A transferência do conhecimento gerado nas universidades para o setor industrial é uma tarefa indispensável, mas que não tem ocorrido com a rapidez desejada e de forma articulada e global. Por isso, grupos de pesquisa nas diversas unidades de ensino da USP têm buscado interagir com maior vigor com a indústria – sem abrir mão da realização de pesquisa básica, de fundamental importância para o desenvolvimento tecnológico.
Um exemplo neste sentido é o Laboratório de Espectroscopia de Alta Resolução por Ressonância Magnética (Lear), sediado no Instituto de Física de São Carlos (IFSC) da USP. Criado em meados de 1988, desde 2009 o grupo mantém estreita parceria com o Cenpes/Petrobras, por meio de projetos apoiados pela Agência Nacional do Petróleo (ANP). As iniciativas envolvem ciência do petróleo e de meios porosos, com destaque para o tema “Fluidos Presentes em Rochas Reservatórios”.
PUBLICIDADE
O foco sempre foi apresentar estudos, técnicas e instrumentação que pudessem contribuir para uma maior eficácia na exploração do petróleo, bem como criar, em um futuro próximo, um Centro de Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação em Ressonância Magnética Nuclear (RMN) e Ciência do Petróleo no campus da USP em São Carlos, com o apoio integrado da Petrobras.
O primeiro degrau desta colaboração surgiu em 2012, com a construção de uma sonda de RMN específica para estudo de óleos em condições de reservatório, em alta pressão e temperatura. Enquanto o IFSC contribuía na parte de instrumentação e técnicas avançadas de RMN, Cenpes e pesquisadores voltaram-se para a exploração do petróleo com a técnica de RMN, com a importante presença de um egresso do IFSC, Willian Andrighetto Trevisan, desde 2012 funcionário do Cenpes.
Com o avanço dos trabalhos, a equipe do Lear, chefiada pelo professor Tito José Bonagamba e constituída por alunos de pós-graduação e pós-doutores, apresentava uma nova vertente de pesquisa básica e aplicada, através de Ressonância Magnética Nuclear, que envolveu físicos que atuavam em várias frentes de pesquisa congregando aspectos teóricos, experimentais e computacionais da técnica, bem como a utilização de outras metodologias, incluindo microscopia tridimensional de raios-x e de petrofísica básica.
Em suma, foi a concretização de uma proposta de pesquisa inovadora na área de ciência do petróleo que mostrou um potencial muito grande de cooperação, não só para a Petrobras como para o próprio instituto, incentivando uma maior aproximação com a indústria e a geração de novas opções de emprego para egressos fora do tradicional ambiente acadêmico.
Tito Bonagamba: mais importante que a parceria para infraestrutura foi a interação de sucesso entre pesquisadores de alto nível – Foto: Divulgação/IFSC
Com o sucesso dessa primeira etapa e o entusiasmo de ambas as partes, foi possível avançar ainda mais nas pesquisas desenvolvidas pelo Lear e ao mesmo tempo atender às crescentes demandas do Cenpes. Neste período, o Lear organizou no Cenpes três reuniões temáticas, traduzidas no título Workshop on Porous Media, a última delas no último dia 19 de janeiro.
Nesse workshop foram apresentados os resultados obtidos com as principais linhas de pesquisa desenvolvidas no grupo, bem como a entrega oficial de um novo Espectrômetro de Ressonância Magnética Nuclear (RMN) adquirido pela Petrobras, mas que obedeceu a determinadas especificações projetadas pelo Lear, em parceria com a empresa americana Tecmag. O equipamento permaneceu durante algum tempo no IFSC para testes, confecção de sondas de RMN apropriadas à indústria do petróleo e realização de vários estudos. Este espectrômetro está vocacionado para o estudo da dinâmica de fluidos presentes em rochas reservatórios, e em vias de ser operado pelos pesquisadores do Cenpes.
Um movimento que deve continuar
No evento, coube ao professor Tito José Bonagamba apresentar uma visão geral sobre as atividades do Lear na área de fluidos presentes em rochas reservatórios, ao que se seguiram diversas apresentações sob a responsabilidade dos alunos de doutorado e pós-doutorandos do grupo. Eles falaram sobre pesquisas desenvolvidas com técnicas originais e inovadoras, e que dão destaque às demandas da Petrobras.
Também fez parte da equipe que visitou o Cenpes o professor Fernando Fernandes Paiva, atualmente ingressando nas linhas de pesquisa do Lear dentro da área de Imagens por Ressonância Magnética, com a expectativa de trazer grandes progressos ao grupo de pesquisa.
O time do Lear apresentou ainda, de forma geral, o uso de novas técnicas para o estudo das rochas reservatórios, bem como a dinâmica dos fluidos presentes em seus interiores, propondo, em simultâneo, programas de alto nível para simulação de dados dos reservatórios de petróleo. O tema é de grande interesse para a Petrobras na busca pelo aumento da produção.
Bonagamba destacou que, com os resultados positivos do evento, “são colocados agora novos desafios para todo o grupo de pesquisa, o que inclui criar uma infraestrutura física que seja capaz de acolher um simulador de poço de petróleo, algo que foi cogitado fazer desde o início desta parceria, inserindo o projeto e construção de magnetos permanentes apropriados para estudos em condição de perfilagem”.
Para o professor, contudo, o principal aspecto a ser considerado é que o IFSC conseguiu levar a academia para dentro da indústria. “É esse o movimento que deve subsistir.” Assim, mais do que equipamentos, o que deve ser sublinhado são as pessoas que fazem parte da equipe: um grupo de pesquisadores de alto nível que soube interagir de forma fantástica com as expectativas e necessidades da Petrobras.
Retorno do investimento
Coube a Vinicius de França Machado, a cargo da Gerência de Integração Rocha Perfil Sísmica, área que se encontra inserida no P&D de Exploração e Produção da Petrobras, fazer um balanço do evento.
Para ele, o que se retira de imediato é que o investimento que a Petrobras está fazendo no IFSC tem retorno para a empresa e isso é a base sólida para que se continue a investir. “Vou ser bem sincero: alguns dos investimentos que a Petrobras faz com universidades não dão retorno, ao contrário deste que foi feito com o Lear, cujos resultados estão bem à vista. E é isso que queremos manter e aumentar.”
Para Machado, o papel da universidade é gerar e manter esses grupos ativos, independente do fato de alguns membros deles irem para a indústria, ficarem na academia ou criarem seu próprio modo de subsistência. De fato, a parceria entre o Cenpes e o Lear é um autêntico caso de sucesso, principalmente porque os projetos apresentados geraram resultados práticos importantes, equipamentos, novos métodos e processos, enfim, conhecimentos sendo construídos e passados adiante.
Fonte: Jornal da USP