Foto: Guto Nunes
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Em vigor desde janeiro, NR-34 vem auxiliando na prevenção de acidentes no setor naval. Norma deve sofrer mudanças em 2012
O reaquecimento do setor naval, consequência dos investimentos na construção de navios e plataformas, tem contribuído para aumentar a geração de empregos nos estaleiros. Segundo dados do Sindicato Nacional da Indústria da Construção e Reparação
Naval e Offshore (Sinaval), enquanto no ano 2000 havia cerca de 1,9 mil trabalhadores empregados no setor, em 2010 este número chegou a 78,4 mil. Paralelamente a isso, no entanto, a tendência é que o aumento do número de acidentes de trabalho também aumente.
As atividades de reparo e construção de embarcações — soldagem, jateamento, pintura e esmerilhamento, entre outros — apresentam alto risco à vida do trabalhador. O estudo “As boas práticas da inspeção do trabalho no Brasil: setor marítimo”, publicado no ano passado pela Organização Internacional do Trabalho, ressalta que fatores como tamanho das estruturas, grande contingente de trabalhadores envolvidos, serviços simultâneos, espaços confinados e trabalhos em altura tornam a inspeção do trabalho imperativa. O excesso de horas extras também é abordado no estudo como um atributo diretamente relacionado à ocorrência de acidentes de trabalho.
A fim de proteger os trabalhadores da indústria naval, as normas regulamentadoras do setor vêm ajudando na prevenção de acidentes. Além disso, o aprimoramento destas regras também tem sido uma constante no segmento. Uma das mais recentes é a NR-34, que trata das condições e meio ambiente de trabalho na indústria da construção e reparação naval. Em vigor desde janeiro deste ano, a norma pode sofrer algumas mudanças nos próximos meses.
Uma delas é um anexo à norma para tratar de espaço confinado na indústria naval. Sobre este assunto atualmente existe a NR-33. De acordo com o assessor da presidência do Sinaval, Marcelo de Carvalho, esta legislação foi montada baseada em projeto de silos, bastante utilizado no Sul do país, mas que vem causando alguns problemas de fiscalização. “Para nós, é muito ruim esse tipo de comparação, porque nós temos uma filosofia diferente do que é o espaço confinado. O que estamos querendo é justamente acabar com esse tipo de adaptação da NR-33 para o nosso trabalho”, afirma. Segundo Carvalho, o pedido será solicitado ao ministério do Trabalho no início do ano.
Outra solicitação, esta feita no último mês de agosto e já aceita pelo ministério, segundo Carvalho, é uma portaria que prevê a suspensão temporária da fiscalização no que diz respeito à qualificação de soldadores e trabalhadores em testes de estanqueidade. “Estamos pedindo uma prorrogação na fiscalização no período de 12 meses. Estamos aguardando a publicação da portaria e acredito que deva sair entre dezembro e janeiro”, estima. Carvalho destaca que as escolas técnicas não têm conseguido atender à demanda de qualificação. Por isso, o sindicato estuda um projeto junto ao Senai para abrir escolas de qualificação dentro dos estaleiros. “O estaleiro capacita, mas não qualifica. A ideia é que o estaleiro crie o espaço e o Senai o abasteça com os orientadores”, explica.
Na avaliação da secretária de Inspeção do Trabalho do ministério do Trabalho, Vera Albuquerque, esta norma trouxe mudanças positivas desde o momento em que começou a ser criada. “Os representantes dos estaleiros participaram da construção do texto da norma, que foi feita por várias mãos que trabalhavam nessa indústria”, destaca. A contribuição destes trabalhadores e representantes de estaleiros foi uma das inovações desta norma frente à elaboração de outras.
