Foto: Guto Nunes
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Forte demanda de exploração e produção de petróleo impulsiona a atual expansão do parque industrial naval pelo Brasil afora
Litoral mais próximo dos campos do pré-sal, o Rio de Janeiro continua sendo o coração da indústria naval no Brasil, porém com as crescentes demandas da Petrobras por plataformas, sondas de perfuração e barcos de apoio este panorama está mudando.
As recentes descobertas de petróleo em águas profundas — localizadas cada vez mais longe das costas — vem acarretando, entre outras necessidades, uma significativa ampliação do parque naval.
Segundo o Sindicato Nacional da Indústria de Construção e Reparação Naval e Offshore (Sinaval), os estaleiros nacionais possuem, atualmente, uma capacidade produtiva de 560 mil toneladas/ano em processamento de aço, em uma área que chega a mais de 4,3 milhões de metros quadrados, 19 diques secos, 21 carreiras e 42 cais. “O país está construindo capacidade estimada de 28 sondas de perfuração, 150 navios petroleiros, 200 navios de apoio offshore e 150 plataformas de produção”, contabiliza o presidente do sindicato, Ariovaldo Rocha.
Com as atenções e esforços voltados para este segmento, os demais estados litorâneos vêm conquistando empreendimentos dos mais variados portes. Sem contar com a escassez de espaço físico para essas construções no cenário fluminense, a busca por áreas situadas à beira-mar e protegidas é apenas o primeiro passo para a expansão do parque industrial. Entre as vantagens destas construções fora do Rio de Janeiro está o forte apoio dos governos.
Além de gerar empregos, a mudança nesta escala aumenta o consumo de aço e de navipeças. Entretanto, outros pontos chaves devem ser muito bem resolvidos, como políticas públicas para que a demanda realmente se concretize a longo prazo e que o crescimento aconteça de forma sustentável. Os incentivos governamentais e outras facilidades oferecidas vêm sendo de extrema importância para atrair as novas instalações, capazes de gerar desenvolvimento sócioeconômico para a região contemplada, como é o caso dos estados do Nordeste e Sul do país.
Um bom exemplo é Pernambuco, que abriga o moderno Estaleiro Atlântico Sul, onde estão sendo construídos 22 navios petroleiros para a Transpetro. Com 1,62 milhões de metros quadrados de terreno e capacidade de 160 mil toneladas/ano em processamento de aço, o estaleiro conta com tecnologia de ponta licenciada pela sul-coreana Samsung Heavy Industries. Ângelo Bellelis, presidente do EAS, enfatiza que o Nordeste não tinha tradição na indústria naval. E para enfrentar esse quadro, a empresa idealizou e executou um programa de qualificação, que tem como prioridade a formação de soldadores e montadores. Hoje são 3,8 mil trabalhadores e, desse total, em torno de 2,6 mil foram formados pelo programa. “Para as ocupações mais graduadas, contratamos em outros estados especialistas com expertise na área. Fomos buscar profissionais, principalmente, no Rio e em Santa Catarina”, afirma Bellelis.
Em uma outra frente, o EAS contratou, no Japão, soldadores brasileiros com grande experiência. A necessidade dessas contratações se deveu ao curto prazo para atender às encomendas de navios para a Transpetro e do casco da plataforma P-55, da Petrobras. Além disso, esses trabalhadores trazem know how acumulado no Japão, que tem sólida tradição no segmento.
O presidente do estaleiro reitera a importância do crescimento local e cita a Zinque, RIP, Decoship, EBSE, Fiberglass, Selesor, Esab, Lincoln, Máquinas Piratininga, Dedini/Codistil, Utinav, Metalgil, Engita, Metalpil, Avantia, Estaf, Mills, Saraiva e White Martins como empresas com planos de se instalarem no Complexo de Suape. “Queremos que essa lista seja cada vez maior e que, no futuro, venhamos a ter grandes integrantes de nossa cadeia produtiva instalados por aqui”, alega.
