, a falta de pessoal qualificado tem sido um gargalo em todos os setores. Sinaval e Firjan acreditam que os institutos de capacitação de mão de obra têm suprido a necessidade e, ao longo do tempo, a indústria terá pessoal capacitado. Já a Abimaq diz que a baixa escolaridade proporcionada por seguidas décadas resultou nesta carência, que será um freio ao crescimento.

Com todas as suas dificuldades, Papini diz que o país tem contornado os obstáculos para que o setor seja competitivo. “Queremos ter a melhor indústria com 100% de conteúdo local e temos que passar por um processo de aprendizado. Estamos aprendendo de novo a fazer navios e hoje não temos nada a deixar desejar com a construção naval lá de fora. Lá atrasa também”, compara. Para a Abimaq, no entanto, o Brasil precisa resolver todos os seus percalços para voltar a ser uma indústria pujante. “Caso o governo consiga criar uma política de governo eficaz para o setor e rever os regimes tributários de viés importador; a área econômica consiga conter o câmbio, a Petrobras entenda seu papel no desenvolvimento industrial, os projetos se realizem sem os atrasos observados nos últimos anos, teremos em poucos anos uma indústria de navipeças importante como a que tivemos até os anos 80”, conclui.  n

 






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