Anteriormente à NR-34, lembra Vera, auditores fiscais adaptavam itens da NR-18, por exemplo, que aborda as condições e meio ambiente de trabalho na indústria da construção, para realizar as fiscalizações. “O desenho de um casco de navio, por exemplo, é completamente diferente de um prédio; o que você pode prender em termos de andaime na fachada de um prédio não é da mesma forma num casco de navio. Então precisava realmente haver uma especificação particular para o trabalho em estaleiros”, diz.
Fiscalização. O ministério do Trabalho está aumentando o número de auditores fiscais do trabalho. Após um período de ambientação nas superintendências, cerca de 220 profissionais iniciaram treinamento desde o último dia 21 de novembro, em Brasília. Entre as atividades a serem ensinadas está a NR-34. Apesar do crescimento no número destes funcionários, Vera afirma que o ministério ainda precisa de novas contratações.
“Ainda estamos com auditores fiscais do trabalho em uma quantidade menor do que deveríamos ter para poder atender ao enorme crescimento do país, principalmente no ramos da construção civil e naval, que foram dois vetores de crescimento. O número de obras cresceu muito e atualmente estamos com o número muito aquém do que deveríamos para fazer a proteção do trabalhador”. Segundo ela, existe a possibilidade de um novo concurso em 2012.
A secretária destaca também que não existem auditores fiscais exclusivos para a construção naval e sim grupos que são especialistas na área portuária e aquaviária, que eventualmente realizam a fiscalização. Esta equipe tem cerca de 50 integrantes. “Qualquer auditor fiscal do trabalho tem a competência legal para atuar em todas as atividades, mas é claro que existe aquele que conhece mais sobre uma área. Esse grupo já está treinado, mas havendo a necessidade chamamos outros colegas que se unem a eles para fazer todas as fiscalizações planejadas”, comenta.
Apesar de não haver um levantamento sobre o número de acidentes após a entrada em vigor da NR-34, Vera destaca que o cuidado com a segurança do trabalhador nos estaleiros está maior. No entanto, ela declara que apesar de os parques estarem interessados em cumprir as normas de segurança, acidentes continuam acontecendo em razão do perigo das atividades em estaleiros. “O número de empregados da indústria naval está crescendo extraordinariamente, então havendo mais gente trabalhando infelizmente acontecem também mais acidentes. Não adianta quantificar se o número de acidentes aumentou ou diminuiu, porque o número de trabalhadores, de navios em construção e de estaleiros também está crescendo”, afirma.
A cada transgressão em um estaleiro, o auditor fiscal lavra um auto de infração. A secretária explica que a empresa tem um prazo para apresentar sua defesa. Um auditor fiscal do trabalho então analisa tanto o auto como a defesa. Caso o auto seja procedente, a empresa é multada. A imposição da penalidade é baseada em diversos fatores, como o grau da infração, o número de funcionários da companhia e se é reincidente ou não. Caso o estaleiro opte por não entrar com recursos, a multa é paga pela metade.
O estudo “As boas práticas da inspeção do trabalho no Brasil: setor marítimo” aponta que entre 2006 e 2010 foram fiscalizadas 942 empresas da indústria naval no país, sendo que 29 empresas foram interditadas e 848 autos de infração lavrados. No Rio de Janeiro, estado que concentra o maior número de estaleiros, foram fiscalizadas 429 empresas, resultando em 13 interdições e 477 autuações.
O documento destaca também um avanço no combate à terceirização. Segundo o estudo, no início do programa de inspeção naval no Rio de Janeiro, em 2006, os estaleiros contratavam diretamente somente 20% dos trabalhadores. A contratação dos 80% restantes era proveniente de empreiteiros e prestadores de serviço. No ano passado, aponta a publicação, houve uma inversão dos valores, com 80% dos trabalhadores sendo contratados diretamente pelos estaleiros e apenas 20% através de terceirizações. A alteração é consequência, segundo o estudo, de uma atuação mais incisiva da inspeção do trabalho, da melhoria das condições econômicas do setor e da conscientização dos empregadores. O estudo mostra ainda uma queda no índice de doenças ocupacionais. Enquanto em 2006 foram registradas 242 ocorrências, o número em 2008 era de apenas 18.
