Profundidade do canal Miguel da Cunha será aferida para garantir o tráfego de duas balsas
A Superintendência dos Portos e Hidrovias (SPH) se pronunciou ontem, 22, favorável à decisão judicial da comarca de São José do Norte, que estabelece que seja disponibilizada outra embarcação para travessia de veículos entre Rio Grande e São José do Norte, sem cobrança de qualquer tarifa adicional, no prazo de 48 horas.
De acordo com o superintendente do órgão, Vanderlan Vasconcelos, a ordem será cumprida no que depender da contrapartida da superintendência. “A empresa responsável pela travessia já foi oficiada para que cumpra a liminar dada pela Justiça. A SPH é plenamente favorável à decisão e vai cumprir com a sua obrigação”.
Segundo a SPH, começa nesta semana a batimetria do Canal Miguel da Cunha, que consiste na realização de um estudo técnico que permite aferir a profundidade do leito do canal e a quantidade de resíduos depositados que precisam ser retirados. Para o início da realização do estudo é preciso que as condições de vento estejam favoráveis.
A medida, concedida na última sexta-feira, 18, pela juíza Fabiana Gaier Baldino em caráter de antecipação de tutela, estabelece que no caso de descumprimento da decisão os réus deverão arcar com multa diária e possíveis sanções, a serem definidas. A empresa F. Andreis possui a exclusividade dos serviços da travessia de veículos na região, e sua autorização já perdura há 30 anos, tendo sido concedida em 1981, pela extinta Sunaman. A sócia-administradora da F.Andreis, Carmenlis Bizzi, foi procurada pela redação mas não foi encontrada.
A viabilidade do cumprimento da decisão de outra embarcação dentro do prazo de 48 horas pela Justiça é fundamentada em declaração do Capitão dos Portos, capitão-de-mar-e-guerra Sergio Luiz Correa, que assegura a possibilidade de outra balsa atuando no canal para prestação do serviço. Consta nos autos do processo que o tráfego de duas balsas poderia ser realizado com ambas navegando em sentidos opostos, com o cruzamento entre as mesmas ocorrendo na área mais ampla, entre o final do Canal Miguel da Cunha (Farolete Balizão nº 18) e a entrada da doca de São José do Norte.
Esclarecimento
A Superintendência do Porto do Rio Grande (SUPRG) esclareceu nesta terça-feira, por meio de nota, que não compete a esta a questão da travessia entre os dois municípios. Apesar disso, aponta que tem se envolvido na busca de soluções, "por entender a importância que o serviço tem para a região como um todo".
Na nota, a Suprg explica que a Lei Estadual nº 11.089, de 1998, a qual alterou a denominação do Departamento Estadual de Portos, Rios e Canais - DEPREC, que passou a chamar-se de Superintendência de Portos e Hidrovias (SPH), menciona expressamente a competência da SPH para "III - elaborar os processos de concessão, delegação, permissão ou autorização da exploração dos serviços de transportes aquaviários no território do Estado, bem como dos respectivos terminais hidroportuários, e fiscalizá-los".
Assim, esclarece que, ao contrário do que constou em matéria do Agora na edição desta terça-feira (22), a decisão judicial atinge a SPH, e não a SUPRG "A competência para conceder, delegar, permitir ou autorizar a exploração dos serviços de transportes aquaviários entre os municípios de Rio Grande e São José do Norte é da Superintendência de Portos e Hidrovias (SPH), em especial no que diz respeito ao transporte de cargas", finaliza a nota.
Veja íntegra da decisão:
Julgador: Fabiana Gaier Baldino
Despacho: Vistos. Recebo a inicial. Trata-se de ação coletiva de consumo ajuizada pelo Ministério Público contra F. Andreis Eamp; Cia. Ltda., Superintendência de Portos e Hidrovias ¿ SPH e o Estado do Rio Grande do Sul, onde objetiva, em sede de antecipação dos efeitos da tutela, seja determinado aos réus que disponibilizem à população de consumidores, em 48 (quarenta e oito) horas, outra embarcação para a travessia de veículos entre Rio Grande e São José do Norte, sem cobrança de tarifa adicional. Ao final, postula a disponibilização e manutenção das duas embarcações no tráfego até a definitiva regularização da travessia.
Alegou que o serviço de travessia de veículos atualmente encontra-se monopolizado pela empresa F. Andreis Eamp; Cia. Ltda., que trabalha a título precário, valendo-se de uma Autorização, objeto da Resolução nº 7060, publicada em 01/07/1981 pela extinta SUNAMAN. Referiu que apenas uma balsa realiza a travessia, apesar da empresa possuir outras duas, sendo que, segundo alega a ré, uma delas já é objeto de contrato e a outra, devido a seu tamanho, não é apta para aportar no local de embarque dos veículos. Mencionou que as reclamações dos usuários avolumam-se diante das filas de espera, aduzindo que, na data de 15/03/2011, houve a necessidade da presença da polícia de choque da Brigada Militar para dissipar um movimento que se iniciava. Atentou para o relatório de fluxo da balsa emitido em 17/02/2011 pelo Município de São José do Norte, onde consta que permaneceram em espera para o outro dia 41 veículos pequenos e 61 veículos grandes. Ainda ressaltou a necessidade de processo licitatório para a concessão do serviço público de transporte aquaviário de veículos. Concluiu que a situação da travessia tornou-se insuportável aos consumidores, especialmente após a emissão da Portaria nº 13, de 09/02/2011, da Capitania dos Portos do Rio Grande do Sul, que aprovou padronizações a serem adotadas nas balsas, dentre elas os espaçamentos laterais, frontais e traseiros entre veículos, o que reduziu sensivelmente o número de carros e caminhões por viagem. Citou as matérias publicadas pelo Jornal Agora, constatando que haverá demora na solução do problema. Disse que é urgente a necessidade de regulamentação do transporte até que se realize o processo licitatório. Teceu considerações sobre o direito ora buscado e juntou documentos. É o breve relato.