O Sul do país está capacitado a processar 77 mil toneladas/ano de aço, em uma área que soma 690 mil metros quadrados. A região tem como base o Estaleiro Rio Grande (ERG) – empreendimento da construtora paulista WTorre Engenharia, recentemente vendido à Engevix Engenharia e à Fundação dos Economiários Federais (Funcef). A área total construída é de 440 mil metros quadrados e abriga o maior dique seco da América Latina. O dique possui 133 metros de largura por 350 metros de comprimento e terá capacidade de receber, simultaneamente, duas embarcações para construção ou manutenção. O consórcio Engevix já tem encomendas de oito cascos de navios plataformas tipo FPSO (unidades flutuantes de produção, processo, armazenamento e transferência de óleo bruto) para a Petrobras e consolidará a área, definitivamente, como mais um importante centro naval. O objetivo da empresa é construir os cascos e ainda vencer as licitações para construção de módulos e integração, concentrando suas operações no sul do estado. Apesar do dique seco estar comprometido por cinco anos com a fábrica de cascos, a Engevix corre atrás de novas áreas para adquirir.
Enquanto isso, no Sudeste, o Jurong Espírito Santo — à frente da construção e instalação dos módulos para a plataforma FPSO P-62 — inicia suas funções com o aval de Paulo Hartung, governador do Estado, e da Secretaria Estadual de Desenvolvimento. “Recebemos o convite muito especial do governador e tivemos total apoio dos governos estadual e municipal desde 2008, quando começaram as negociações”, contam os dirigentes do empreendimento via assessoria de imprensa. Segundo eles, a contratação de mão de obra capixaba é certa e há proposta, ainda, de um amplo programa de capacitação profissional, em parceria com renomadas instituições como Instituto Federal do Espírito Santo (Ifes), Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai) e Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes). “A expectativa é de que a instalação do empreendimento aumente a cadeia de fornecedores locais de serviços e matéria-prima, assim como o desenvolvimento do setor metalmecânico da região”, complementa a empresa.
A indústria naval tem por característica demandar produtos e serviços dos mais diversos segmentos e, com a descentralização, se faz necessário que a cada novo polo naval corresponda o desenvolvimento de uma cadeia de fornecedores de bens e serviços. Espera-se que a longo prazo a regionalização proporcione aumento da competitividade — tanto das empresas fornecedoras de navipeças e serviços quanto dos próprios estaleiros —, o que poderá estimular disputas de encomendas com armadores internacionais.
O gerente de comissionamento do Jurong, Rubens Galvão, reforça que o forte crescimento da demanda de navios e plataformas, advinda especialmente da Petrobras, é o principal fator da expansão dos estaleiros. O que, para ele, influi diretamente na economia, fortalecendo melhor distribuição de renda, sobretudo nos estados do Norte/Nordeste, evitando o êxodo de mão de obra. Com o crescimento da exploração do petróleo e, levando em consideração a demanda necessária para o atendimento a esta indústria, há necessidade eminente de novos estaleiros. “Por isso esta desregionalização acaba sendo inevitável, principalmente por aspectos físicos e geográficos, já que as áreas propícias a essas atividades já estão ocupadas”, afirma Rubens.
Em andamento. Outras regiões do Brasil também contam com implantação de estaleiros. A OAS, a Setal e a Piemonte Investimentos irão investir US$ 400 milhões na construção do Estaleiro Bahia, que será instalado no Recôncavo Baiano, às margens da Baía de Todos os Santos. A finalidade do projeto é construir sondas de perfuração, plataformas de produção, navios de apoio a operações offshore e petroleiros. A Odebrecht também pretende montar uma planta na região. Segundo Rafael Amoedo, secretário de indústria, comércio e mineração do estado da Bahia, ainda há outra empresa interessada na região — o que resultaria em, aproximadamente, US$ 1 bilhão em investimentos para a criação do polo.
