Operadores alertaram para perda do ‘timing’ entre ampliação de conexões terrestres e dragagem com expansão dos contêineres e demais cargas no porto
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Um dia após a audiência pública sobre o leilão do novo terminal de contêineres de Santos (Tecon 10), representantes dos maiores operadores de cargas conteinerizadas chamaram a atenção para a demora na solução dos acessos terrestres e aquaviários. Durante painel do fórum Santos Export, eles apontaram ainda os riscos de inserção de novos ‘penduricalhos’ na modelagem que podem transferir ao setor privado obrigações de investimentos em infraestrutura, o que pode ocasionar aumento de custos ao consumidor final. As empresas demonstraram interesse no projeto, anteriormente denominado STS-10, que está previsto para ser licitado em 2025, e consiste num terminal com capacidade instalada de 3,5 milhões de TEUs/ano a ser atingida até 2035.
Uma das preocupações dos operadores é que a questão do acesso terrestre ainda não está completamente endereçada, o que traz o risco de acumular os gargalos atuais ao tráfego adicional a partir do novo Tecon. Hoje, a BTP movimenta 1,9 milhão de TEUs e recebe uma movimentação de 3 mil caminhões por dia. Já o Tecon Santos, com 2,6 milhões de TEUs de capacidade nominal, já atende diariamente 4 mil caminhões. Um terminal da dimensão do Tecon 10 colocaria ainda mais caminhões na entrada de Santos, que está sobrecarregada.
De acordo com a Autoridade Portuária de Santos (APS), a movimentação de contêineres no complexo foi um dos principais destaques de 2024, ultrapassando, pela primeira vez, a marca de 5 milhões de TEUs, fechando o exercício em 5,4 milhões de TEUs movimentados, crescimento de 14,7%. Analistas avaliam que, mesmo sendo um crescimento relevante, ficou abaixo da média dos demais portos brasileiros. O motivo é que Santos não tinha capacidade para crescer mais e perdeu cargas cativas para outros portos, como algodão para Salvador (BA) e madeira para Sepetiba (RJ).
O diretor de operações portuárias da Santos Brasil, Bruno Stupello, observa uma demanda surpreendente em 2024, com uma movimentação 15% superior à de 2023. “Somando todas as questões globais, as guerras e a falta de capacidade de alguns terminais [no Brasil] que deixaram de ofertar berços ao longo de 2024, cria-se a ‘tempestade perfeita’, trazendo uma complicação ainda maior para fluxo de contêineres, principalmente na costa brasileira”, analisou.
Stupello afirmou que a Santos Brasil sempre avalia bons projetos e que o Tecon é um que pode ser avaliado. Ele ponderou que outros projetos em andamento poderiam entregar a oferta de capacidade num menor espaço de tempo. Ele citou a ampliação potencial da Santos Brasil, as obras em curso da DP World Santos e o potencial adensamento do terminal da BTP. “Quando avaliamos projetos que estavam na mesa para ampliação de capacidade no curto prazo, o Tecon 10 é o projeto de mais longo prazo de maturação”, conta Stupello.
O Tecon Santos, operado pela Santos Brasil, aumentou sua capacidade de 1,9 milhão de TEUs por ano em 2021 para 2,6 milhões de TEUs anuais já no final de 2024. Até 2026, serão 3 milhões de TEUs/ano. Foram 400 mil TEUs de capacidade adicional em 2024 e, ao longo dos próximos 12 meses, a empresa prevê mais 400 mil TEUs de aumento de capacidade, chegando a 3 milhões de TEUs de capacidade.
Os operadores consideram que, enquanto a terceira pista de descida da Rodovia Imigrantes está sendo discutida, já seria necessário implementar uma quarta via, levando em conta o crescimento da movimentação de todos os segmentos de cargas do complexo portuário. A dragagem é outro problema que há anos vem se arrastando sem solução. Há uma perspectiva de dragagem para -16m ao longo de 2026 e uma concessão de longo prazo para aprofundamento e manutenção do canal para -17m, que está em fase de estudos no Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). As empresas lembraram que o projeto de aprofundar o canal para -17m é discutido desde 2016.
O diretor de operações portuárias da Santos Brasil explicou que hoje existem apenas duas janelas de entrada e saída dos navios com calado de 14,5m. Em muitos momentos, esses navios ficam parados sem operação esperando a maré. “A dragagem pode ajudar a resolver esse problema, otimizando a utilização dos berços já ofertados no Porto de Santos, melhorando a eficiência do serviço prestado”, ressaltou Stupello.
O chefe de relações institucionais do grupo Maersk para América Latina, Danilo Veras, reforçou que o debate dos acessos a Santos já está colocado há muito tempo, assim como a questão da dragagem. Ele falou da necessidade de um planejamento centralizado e que deixe claro quais são as destinações do projeto, evitando ‘cascas de banana’ como o acesso rodoviário.
Veras acrescentou que houve perda de tempo até o reconhecimento de que Santos precisava de capacidade adicional e onde essa nova capacidade deveria ser instalada. “Achamos que fazer o STS-10 agora está mais alinhado com colocar uma linha do tempo e definir para esse futuro investimento privado o que deve existir para o acesso, coordenando com tudo o que tem hoje no ecossistema complexo que é o Porto de Santos”, analisou.
A gerente sênior de relações institucionais da DP World, Luciana Guerise, disse que incomoda que a modelagem do ‘Santos 10’ não esteja conversando nem com necessidade de 17m, nem com necessidade da quarta via da Imigrantes. Ela considera que a terceira via, que ainda está sendo projetada, já não é suficiente e que o viaduto da Alemoa também não resolverá todos os gargalos. “Não devíamos hoje estar discutindo e aplaudindo o edital para 16m porque, em 2016, já discutíamos o ‘Santos 17’. Faz 8 anos que discutimos 17 metros”, criticou.