Com base na NR-34, deve sair em breve uma portaria que vai estabelecer procedimentos para transporte de pessoas em guindastes. Segundo Carvalho, a última reunião de revisão das contribuições da consulta pública aconteceu no último mês de setembro e a norma já está aprovada.
Carvalho acrescenta também que a norma virá com a denominação NR-35, que vai tratar do cesto aéreo. “Temos o famoso problema de colocar pessoas na plataforma por meio do cesto em guindaste. Será um trabalho específico para rampas, passarelas e acesso a embarcações”, conclui.
PNSST. O governo demonstra estar de olhos abertos no que diz respeito à proteção dos trabalhadores do país. A fim de promover a saúde e a melhoria da qualidade de vida do trabalhador e a prevenção de acidentes e de danos à saúde, a presidente Dilma Roussef lançou no último dia 7 de novembro a Política Nacional de Segurança e Saúde no Trabalho (PNSST). De acordo com o Decreto 7.602, a PNSST deverá ser implementada através da articulação continuada das ações de governo no campo das relações de trabalho, produção, consumo, ambiente e saúde, com a participação voluntária das organizações representativas de trabalhadores e empregadores. A implementação e execução da PNSST serão de responsabilidade dos ministérios do Trabalho e Emprego, da Saúde e da Previdência Social.
O Plano Nacional de Segurança e Saúde no Trabalho será desenvolvido de acordo com diversas diretrizes. Entre elas estão: a inclusão de todos trabalhadores brasileiros no sistema nacional de promoção e proteção da saúde; harmonização da legislação e a articulação das ações de promoção, proteção, prevenção, assistência, reabilitação e reparação da saúde do trabalhador; adoção de medidas especiais para atividades laborais de alto risco; estruturação de rede integrada de informações em saúde do trabalhador; promoção da implantação de sistemas e programas de gestão da segurança e saúde nos locais de trabalho; e promoção de agenda integrada de estudos e pesquisas em segurança e saúde no trabalho.
Ao ministério do Trabalho e Emprego caberá, entre outras ações, formular e propor as diretrizes da inspeção do trabalho, bem como supervisionar e coordenar a execução das atividades relacionadas à inspeção dos ambientes de trabalho e respectivas condições de trabalho; elaborar e revisar, em modelo tripartite, as normas regulamentadoras de segurança e saúde no trabalho; participar da elaboração de programas especiais de proteção ao trabalho; e promover estudos da legislação trabalhista, propondo o seu aperfeiçoamento.
Entre as responsabilidades do ministério da Saúde estão o fomento à estruturação da atenção integral à saúde dos trabalhadores, envolvendo a promoção de ambientes e processos de trabalho saudável; promoção da revisão periódica da listagem oficial de doenças relacionadas ao trabalho; contribuição para a estruturação e operacionalização da rede integrada de informações em saúde do trabalhador; e apoio ao desenvolvimento de estudos e pesquisas em saúde do trabalhador;
Já ao ministério da Previdência Social compete subsidiar a formulação e a proposição de diretrizes e normas relativas à interseção entre as ações de segurança e saúde no trabalho e as ações de fiscalização e reconhecimento dos benefícios previdenciários decorrentes dos riscos ambientais do trabalho; realizar estudos, pesquisas e propor ações formativas visando ao aprimoramento da legislação e das ações do Regime Geral de Previdência Social e dos Regimes Próprios de Previdência Social e por intermédio do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) realizar ações de reabilitação profissional; e avaliar a incapacidade laborativa para fins de concessão de benefícios previdenciários.
A gestão participativa da PNSST é de responsabilidade da Comissão Tripartite de Saúde e Segurança no Trabalho (CTSST), que é constituída paritariamente por representantes do governo, trabalhadores e empregadores.