Como forma de incentivo, o governo baiano regulamentou o Pronaval, programa que viabiliza a implantação de infraestrutura e a montagem, fabricação, construção, modernização, conversão e reparo de embarcações, plataformas, módulos e sistemas destinados à exploração, produção, armazenamento e transporte de petróleo, gás natural e seus derivados.
Em Pernambuco, o Complexo do Suape poderá receber mais um estaleiro, além do EAS. A Alusa, em consórcio com a Galvão Engenharia e Songdong, projetam investimento de US$ 350 milhões para um novo empreendimento.
Ainda em fase de negociação, principalmente sobre questões ambientais, o Estaleiro Enseada do Paraguaçu depende de contratos de construção. Idealizado para a produção de navios e plataformas de exploração do petróleo e com localização idealizada no entorno de São Roque do Paraguaçu, o empreendimento deve gerar oito mil novos postos de trabalho, sendo metade deste número na fase de implementação e o restante durante as operações.
A ser lançado em breve, o Eisa Alagoas, desde o início das negociações, vem recebendo total apoio do governo e da Secretaria do Desenvolvimento Econômico de Alagoas, que não medem esforços para superar as dificuldades que vêm surgindo. “Da mesma forma, podemos falar da prefeitura de Coruripe, através do prefeito Marx Beltrão, que também tem colocado à nossa disposição toda infraestrutura necessária. O que nos dá a certeza de que estamos na direção e no lugar certo”, relata a direção do Eisa, também via assessoria de imprensa. Ainda segundo ela, a logística para o abastecimento do estaleiro se dará de duas maneiras: através da rodovia AL-101, que dá fácil acesso à região e faz ligação com o porto de Maceió, e pelo mar, visto que o porto está localizado a 80 quilômetros ao Sul. Demais serviços como alimentação, serralheria, mecânica, materiais, suprimento de EPI, gases, energia e outros serão feitos por empresas de Alagoas e outras que certamente serão estimuladas a se instalar no estado.
Tanto o governo de Alagoas como a prefeitura de Coruripe estão revisando seus Planos Diretores, com o intuito de atender às necessidades como moradia, sistema de água e esgoto, ensino, comunicação e rodoviário, visando ao crescimento planejado.
No início de junho, Eike Batista, dono da empresa OSX, que idealiza a construção do Estaleiro Santa Catarina – Biguaçu, na Grande Florianópolis, com valor estimado em torno de R$ 2,5 bilhões, recebeu um não da área ambiental. Por meio de um parecer definitivo, o Instituto Chico Mendes, órgão ligado ao Ministério do Meio Ambiente, foi contrário à construção, que tinha localização prevista entre três unidades de Conservação Federal (Área de Proteção Ambiental do Anhatomirim, Estação Ecológica de Carijós e Reserva Biológica do Arvoredo).
Porém, o empresário já tenta um plano B para implantação do empreendimento no Rio de Janeiro. A OSX se organiza para ter duas opções locacionais e garantir o investimento, onde o licenciamento ambiental sair antes.
Já o vencedor da licitação para a construção de oito navios gaseiros à Transpetro, o Promar prevê, em sua fase inicial, um investimento em torno de R$ 150 milhões. Após muitos impasses entre a prefeitura do Ceará — onde o estaleiro seria inicialmente instalado — e o governo de Fortaleza, no dia 30 de junho, foi batido o martelo. O presidente da Transpetro, Sérgio Machado, anunciou que Pernambuco foi escolhido como a nova localização do empreendimento, vencendo a Bahia, Maranhão e Alagoas — também interessados no construção do estaleiro, que promete gerar 1,5 milhão de empregos diretos.
A prefeita do Ceará, Luizianne Lins, foi contra a construção na capital, com base nos resultados de estudos realizados nas praias do Titanzinho, Pirambu, Poço da Draga, Pecém e do Camocim. Os custos da construção de enrocamentos e aterros, além dos impactos ambientais, paisagísticos e urbanísticos foram motivos para o impasse.