O grupo de trabalho de petróleo e gás da equipe de transição do governo eleito questionou a Petrobras sobre o que considera como baixo investimento em exploração de novas áreas petrolíferas. De acordo com o Plano Estratégico 2023-2027, divulgado na semana passada, a prioridade da companhia na exploração serão os campos localizados no pré-sal e na Margem Equatorial, região considerada promissora, que vai do Amapá ao Rio Grande do Norte.
O Valor apurou, no entanto, que na visão de integrantes da transição a Petrobras precisaria investir mais em novas descobertas, uma vez que as reservas comprovadas teriam duração de dez anos. Esse horizonte é considerado muito baixo para o futuro da empresa na avaliação de participantes da equipe.
PUBLICIDADE
“Desinvestimentos não são fundamentais para o financiamento da Petrobras”, diz Edmar de Almeida, da PUC-Rio
O tema foi levantado na segunda reunião presencial entre executivos da companhia e membros do grupo de energia da equipe de transição, na terça-feira (6), cuja pauta foi o plano estratégico 2023-2027. Apesar das críticas, a Petrobras elevou em 9% os investimentos na exploração de novas áreas, para US$ 5,5 bilhões. Um dos alvos dos recursos é a reposição da produção que se perderá com o declínio natural dos campos. No total, ela projeta perfurar 42 poços nos próximos cinco anos.
Fernando Borges, diretor de exploração e produção da companhia, disse em apresentação na semana passada, que “a gente luta contra declínio natural da ordem de 10% ao ano”. Isso significa, de acordo com o executivo, que a empresa precisa incorporar 300 mil boe/dia à produção a fim de fazer frente ao declínio natural e manter a produção na casa dos 3 milhões de barris. A margem equatorial deve contar com 16 poços exploratórios, enquanto bacias do Sudeste terão 24 poços perfurados, de acordo com o plano estratégico.
Outros dois poços estão situados no bloco de Tayrona, na Colômbia, “onde tivemos uma importante descoberta de gás natural em águas profundas”, segundo o executivo, na ocasião. A Petrobras elevou em pouco mais de US$ 7 bilhões a previsão de investimentos em exploração e produção para os próximos cinco anos, para US$ 64 bilhões.
De acordo com um especialista do segmento, que falou na condição de anonimato, o dinheiro é finito e a empresa tem que priorizar as áreas que entenda ser do interesse dela. Segundo ele, existem áreas como as bacias de Pelotas e Potiguar, por exemplo, que podem ser perfuradas em campanhas exploratórias, mas a decisão de investimento em exploração pela Petrobras deve considerar o potencial retorno desses ativos no futuro.
Esse especialista salientou que uma relação entre reservas e produção de dez anos é “saudável” para companhias do porte da Petrobras. Abaixo desse horizonte, há necessidade de investimentos em novos campos, para reposição. Ele ressaltou ainda que a tentativa de investir em diversas áreas, do pré-sal a biocombustíveis, por exemplo, resultou no endividamento recorde da empresa, da ordem de US$ 160 bilhões em 2014, que veio sendo reduzido nos últimos anos. A empresa tem mantido a dívida bruta em torno de US$ 60 bilhões, valor considerado ideal para a companhia.
Além dos aspectos relativos ao portfólio da Petrobras, o grupo de trabalho ratificou o pedido para que a empresa suspenda o processo de desinvestimentos até a posse do novo governo, apurou o Valor. De acordo com fontes a par do tema, estão previstos 50 projetos para serem desinvestidos pela companhia, sendo que cinco têm previsão de fechamento ainda neste ano. Todos eles são relativos a campos de petróleo.
Edmar Almeida, professor do Instituto de Energia da PUC-Rio, lembra que parte dos desinvestimentos da Petrobras são compromissos assumidos com o Conselho Administrativo e Defesa Econômica (Cade) para a venda de ativos. “Nesses casos, não é só uma questão de mudar [a diretriz] de uma hora para a outra”, ressalta. “Tem que estudar e ver o que pode e o que não pode ser feito, tem que ver onde há implicações regulatórias”, acrescenta.
Em termos meramente financeiros, Almeida explica que suspender eventuais vendas de ativos não deve, pelo plano 2023-2027, trazer grandes abalos à capacidade de financiamento da estatal. Isso porque a petroleira espera fazer desinvestimentos entre US$ 10 bilhões e US$ 20 bilhões nos próximos cinco anos. “Parece muito, mas é de 5% a 10% do fluxo de caixa que a companhia espera receber. Ou seja, [os desinvestimentos] não são fundamentais para o financiamento da empresa”, afirma Almeida.
Para ele, é natural que o novo governo queira implantar uma nova diretriz na principal estatal brasileira. Mas Almeida reitera que a decisão de interferir ou não em processos de venda já em andamento deverá ter como base o ponto de vista regulatório. “Quando o novo governo assumir, vai mudar a diretoria, colocar outra diretriz e vão ter que ser feitos estudos para mudar e refletir a visão do governo”, diz o professor da PUC-Rio.
Fonte: Valor