Luciana falou ainda que os investimentos ferroviários vão ampliar a movimentação de grãos e, consequentemente, a necessidade de dragagem. Ela disse que é preciso pensar em todo o sistema do porto, que é complexo e envolve diferentes tipos de cargas. A gerente da DPW apontou que dar celeridade a esses projetos de acessos passa por questões que entram na seara da vontade política. “A DPW é interessada no projeto Santos 10. Olhamos com cautela. Santos vai acontecer e precisa acontecer”, afirmou.
A DPW, que tem capacidade para 1,2 milhão e TEUs, já tem assinadas obras para 1,7 milhão de TEUs e, na última terça-feira (18), a matriz em Dubai, nos Emirados Árabes, autorizou a ampliação do terminal em Santos para 2,1 milhões de TEUs. “Existe sim nossa preocupação em expansão de capacidade. Tudo é questão de timing. Ninguém mais vai atrapalhar esse timing de execução do Santos 10. Instituições que aprovam terão que ter segurança para apertar o botão do ‘start’. Não é falta de acesso ou falta de dragagem que vai fazer com que pare esse processo”, acrescentou Luciana.
Luciana disse que, muitas vezes, as questões de capacidade têm a ver com fluxo de transporte de outros terminais que precisaram suspender a operação em seus berços, ou por problemas do transporte marítimo, o que faz com que navios cheguem lotados, gerando uma ‘falsa impressão’ de que determinado terminal não tem capacidade. “Isso aconteceu muito com a DPW: o navio chegava fora de janela, não tinha capacidade e acabava a DPW tendo que gerenciar problema da falsa impressão da falta de capacidade no terminal”, relatou.
O diretor de investimento em terminais da TiL (Terminal Investment Limited), Patrício Junior, também defendeu um planejamento mais preciso e que tenha um maior alcance do patamar que o Porto de Santos pretende alcançar. O executivo disse que o setor já podia estar discutindo sobre como será depois de atingir a capacidade de 10 milhões de TEUs, bem como a expansão do porto para outras áreas e o projeto da 4ª via da Imigrantes.
Patrício lamentou que, até agora, não tenham sido executadas demandas de infraestrutura de acesso já diagnosticadas e que são importantes para o Tecon 10 e para o fluxo operacional do porto. Segundo o executivo, o custo de não fazer impacta os embarcadores e acaba sendo repassado para o preço pago pelo consumidor final.
O executivo disse que a entrada em operação da BTP e da DPW (Embraport), entre 2012 e 2013, calou os ‘cavaleiros do apocalipse’ que criticavam a necessidade dos dois novos terminais na época. Para Patrício, as discussões para novas instalações se estendem porque o segmento de contêineres tem muita competição. O diretor da TiL entende que é preciso avançar sobre discussões concorrenciais já enfrentadas e superadas, como a verticalização e práticas de self preference, apontadas em por alguns setores e que acabam postergando projetos.
Veras, da Maersk, mencionou que o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) aprovou, nas últimas semanas, a compra da Santos Brasil pela CMA CGM e da Wilson Sons pela MSC. “O Cade já olhou nosso setor semana passada duas vezes e não achou esse problema. Vamos criar esse problema para o STS-10?”, indagou. Ele concorda que é bom para o mercado de Santos ter mais espaço e mais empresas de navegação concorrendo nesse leilão. “Vou adorar concorrer mais com MSC, CMA CGM e com outras empresas que entrarão aqui”, comentou.
O porta-voz da Maersk ressaltou que o projeto Tecon 10 sair do papel será bom para Santos, e não especificamente para a empresa vencedora. Ele frisou que não tem como dobrar a área para o Porto de Santos sem a solução para os problemas dos acessos. “Efetivamente, precisamos ter uma abordagem menos panfletária e mais comprometida com resultado, parar de jogar ideias ao vento e termos projeto”, disse Veras.
Stupello, da Santos Brasil, também avalia que o risco desse novo Tecon está em criar obrigações extras para o arrendatário, que deveria focar na construção e tem expertise na operação de contêineres. “Tem reembolso ou ressarcimento de outros arrendamentos que estão na área, tem a questão do acesso (...) Em algum momento, pode ser que o [novo] terminal passe a ser inviável na modelagem e na regulação atual do Brasil”, alertou.
Luciana, da DPW, salientou que quando se retira investimento de capital intensivo do projeto para fazer obrigações públicas, se fala em Custo Brasil porque vai cair sobre o exportador. Ela considera que o estudo de mercado deveria ter sido divulgado anteriormente à audiência pública para o setor colocar sugestões ou críticas ao modelo. “Conforta que agência [Antaq] tem maturidade para resolver e enfrentar questões, tanto que estão revendo a questão concorrencial. Não vejo a questão de acesso como impedimento ao bid, mas é preocupação de correr o risco de ter tanta coisa nesse modelo e os modelos dos outros projetos não se conversarem”, afirmou Luciana.
A Antaq receberá contribuições, via consulta pública, até a próxima segunda-feira (24) para adequações. Bruno Picinin Fernández, da diretoria de mercado e inovação da Infra S.A., disse no evento que a questão concorrencial do Tecon 10 ainda não está definida. “Num primeiro momento se optou por retirar armadores de Santos e depois se decidiu que poderiam participar sozinhas. A Antaq vem consultando o Cade desde o início. Será o maior leilão de arrendamentos portuários da história dos portos públicos”, declarou no fórum.
(Em atualização)