DECIDO. Inicialmente, no que diz respeito à vedação legal trazida pelo artigo 1º, § 3º, da Lei nº 8.437/92, no sentido de que não será cabível medida liminar que esgote, no todo ou em qualquer parte, o objeto da ação, esclareço desde logo que perfilho o entendimento segundo o qual a vedação de concessão de liminar contra atos do Poder Público cede diante de determinadas situações em que o interesse coletivo predomina e deve ser imediatamente tutelado, com o fito de garantir aplicabilidade aos princípios da efetividade e tempestividade da tutela jurisdicional.
O problema da travessia de veículos entre Rio Grande e São José do Norte evoluiu de forma a consolidar uma situação caótica que reclama imediata intervenção judicial. O fato é público e notório, sendo constantemente veiculado na imprensa e debatido por autoridades. Todavia, até o presente momento, nenhuma atitude foi tomada para atender a demanda de consumidores. Veja-se que, no dia 17 de fevereiro de 2011, a Prefeitura Municipal realizou relatório de fluxo do serviço de balsa, verificando que permaneceram em espera 41 veículos pequenos e 61 grandes (fls. 109/115). A conclusão das obras da BR 101 maximizou o problema, o qual ainda tende a piorar, considerando que a região encontra-se em iminente desenvolvimento, como é cediço.
Ademais, digno de nota que a Portaria nº 13, de 09/02/2011, da Capitania dos Portos do Rio Grande do Sul, aprovou padronizações a serem adotadas nas balsas, dentre elas os espaçamentos laterais, frontais e traseiros entre veículos, reduzindo significativamente o número de carros e caminhões por viagem (fls. 99/101). Os consumidores tem permanecido por várias horas aguardando o embarque dos seus veículos, em condições desumanas. Consoante a Certidão das fls. 126/128, emitida pela Secretária de Diligências do Ministério Público, entre os dias 14 e 15 de março de 2011, foram entrevistados alguns motoristas que aguardavam o embarque na balsa, os quais relataram as mais diversas situações constrangedoras, como discussões entre eles, a permanência de 10 a 36 horas na fila, em local impróprio, sem banheiros químicos, ausência de fila especial para os que transportam carga inflamável etc. Daí sobressai que o princípio constitucional e fundamental da dignidade da pessoa humana, tão aclamado e as vezes banalizado, aqui revela-se na sua maior expressão e brada por uma imediata intervenção judicial, pois o desrespeito ao ser humano é evidente e chegou a proporções inaceitáveis.
Com efeito, diante da omissão estatal, cabe ao Judiciário intervir para garantir o direito dos consumidores. E a omissão fica nítida diante das determinações do artigo 29 da Lei nº 8.987/95, bem lembradas pelo DD. Promotor de Justiça. Nesse ponto, veja-se que o inciso VII traz a obrigação de o Poder Concedente zelar pela boa qualidade do serviço e solucionar as queixas e reclamações dos usuários. Ainda, o Código de Defesa do Consumidor estabelece no caput do artigo 22 que os órgãos públicos, por si ou suas empresas, concessionárias, permissionárias ou sob qualquer outra forma de empreendimento, são obrigados a fornecer serviços adequados, eficientes, seguros e quanto aos essenciais, contínuos. E o parágrafo único dispõe que nos casos de descumprimento, total ou parcial, das obrigações referidas neste artigo, serão as pessoas jurídicas compelidas a cumpri-las e a reparar os danos causados, na forma prevista neste Código. Por sua vez, o artigo 84, § 3º, do mesmo diploma prevê que sendo relevante o fundamento da demanda e havendo justificado receio de ineficácia do provimento final, é lícito ao juiz conceder a tutela liminarmente ou após justificação prévia, citado o réu.
Nessa esteira, as medidas requeridas pelo Ministério Público devem ser prontamente acatadas. Aliás, importante salientar que tais medidas expressam a necessidade premente de solução de uma situação emergencial, que inclusive pode caracterizar hipótese de dispensa de licitação, diante da interpretação que se extrai do artigo 24, inciso IV, da Lei nº 8.666/93. Finalmente, atento para a viabilidade de se colocar em atividade uma outra balsa, considerando a informação prestada pelo Capitão-de-Mar-e-Guerra, às fls. 140/141, no sentido de que é possível o tráfego de duas balsas, simultaneamente, navegando em sentidos opostos, desde que o cruzamento entre as mesmas ocorra na área mais ampla, entre o final do Canal Miguel da Cunha (Farolete Balizão nº 18) e a entrada da doca de São José do Norte. Para que essa manobra seja realizada com segurança é necessário que haja uma correta coordenação entre as duas embarcações, via rádio, sendo desejável o emprego de equipamentos que permitam que uma conheça a exata posição da outra.
Diante do exposto, ANTECIPO OS EFEITOS DA TUTELA e DETERMINO aos réus que, em um prazo de 48 (quarenta e oito) horas, disponibilizem outra embarcação para a travessia de veículos entre Rio Grande e São José do Norte, sem cobrança de tarifa adicional, sob pena de multa diária ou outra medida necessária para a concretização da tutela específica. Intimem-se com urgência. Citem-se.
Fonte: Jornal Agora (RS)/Thaise Saeter
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