Pernambuco (Ipojuca). Entrou muda e saiu calada. O silêncio da presidente da Petrobras, Graça Foster, na solenidade de entrega do navio João Cândido pelo Estaleiro Atlântico Sul (EAS) à Transpetro, ontem, no complexo portuário de Suape (PE), chamou tanta atenção quanto o fato de o nome do antecessor dela, Sérgio Gabrielli, não ter sido citado uma única vez nos discursos dos empresários e autoridades que se manifestaram durante o evento.
O mutismo de Graça Foster, no entanto, não inibiu o otimismo que marcou as palavras dos demais. "O petroleiro é prova de tudo o que vivemos nesses cinco anos da nossa empresa", disse Otoniel Reis, presidente do estaleiro. "Saímos da fase da inércia e vamos para a fase da produtividade. Vamos agora cumprir o terceiro pilar do programa, porque os dois primeiros a gente já cumpriu: fabricar navios no Brasil e atingir 65% de nacionalização. Taí o ´bichão´ para mostrar", acrescentou o presidente da Transpetro, Sérgio Machado, apontando para o navio. "Temos que estar juntos para garantir produtividade e sustentabilidade. É assim que vamos colocar a indústria naval brasileira no cenário mundial", observou.
Multa
O que Machado não disse ao público foi que a Transpetro resolveu multar o EAS pelo atraso da encomenda. O navio começou a ser fabricado em 2008 e deveria ter sido entregue em 2010.
E isso tem um significado doloroso: prejuízo. O serviço foi contratado por R$ 300 milhões. Com a sequência de retardamentos, em função de problemas com soldas, entre outros, acrescentou cerca de R$ 170 milhões ao custo final.
"O valor da multa está sendo avaliado de acordo com cláusulas do contrato de compra do navio, que é parte de uma encomenda de 10 embarcações do tipo Suezmax feita ao estaleiro", anunciou a Transpetro em nota distribuída ainda ontem.
Justificar atraso
Ainda assim, houve tentativas de justificar o atraso de mais de dois anos. "Todo processo fabril tem um termo chamado de ´curva de aprendizagem", disse o governador de Pernambuco, Eduardo Campos (PSB), que, num lapso, chamou a presidente da Petrobras de "Graça Fortes".
E citou Luiz Gonzaga, Roberto Carlos, Pelé e Neymar como exemplos de quem não fez sucesso na primeira empreitada.
"Não é justo que se cobre isso", disse. "Do mesmo jeito que João Cândido (o marinheiro que comandou a Revolta da Chibata, em 1910) sofreu preconceito, na vida pública muitas vezes também há preconceito". E arrematou com estilo: "Se alguma coisa atrasou nesse País, foi a chegada do presidente Lula à Presidência da República".
Silêncio da presidente da Petrobras, Graça Foster, chamou a atenção no evento, que foi realizado em Ipojuca, em Pernambuco FOTO: AGÊNCIA BRASIL
Estrutura
O João Cândido tem 274 metros de comprimento e capacidade para transportar 1 milhão de barris. É o segundo petroleiro do Programa de Modernização e Expansão da Frota da Transpetro (Promef) a entrar em operação - o primeiro foi o Celso Furtado, entregue à empresa em novembro de 2011 pelo Estaleiro Mauá, no Rio de Janeiro. O filho do "Almirante Negro" (1880-1969), Adalberto do Nascimento Cândido, representou a família ontem, na entrega do navio. Cerca de 5 mil trabalhadores, conforme a assessoria de imprensa do EAS, todos devidamente uniformizados com roupas de cor azul, acompanharam a solenidade.
E, como costuma ser em ocasiões do gênero, se dividiram em palmas e apupos de acordo com os critérios que formaram a respeito de quem era mencionado. Ao presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de Pernambuco, Alberto Alves dos Santos, o "Betão", por exemplo, era garantida uma enxurrada de vaias - ele estava presente e pode ouvir.
Outro metalúrgico, esse mais famoso, o ex-presidente Lula, ausente, era saudado com aplausos calorosos - literalmente calorosos, considerando a temperatura ambiente.
PROTAGONISTA
Oportunidade para a carreira mudar a direção
Há dois anos e oito meses, o motorista Alberto Barbosa, 46, deu nova direção à sua vida. Deixou o serviço que fazia, no qual se alternava entre caminhões, carros particulares e transporte alternativo, e conseguiu uma vaga como operador de máquinas no Estaleiro Atlântico Sul. Ontem, ele celebrava com colegas a entrega do João Cândido. O funcionário relatou que foi muito emocionante acompanhar a entrega do navio. Segundo ele, a empolgação foi tão grande que diversos amigos dele compareceram à cerimônia, tanto os que continuam operando no estaleiro quanto alguns que já não estão mais trabalhando no Atlântico Sul. Passada a fase João Cândido, o futuro do operador agora atende pelo nome de Zumbi de Palmares. É o novo petroleiro que o EAS já está construindo. Segundo ele será dada toda a atenção e o apoio ao Zumbi e às plataformas.
Fonte: Diário do Nordeste (CE)/ROBERTO MACIEL
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