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Fora de compasso

Investimentos públicos em portos não acompanham avanço da movimentação e gargalos permanecem — Os investimentos públicos em infraestrutura nas últimas duas décadas não acompanharam o incremento da movimentação nos portos que, praticamente, triplicou entre a publicação dos marcos regulatórios portuários. No período que vai da Lei 8.630/1993 à Lei 12.815/2013, o volume anual movimentado nos portos brasileiros subiu de 350 milhões de toneladas para quase um bilhão de toneladas. Especialistas atribuem os gargalos, entre outros fatores, à demora na liberação de recursos dos programas de investimento do governo federal. Os projetos são considerados prioritários para o desenvolvimento da economia e preocupam os empresários. Os aportes incluem investimentos em acessos rodoviários e ferroviários, dragagem e hidrovias.


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Em 2002, último ano do governo Fernando Henrique Cardoso, os investimentos públicos no setor portuário foram de R$ 1,2 bilhão, corrigidos a preços de dezembro de 2012, de acordo com o Instituto de Pesquisa Econômica e Aplicada (Ipea). Nos seis anos seguintes, já no governo Lula, o Ipea apurou investimento inicial de R$ 30 milhões, em 2003, chegando a R$ 1,65 bilhão em 2008. O instituto observa uma curva mais acentuada a partir de 2007.

Apesar do crescimento dos investimentos nesse período, o coordenador de infraestrutura do Ipea, Carlos Campos, ressalta a continuidade de gargalos crônicos. "Deve-se ter em mente que, diante das enormes necessidades de investimentos no estrangulado setor portuário brasileiro, esses montantes são insuficientes", pondera. Os aportes públicos têm duas fontes de recursos distintas: o Orçamento fiscal da União e as receitas operacionais das companhias docas.

Levantamento da ONG Contas Abertas aponta que a Secretaria de Portos (SEP), responsável pela gestão de sete companhias docas, executou apenas 22% dos quase R$ 1,6 bilhão orçados para 2013. Os valores correspondem à execução de janeiro a outubro de 2013 e foram divulgados pelo Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão. Dos R$ 360,7 milhões investidos pelas docas no período, R$ 157,9 milhões foram destinados à Companhia Docas do Estado de São Paulo (Codesp), o que corresponde a 32% dos R$ 487,4 milhões do orçamento para a sociedade de economia mista.

A adequação do cais para terminal de passageiros no porto de Santos (SP) recebeu R$ 95,7 milhões em investimentos de janeiro até outubro de 2013, valor equivalente a 48% dos R$ 199,3 milhões previstos para a iniciativa. Em contrapartida, a obra de implantação da avenida perimetral portuária no Guarujá (SP) teve desembolsos de R$ 26,7 milhões, quase a totalidade do previsto para 2013 (R$ 27,7 milhões), de acordo com o levantamento.

Campos identifica que, somente a partir da nova Lei dos Portos (12.815/13), o setor começou a tentar resolver a ineficiência na gestão das docas, cujo percentual médio de execução é da ordem de 25%, considerando os recursos autorizados e os efetivamente aplicados no orçamento das estatais. O professor considera esse problema recorrente e fruto de ingerência política, o que culmina na incapacidade de as empresas executarem seus programas de investimento. Segundo o Ipea, essa pode ser uma das razões para a queda de 64% nos investimentos entre 2009 e 2013, passando de R$ 1,65 bilhão para R$ 630 milhões, entre os governos Lula e Dilma Rousseff.

O Ipea concluiu que as dificuldades que adiam investimentos em infraestrutura não são oriundas da escassez de recursos públicos. O estudo cita uma série de desafios de gestão e administrativas pré-obras, desde dificuldades nas desapropriações e pendências judiciais até projetos mal elaborados e a insegurança causada pelos ajustes frequentes nos marcos regulatórios. A questão também enfrenta interveniência de órgãos ambientais, do Ministério Público e do Tribunal de Contas da União (TCU).

