O governo avalia que a ampliação do afretamento de embarcações estrangeiras com suspensão de bandeira é importante para o crescimento da cabotagem e aumento da competitividade do modal. O Brasil tem cerca de 80 embarcações ‘embandeiradas’, que operam com suspensão do pavilhão de origem. O Ministério da Infraestrutura, porém, estima que a quantidade de embarcações de cabotagem no país seja muito maior que esse número. A intenção é consolidar a frota ‘embandeirada’, assim como em países europeus. Uma das propostas da medida provisória que está sendo elaborada pelo Ministério da Infraestrutura prevê a ampliação do afretamento na modalidade casco nu, em substituição a embarcações em construção. Pela proposta, uma empresa brasileira de navegação (EBN) interessada em construir um navio fora do país, poderia trazer embarcação semelhante, com suspensão de bandeira, por até 36 meses.
Caso a empresa opte por construir em estaleiro nacional, a proposta sugere o afretamento sem suspensão de bandeira por três anos. A avaliação é que essa medida beneficiaria novos entrantes que têm dificuldade de acesso a estaleiros internacionais, possibilitando que esses players da navegação venham para o Brasil. Se a construção acabar antes desse prazo, a empresa poderá continuar a operar as embarcações afretadas em águas brasileiras até o término desses 36 meses. Com a embarcação entregue pelo estaleiro, a empresa poderia substituí-la por duas outras com custo operacional mais baixo, sem suspensão de bandeira, até o fim desse período. O ministério também analisa a possibilidade de substituição da embarcação em reparo, manutenção ou docagem com 100% da tonelagem sem circularização.
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Outra proposta prevê a ampliação do afretamento de embarcações estrangeiras a casco nu, sem circularização. Com lastro de 50% na tonelagem das embarcações de bandeira brasileira, próprias e afretadas pelo REB, haveria possibilidade das empresas trazerem embarcações mantendo a bandeira estrangeira. Pela legislação vigente (Lei 9432/1997), a empresa de navegação pode ter 50% da sua tonelagem própria e afretar navios a casco nu, via REB, porém com suspensão de bandeira. A medida vai considerar as embarcações com 50% da tonelagem por grupo econômico. O entendimento é que, se a regra fosse por empresas, elas teriam incentivo para dividir-se em vários CNPJs, fazendo cada um ter pelo menos uma embarcação e haveria 50% de embarcações sem suspensão.
Uma das propostas em estudo é que essas embarcações tenham as mesmas regras e direitos das EBNs, inclusive o Adicional ao Frete para a Renovação da Marinha Mercante. O AFRMM gerado pela embarcação afretada, sem suspensão de bandeira, ficaria com a EBN que realizar a operação. E tudo que for gerado pela operação de uma EBN ficaria na conta vinculada da empresa, mesmo se fosse uma embarcação afretada.
O ministério identificou movimento de EBNs no sentido de maximizar o uso de navios de bandeiras estrangeira, o que considera natural diante dos diferenciais de custo entre a bandeira brasileira e bandeiras de conveniência, como a panamenha. Segundo o diretor do departamento de navegação e hidrovias da pasta, Dino Antunes Batista, o governo tem as opções de brigar contra isso ou aproveitar a ocasião para reduzir custos, como os que as empresas têm com tripulação. Ele percebe que as EBNs, dentro da lei, já operam frota significativa de embarcações sem suspensão de bandeira, através de afretamentos por tempo e por viagem, que configuram quantidade expressiva do transporte de cabotagem.
A embarcação de bandeira estrangeira afretada sem suspensão exige menos investimentos e custos operacionais do que a embarcação ‘REBeada’, com suspensão de bandeira, que tem menor capex, mas precisa arcar com os custos operacionais da bandeira brasileira. Pela proposta, uma empresa hoje com quatro embarcações próprias, com direito a duas embarcações por meio do REB, passaria a poder trazer três sem suspensão de bandeira. A medida tenta impedir que as embarcações no REB sejam substituídas por embarcações sem suspensão de bandeira.
Batista considera que, se as empresas já fazem movimento de utilização da embarcação sem suspensão de bandeira faz todo sentido consolidar essa prática no arcabouço jurídico, possibilitando que elas façam essa operação de forma consistente e dentro das regras. “Se hoje, o custo logístico da cabotagem está atrelado em parte significativa à bandeira estrangeira, vamos consolidar isso”, afirmou Batista, durante seminário sobre cabotagem realizado na última terça-feira (26), na OAB-RJ. Na ocasião, ele explicou que as empresas com real interesse de investir no Brasil que trouxerem embarcações próprias e embandeirá-las poderão utilizar embarcações para bloqueio de circularização. O diretor do Ministério da Infraestrutura ponderou que não faz sentido que as embarcações sem suspensão de bandeira possam fazer tal bloqueio, já que elas não fazem parte de investimentos da empresa na operação brasileira.
A proposta de MP visa a redução de custos do sistema de cabotagem como um todo. Segundo Batista, as medidas em discussão preveem pelo menos um terço da frota com operação sem bandeira brasileira. A sugestão é que, mesmo sem a suspensão de bandeira, o comandante e o chefe de máquinas sejam brasileiros, o que poderia ser assegurado somente por lei. O governo também identificou a necessidade de ratificação da convenção de trabalho marítimo da Organização Internacional do Trabalho (MLC 2006/OIT).
Um dos objetivos do novo marco regulatório é atrair novos players para esse mercado, que possam desenvolver atividades formalizadas, sem constituírem empresas de papel ou venda de bandeira, práticas hoje verificadas na navegação. “Se a empresa quer se estabelecer no mercado, que faça os investimentos para que o conceito de lastro em bandeira brasileira seja mantido. Senão, haverá empresas pequenas fazendo operações irregulares e sem trazer crescimento da cabotagem”, disse Batista.