Estrangeiros já servem a costa com navegação de longo curso. Temos de permitir que eles também façam cabotagem.
Todos os que militam no transporte e na logística no País conhecem nossas dificuldades, que não são poucas. É sabido que temos uma matriz de transporte inadequada às nossas necessidades, em que o modo rodoviário é predominante no transporte interno de mercadorias - o que faz da nossa logística um item extremamente caro.
Para isso, algumas ações têm sido implementadas nos últimos anos, desde a abertura econômica introduzida em 1990. Tivemos uma nova abertura dos portos, bem como de aeroportos e de pontos de fronteira, de forma a permitir uma mudança da estrutura logística brasileira.
Uma delas foi a transferência das operações portuárias à iniciativa privada, através da Lei número 8.630, de 1993. Com isso, tivemos um aumento da nossa capacidade de operação, bem como de produtividade. Passamos de 5 a 8 operações de contêineres por hora para 40 movimentos em média. E com o Tecon-Santos com capacidade de 55 operações, a caminho de 90.
Em que já se fizeram 110 em embarques isolados. E com redução do custo de operação de US$ 600.00 para cerca de US$ 250.00 por movimento. Em relação ao mundo, ainda há muito que melhorar. Isso permitiu o renascimento da cabotagem em águas brasileiras. Com custos operacionais menores, e com a agilização dos embarques e desembarques, o transporte de mercadorias pela costa marítima brasileira foi viabilizado.
Em especial, que os portos podem cobrar menos do que no transporte de longo curso, aquele feito entre países. Tudo para incentivá-lo, porque, além de mais barato que o rodoviário, ainda compete com ele na capacidade, na poluição e nos congestionamentos. E a cabotagem não decepcionou. As empresas brasileiras entenderam o "novo" transporte e o incentivaram. Por isso tornou-se o modo que mais cresce no setor.
Em meados da década de 90 não se embarcavam contêineres. Em 1999 o total situou-se em 20.000 TEU (twenty-foot equivalent unit, ou unidade de 20 pés, equivalente a 6,09 m). Em 2009, esse número já tinha saltado para algo como 500.000 TEU. Mas precisamos incentivar ainda mais a cabotagem. É preciso que façamos a substituição do veículo rodoviário. Que este se situe na sua faixa lógica de operação. Que é a de distribuição de carga. E o transporte em pequenas distâncias, de máximo uns 500 quilômetros.
É necessário também mudar a posição de vedete do transporte, como auxiliar dos demais modos nas operações de intermodalidade e multimodalidade. Mas, para que isso aconteça, entendemos que precisamos ter fretes ainda mais baratos do que os atuais. A diferença com o rodoviário precisa ser contundente: ela precisa chamar a atenção dos empresários.
O frete precisa ser de tal forma vantajoso que estabeleça um novo padrão para nossa matriz de transporte. Ela tem de se tornar de padrão internacional. Com menores custos, toda a economia sai ganhando. Com produtos mais baratos, teremos mais consumo, mais produção, mais emprego etc. Além da criação de mais empresas brasileiras de navegação, ou então com o crescimento da oferta das atuais, entendemos que temos à mão um instrumento extra para utilização, que são as empresas estrangeiras de navegação.
Se as empresas estrangeiras já servem a costa brasileira com a navegação de longo curso, o que estamos esperando? Temos de permitir que essas companhias também façam cabotagem, embarcando e desembarcando carga nos portos que operam normalmente. Como as empresas já existem, como os navios já estão no tráfego, e como, certamente, existe espaço, teríamos dessa forma um barateamento dos fretes.
Portanto, só temos de utilizar a estrutura que já existe. Certamente teríamos o argumento de que estaríamos nas mãos de empresas estrangeiras. Quanto a isso, não seria nenhuma novidade para ninguém. Essa situação já existe hoje com as empresas que são chamadas de "nacionais". E isso ocorre em toda economia brasileira.
Que elas poderiam sair do País ou deixar de fazer a operação, achamos que é um argumento falho. Há quantos anos todas essas empresas estrangeiras estão no País, sem deixá-lo? Ninguém vai deixar o que é considerado como vantajoso. Alguém poderia argumentar que isso não existe em nenhuma parte do mundo.
Ok, argumento válido, porém falacioso. Temos muitas coisas que o Brasil faz que não existem em nenhuma parte. Seria apenas mais uma, com ampla vantagem. Se o Brasil costumasse seguir o restante do mundo, teríamos uma matriz de transporte completamente diferente. Com o predomínio do transporte aquaviário e ferroviário teríamos taxa de juros como no restante do planeta, sem tê-la como a mais alta do mundo, bem distante das demais existentes. Teríamos uma carga tributária condizente com nosso desenvolvimento, em que a renda disponível permitiria mais consumo. Teríamos investimentos bem maiores do que o que temos. Portanto, se já somos diferentes em tudo, isso seria apenas mais uma diferença. E para melhor.
Fonte: DCI/Samir Keedi
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