O presidente da Companhia Docas de São Paulo (Codesp), Renato Barco, nega que os recursos federais estejam demorando a ser liberados e diz que o porto de Santos não enfrenta esse tipo de problema. Entretanto, ele ressalta que, muitas vezes, a verba existe, mas fica bloqueada por questões judiciais. Barco cita o bloqueio de recursos federais para reforço do cais entre a área do terminal 12A (veículos) até a curva do terminal 23. A obra tem como objetivo melhorar a atracação dos navios numa área que recebe graneleiros. O atraso impede a entrada de navios de maior capacidade.

Recursos da Codesp para o principal reforço do cais da Alamoa também ficaram judicializados até o final de 2013. “Muitas vezes temos uma obra com verba, mas que, por motivos judiciais não podemos andar com o projeto. No caso de Santos, não temos nada que esteja sendo impedido por parte do governo federal”, afirma. Barco também destaca que o cais da Copa está pronto e será inaugurado até o início de maio. Já o projeto de revitalização da zona portuária santista ficará pronto entre o final de 2014 e o início de 2015. O orçamento inicial das obras é de R$ 300 milhões.

O diretor-presidente da Empresa Maranhense de Administração Portuária (Emap), Luiz Carlos Fossati, lembra que a política atual do governo para o setor portuário é atrair o máximo de investimentos privados possíveis. “Temos que procurar as empresas especializadas e fazer com que elas invistam. O governo tem que se preocupar com educação, saúde. Temos grandes empresas e parceiros em desenvolvimento que precisam investir nessa área”, afirma Fossati.

Com capacidade para movimentação de 15,3 milhões de toneladas, o porto de Itaqui (MA) possui projetos para ampliar esse volume para 150 milhões de toneladas em 2031. A projeção, segundo a Emap, depende da validação de projetos e da confirmação das demandas previstas no plano 2012-2031 da empresa. “Nos dois últimos anos, tudo que desenvolvemos está em linha com esse planejamento. Mas, para executar, estamos desenvolvendo a capacitação da equipe”, relata Fossati.

O porto maranhense está crescendo média de 10% ao ano e Fossati alerta que os investimentos precisam acompanhar o aumento dessa demanda. Com o crescimento da exportação de soja no país, a importação de fertilizantes no porto de Itaqui cresceu entre 30% e 40% nos últimos três anos. Mesmo assim, a média de espera dos navios que era de 89 horas em 2013, caiu para 49 horas de espera, segundo a Emap. Fossati ressalta que esse ainda não é o tempo ideal porque o armador continua pagando demurrage.

O planejamento do porto prevê a construção dos berços 98, dedicado a fertilizantes, e 99, para celulose. A ideia é que o berço de fertilizantes receba recursos privados. Já o berço 99 está em estudo e pode ter participação do governo federal, por meio do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). O projeto prevê ainda a construção de armazéns. “O berço 99 tem que estar pronto em três anos, no máximo. E o 98 em quatro anos, quase em paralelo, porque a demanda de fertilizantes está crescendo. A produção de soja precisa de fertilizante para o plantio. Uma coisa está puxando outra”, alerta Fossati.

Os investimentos para construção dos berços 99 e 98 somam R$ 880 milhões e se juntam a outros R$ 250 milhões previstos para a construção de armazéns no terminal de fertilizantes. A Emap pretende aumentar sua retroárea para ampliar a movimentação de equipamentos e da área de estocagem. Fossati confirma ainda a possibilidade de começar a desenvolver um terminal de contêineres no porto de Itaqui dentro de cinco anos.

Os investimentos planejados pela Companhia Docas do Espírito Santo (Codesa) para o porto de Vitória têm como objetivo ampliar de 30 mil toneladas para 50 mil toneladas a capacidade do porto em volume de cargas. A dragagem e derrocagem no porto aumentarão o calado de 10,67 metros para 12,5 metros, enquanto a profundidade passará de 11,5 metros para 14,5 metros. O superintendente geral de projetos substituto da Codesa, Enildo Moreira Ferreira, conta que os navios com 242 metros de comprimento por 32,4 metros de boca devem continuar a ser os maiores que o porto recebe. Ele explica que limitações naturais no acesso ao porto impedem certas manobras na bacia de evolução e a passagem no canal, dependendo do comprimento do navio. Entretanto, o novo calado permitirá que os navios cheguem mais carregados ao porto.

