Conhecedora da realidade local por ter feito carreira no Estado, a ex-ministra Dilma Rousseff (PT) estava à vontade ontem para falar aos gaúchos no ciclo do Painel RBS com os principais pré-candidatos à Presidência. Depois de passar mais de sete anos como peça-chave de Lula, falou de educação, oportunidades econômicas e fim da pobreza citando exemplos e números. Para escapar de temas contundentes, fez brincadeiras com os entrevistadores.
Se depender dos dois principais candidatos à Presidência, os gaúchos já podem ter uma certeza: o Rio Grande do Sul ganhará uma nova ponte sobre o Guaíba, para ligar a Capital à zona sul do Estado.
Depois de José Serra (PSDB) anunciar, na semana passada, durante o Painel RBS, que realizará a obra logo no início do seu governo caso seja eleito, ontem foi a vez de Dilma Rousseff (PT) se comprometer com o projeto. Ao ser questionada se considerava urgente a construção da nova ponte, declarou:
– É fundamental, não é urgente.
Numa resposta a seu adversário, a candidata foi irônica ao dizer que uma ponte “não cai do céu”.
– Só tem um jeito de fazer a ponte logo no dia seguinte. Usar o estudo nosso. Usar o meu projeto, meu estudo de viabilidade técnico-econômico – disse, lembrando que em dezembro foi lançado o edital para realizar uma análise de traçado da nova ponte.
Mineira radicada desde o início da década de 1970 no Estado, Dilma fez questão de ressaltar que conhece “os problemas do Rio Grande do Sul”. Durante cerca de uma hora e meia, a candidata respondeu a perguntas dos jornalistas Lasier Martins, André Machado, Carolina Bahia, David Coimbra, Rosane de Oliveira e Tulio Milman. O programa, realizado no Salão Nobre do Grupo RBS, em Porto Alegre, teve transmissão ao vivo pela Rádio Gaúcha, pela TVCOM e pelo site www.painelrbs.com.br e foi acompanhado pela direção e por editores e jornalistas da empresa.
Com números e dados – chegou a corrigir minutos depois uma informação incorreta que dera sobre o número de vagas em novas penitenciárias construídas pelo governo federal –, Dilma estendeu-se em temas como educação – pregou a qualificação e a avaliação dos professores – e o polo naval de Rio Grande – “um marco para a zona sul do Estado”.
Também defendeu a apuração do mensalão – com a punição de culpados – e as alianças com políticos que o PT tratava como inimigos antes da chegada de Lula ao Planalto, como o senador José Sarney (PMDB-AP) .
– O Brasil vai precisar de coalizão para ser governado. Ele é complexo demais. Coalizão sempre tem de se dar em torno de um programa – disse.
Dilma afirmou ainda ter orgulho do seu passado de luta armada, mas disse que mudou junto com o Brasil:
– Combati a ditadura do primeiro ao último dia e conseguimos restaurar a democracia. Eu mudei com o Brasil, mas nunca mudei de lado.
A ex-ministra evitou comentar se extraditaria o ex-ativista italiano Cesare Battisti, condenado na Itália por quatro assassinatos na década de 1970 e preso no Brasil desde 2007. Dilma também contornou o assunto do reajuste dos aposentados e o fim do favor previdenciário, ambos aprovados pela Câmara dos Deputados.
– Não vou responder – afirmou, quando perguntada se vetaria a decisão dos deputados em relação ao fator.
Garantiu, no entanto, que Lula terá “clareza” e não tomará medida demagógica só para ganhar as eleições:
– O foco da decisão será um olho no aposentado e outro nas finanças.
Guerrilha
Lutei contra a ditadura militar. Lutei do primeiro dia ao último dia, e tenho imenso orgulho disso. Lutei com as condições e os meios que encontramos na época. Queria lembrar, os aposentados até sabem como foi, mas as pessoas das novas gerações, não. Naquela época, no Brasil, fazer luta sindical era radicalmente proibido, dava cadeia e sequer um sindicato podia pleitear aumento de salário. Estudante estava proibido radicalmente de se organizar. Não havia liberdade de imprensa. Muitas vezes os jornais tiveram de publicar poesia de Camões ou receita de bolo. Havia progressivamente no país uma repressão muito grande.