A Codesa calcula que 30% de carga de granito e café produzida no Espírito Santo estejam indo para o Rio de Janeiro por rodovia devido às limitações de Vitória. Ferreira enxerga os dois portos com dificuldades logísticas, mas diz que a limitação natural de Vitória pesa a favor do porto do Rio. Em contrapartida, ele destaca os portos secos em Vitória e a estrutura superior para receber veículos em comparação ao espaço disponível no porto fluminense. Ferreira diz que o porto de capixaba também possui gargalos nos acessos e que município, estado e União precisam fazer as ações para que o porto se torne mais eficiente.

Os projetos que estão presos enfrentam problemas com desapropriação. Alguns conflitos precisam ser resolvidos junto ao município. A prefeitura de Vitória e governo do estado estão demolindo prédios para construção de um acesso dedicado ao porto, fora do perímetro urbano. O projeto da construção da BR-447 ligará a BR-262 ao porto. Há ainda projetos de construção de um elevado fora do perímetro urbano para desafogar a área portuária. A Codesa ampliou o cais para minimizar os impactos na chegada, aumentando o volume de carga. A companhia também retirou guindastes que estavam sucateados, dando aos operadores a possibilidade de colocar equipamentos próprios mais eficientes.

Campos, do Ipea, acredita que a alternativa para o setor em médio e longo prazo pode vir das companhias docas, uma vez saneadas financeiramente e com administração profissionalizada e eficiente, capaz de disponibilizar recursos para investimentos nos portos públicos. No curto prazo, a alternativa seria a aceleração dos investimentos privados tanto em novos terminais de uso privativo (TUPs), quanto em áreas arrendadas nos portos públicos.

Para o diretor da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB) e da Merco Shipping Marítima, Aluisio Sobreira, a nova Lei dos Portos (12.815/2013) criou um hiato ao centralizar o poder no governo federal. Ele observa que os processos que estavam esperando a nova legislação começaram a ser liberados, mas os investimentos devem ser mais lentos do que o governo imaginava.

Sobreira acrescenta que os arrendamentos nos portos públicos não decolaram, entre outros motivos, devido aos questionamentos do Tribunal de Contas da União (TCU). “O jogo ainda não começou, só começa quando a licitação é lançada. O governo ainda não conseguiu chegar nesse ponto”, analisa. Sobreira acredita que a política de fazer os arrendamentos em blocos não deu o resultado esperado. Ele sugere que o governo separe os processos com litígio e libere aqueles que são menos complexos.

A AEB estima que 97% das exportações brasileiras ocorram pelo sistema portuário. Considerando que a maioria das exportações são produtos básicos e as importações são produtos manufaturados que também passam pelo porto, a entidade vê com preocupação a necessidade de investimentos para melhorar a acessibilidade aquaviária.

Os problemas para execução da dragagem vêm desde a lei 8.630/93, quando foi vetado um artigo que, segundo Sobreira, definia claramente a dragagem como responsabilidade federal. “Durante 15 anos, ficamos sem dragagem regular nos portos. Em 2007, foi criada a SEP e voltamos a ter dragagem”, diz Sobreira. Ele enfatiza a necessidade da dragagem no canal de acesso e nos berços para que o navio consiga entrar, atracar e sair sem problemas. “Não digo que esteja estagnado, mas ainda está longe do ideal. Há sensibilidade da SEP, mas ficou parado muito tempo. Quebrar a inércia está sendo mais lento do que precisamos”, observa.

O diretor da AEB acrescenta que a lei 12.185/13 não determina de forma clara que a responsabilidade da dragagem é do governo federal. Ele cita que nos Estados Unidos o serviço é responsabilidade do corpo de engenheiros do Exército com recursos federais. Lá, o governo planeja dragagem sob o ponto de vista técnico e econômico.