Situação do RS
Eu conheço os problemas do Rio Grande do Sul. Fui para o Ministério de Minas e Energia, depois para a Casa Civil e carreguei a minha preocupação com o Estado. Por isso, acho que há dois anos, eu vim aqui, nesse mesmo Painel, e disse que achava que o Rio Grande do Sul tinha de entrar num novo tempo que se abria no Brasil. Ninguém acreditava muito que o Brasil estava entrando em novos tempos. E o RS entrou. Só o polo naval é R$ 439 milhões. E mais os oito navios de armazenagem. O casco deles é de R$ 2,6 bilhões, o que é muito dinheiro. Se a gente for olhar, aqui no Rio Grande do Sul se iniciou uma nova era na Metade Sul.
Polo Naval
Um polo naval com estaleiro, tendo capacidade para produzir ao mesmo tempo os dois maiores navios, tem garantido uma demanda muito importante. Considerando que a industrial naval gera um arraste de outros segmentos industriais como eletrônico, eletrônico embarcado, metalmecânica, produtos siderúrgicos em geral, química, indústria do mobiliário, você tem, aqui no Rio Grande do Sul, uma oportunidade de desenvolver um novo segmento econômico no momento em que o Brasil se dispõe investir entre US$ 200 bilhões e US$ 220 bilhões até 2014 pela Petrobras. É criado um novo segmento econômico com 12 mil empregos diretos.
Professores
Formar bem um professor e garantir que tenhamos bons matemáticos ensinando os nossos filhos é crucial para o país e vai beneficiar as classes populares deste país. Por aí, você tem a grande oportunidade de ascensão social. Não é só colocar as crianças na escola em termos de quantidade, é garantir um ensino de bom nível.
Mensalão
Os crimes têm de ser apurados, levados ao tribunal e as pessoas condenadas. Aí, se configura a maturidade do sistema brasileiro. É muito complicado, no caso do PT, a avaliação do que o PT fez. Isso está sendo apurado. Não se pode igualar o PT a pessoas. Se pessoas erraram, têm de pagar. A instituição Partido dos Trabalhadores não cometeu crime. Também não é correto colocar gente que não fez nada pagando.
Barreiras argentinas
É possível (fazer retaliação). Se tiver necessidade, tem de fazer, sim. Não acho adequado o que foi feito pela Argentina. Foi feito sem manifestações formais. Se existe, e existe pela OMC (Organização Mundial do Comércio) e pelo Mercosul a possibilidade de retaliar uma medida tão agressiva como essa que foi tomada contra o Brasil, tem de ser respondida. O primeiro momento é ter uma posição firme, forte. O segundo é estar pronto para discussão.
Biocombustível
O biocombustível é fundamental ao Rio Grande do Sul. Hoje, o Estado já é liderança na produção de biocombustível. Acredito que nós aqui temos condições de apostar na criação e na geração de tecnologia nessa área. Vai ser uma área que vai expandir muito Brasil nos próximos anos. Acredito em outra coisa: O Rio Grande do Sul tem de fazer pesquisa básica como faz a Embrapa.
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Biografia
- Nascida em Minas Gerais em 14 de dezembro de 1947, filha de um advogado búlgaro naturalizado brasileiro e de uma professora, na juventude Dilma participou da luta armada contra a ditadura.
- Depois de presa e torturada em São Paulo, rumou para Porto Alegre na década de 1970 por causa da prisão do então marido, o gaúcho Carlos Araújo. Cursou Economia na UFRGS e passou a trabalhar na FEE.
- Ligada ao PDT, trabalhou na bancada estadual e foi secretária da Fazenda do prefeito Alceu Collares (1986-1988). Quando ele se tornou governador (1991-1994), ela assumiu a Secretaria de Energia e Minas – pasta que voltou a chefiar na gestão de Olívio Dutra (1999-2002). Em 2000, ela foi para o PT.
- Com a vitória de Lula em 2002, ela integrou a equipe de transição. Por conta do conhecimento técnico, foi escolhida para o Ministério de Minas e Energia e, depois, para a Casa Civil. Dilma tem 62 anos.
Fonte: Zero Hora(RS)
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