Sobreira explica que os portos de estuário, como Itajaí, Santos e Rio Grande, carecem de dragagem contínua. “A dragagem merece atenção muito grande e é preciso ter política focada. De certa forma, o governo passou a fazer, mas está se contratando dragagem por resultado. Agora já se fala em contratos de 10 anos. Nesses portos, onde há dragagem contínua, é fundamental”, analisa.

O porto de Suape (PE) depende de importantes investimentos federais para ampliar sua movimentação nos próximos três anos. O vice-presidente de Suape, Caio Ramos, enfatiza a necessidade da conclusão dentro do previsto da ferrovia Transnordestina e da licitação de novos terminais, onde Suape está no terceiro bloco de certames pretendidos pelo governo.

Para 2016, também é esperado o término da expansão do Canal do Panamá e a possibilidade de novas rotas de navegação para navios de grande porte. “Suape tem que chegar nessas datas tendo feito sua tarefa de casa. Os investimentos federais como a Transnordestina e a licitação dos novos terminais também têm que acontecer casados no tempo certo, porque senão vamos perder a oportunidade da vida”, alerta Ramos.

A ferrovia será importante para movimentar até o porto minério de ferro do Piauí, gesso do Araripe (OE), frutas de Petrolina (PE) e grãos da região chamada MA-PI-TO-BA (Maranhão, Piauí, Tocantins e Bahia). A previsão de conclusão das obras, com recursos do PAC, já foi adiada diversas vezes e o projeto não deve ficar pronto antes de 2017.

A estratégia de Suape em relação ao Canal do Panamá consiste em oferecer infraestrutura disponível para que grandes navios que vêm da Ásia façam escala no porto pernambucano, que servirá para distribuição nas regiões Norte e Nordeste e operações de transbordo. Ramos diz que, se esses navios não atracarem em Suape, podem ir para outros portos como Caribe, por exemplo.

O principal programa de investimentos para o setor portuário com recursos federais é o “Programa de Investimentos em Logística: Portos”, que prevê R$ 54,2 bilhões, sendo R$ 31 bilhões estimados para novos investimentos em arrendamento e TUPs até 2015 e R$ 23,2 bilhões até 2017. O plano também prevê outros R$ 2,6 bilhões para investimentos em acessos hidroviários, rodoviários, ferroviários e em pátios de regularização de tráfego nos 18 principais portos públicos brasileiros, sendo R$ 1 bilhão do Ministério dos Transportes. O restante será executado pelos estados e iniciativa privada. Outros 3,8 bilhões serão investidos para dragagem.

O questionamento do Tribunal de Contas da União (TCU) ao edital de licitação do bloco 1, que envolve 29 áreas entre Santos e Pará, contribuiu para atrasar o arrendamento dos primeiros terminais de portos públicos pretendidos pelo governo. O governo pretende licitar 159 novas áreas, divididas em quatro blocos. Um estudo realizado pela Secretaria de Acompanhamento Econômico do Ministério da Fazenda (Seae) mostra que de 18 licitações realizadas em 2013 nas áreas de portos, transporte, energia, petróleo e gás representaram investimento por parte dos concessionários estimado em R$ 80,3 bilhões a serem realizados, em sua maior parte, nos próximos cinco anos.

Em seus três anos de existência, a segunda fase do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC 2) registra 82,3% das ações concluídas no período 2011-2014. De acordo com o 9º balanço do PAC 2, divulgado em fevereiro de 2014, foram executados 76,1% do previsto até dezembro de 2013. Na área portuária, o programa possui cerca de 70 empreendimentos em mais de 20 portos.

O balanço aponta que o PAC 2 finalizou mais de 3.080 quilômetros de rodovias em todo o país, entre elas a BR-324 (BA) Via Expressa Baía de Todos os Santos, responsável pela redução do conflito entre o tráfego urbano e de cargas, com destino ao porto de Salvador. Nos portos, o PAC 2 concluiu, entre outras obras, o terminal marítimo de passageiros de Recife (PE), a construção da Avenida Perimetral portuária na margem esquerda do porto de Santos (SP), e a recuperação e ampliação do cais comercial do porto de Vitória (ES).






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