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Operadores logísticos rejeitam taxa sobre espelhos d’água

A cobrança imposta pelo uso do que os empreendedores portuários chamam de espelho d’água está acirrando os ânimos no setor logístico. A portaria número 24 que prevê esse encargo, publicada ao final de janeiro pela Secretaria do Patrimônio da União (SPU), afeta complexos como portos, marinas, estaleiros, entre outros. Para o presidente da Associação Brasileira de Terminais Portuários (ABTP), Wilen Manteli, essa cobrança é absurda, já que o governo defende a melhoria dos portos e a atração de empreendimentos. “Não é possível entender que a SPU venha na contramão dessas políticas públicas de investimento e gere mais insegurança jurídica e custos”, argumenta o dirigente.

Manteli salienta que isso não ocorre em países como Estados Unidos e China. Ele acrescenta que, em um momento em que as exportações brasileiras sofrem com a questão cambial e com a concorrência internacional, esse ônus atrapalha ainda mais a competitividade nacional com o aumento do custo logístico. A medida está baseada em um decreto-lei de 1946 que indicava o pagamento pela utilização da água para, por exemplo, consumo em um processo industrial. “No entanto, na instalação de portos, nunca existiu uma cobrança dessas”, afirma. Manteli alerta que quem irá pagar a conta será o produtor.

Para o dirigente há pontos da portaria que não são claros para os empreendedores. Entre eles, os critérios do encargo, que podem incidir sobre patrimônio e investimento, se a taxa incide somente para terminais privados ou também para os de uso público e, principalmente, se será retroativa. “Se houver retroatividade, a determinação criaria um passivo no sistema portuário muito pesado”, teme Manteli.

Apesar da portaria prever 180 dias, a partir da sua publicação, para os investidores regularizarem suas situações, Manteli revela que algumas companhias já realizaram o pagamento do tributo. De acordo com ele, as cobranças são milionárias e anuais. Ele comenta ainda que um terminal, para iniciar as obras de ampliação, desembolsou valores próximos a R$ 35 milhões devido à taxa do uso de espelho d’água. Entre as empresas que podem ter que pagar o encargo estão Vale e CSN.

Manteli defende que não existe base legal para essa cobrança, mesmo com o decreto. “Por que só agora estão exigindo?”, indaga. Entretanto, ele adverte que se a cobrança vigorar e os terminais se negarem a pagá-la, não poderão ampliar suas atividades. Sem a taxa, não é possível obter as autorizações da Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq) ou financiamentos.

O tema impacta diversos empreendimentos no País. Segundo a Secretaria de Portos do governo federal, com uma costa de 8,5 mil quilômetros navegáveis, o Brasil possui um setor portuário que movimenta anualmente cerca de 700 milhões de toneladas das mais diversas mercadorias e responde, sozinho, por mais de 90% das exportações. O sistema portuário nacional é composto por 37 portos públicos, entre marítimos e fluviais. Desse total, 18 são delegados, concedidos ou tem administração feita por governos estaduais ou municipais. Existem ainda 42 terminais de uso privativo e três complexos portuários que operam sob concessão à iniciativa privada.
Para a Secretaria do Patrimônio da União, a portaria tem objetivo de simplificar cobrança

A Portaria 24 tem o objetivo de estabelecer um fluxo e um formato mais simples de análise quanto à cobrança do espaço físico em águas, assegura o diretor nacional de destinação patrimonial da Secretaria do Patrimônio da União (SPU), Luciano Roda. De acordo com ele, a maneira de agilizar esse procedimento é agregar todas as informações em um único instrumento. Roda diz que a legislação patrimonial, como o Decreto-Lei 9.760/46 e a Lei 9.636/98, possibilita essa cobrança. Para ele, o uso privado de qualquer área da União ocorre em condições especiais. “Não pode ser de forma gratuita, principalmente quando tem atividade econômica envolvida”.

Conforme Roda, a taxa já é cobrada dentro do pacote das tarifas portuárias, mas o seu formato está mudando agora, facilitando a regularização dos empreendimentos e a fiscalização dos pagamentos. O diretor diz que a Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq) está regrando melhor o setor e, por isso, a questão da portaria chamou tanto a atenção. “Seria muito bom morar em uma área em frente ao mar e não pagar nada, porém isso não é possível”, compara Roda. Quanto às atividades que serão submetidas ao tributo, o dirigente informa que elas terão reflexos em terminais de uso privativo, estaleiros, marinas, entre outras atividades conduzidas fora do porto organizado. Para as ações exercidas em portos públicos, há uma legislação própria.

“Tudo que há dentro do porto público tem uma regra específica, a cobrança já é feita e essa portaria não tem interferência”, relata Roda. A nova norma abrangerá todas as operações de uso privado em áreas da União.
No caso das plataformas oceânicas, elas precisam estar na faixa de 12 milhas náuticas para serem enquadradas. A maioria das operações de exploração e produção de petróleo está além desse limite, fora da área do patrimônio da União. Uma das estruturas não sujeita à taxa serão os navios fundeados. A embarcação, nessa situação, aguarda autorização para entrar no porto e a tarifa portuária corresponde a essa ação.

Roda relata que o valor da taxa prevista na Portaria 24 varia de acordo com o tamanho do empreendimento e o local em que ele se encontra. Existe no documento uma fórmula que, para os cálculos da cobrança, utiliza o valor do metro quadrado em terra e também o tipo de investimento que está sendo feito. “A ideia de montar isso, nesse formato, foi tentar garantir que a pessoa, no momento que comece o processo de regularização, tenha a dimensão do custo envolvido para ocupar esse espaço e possa se adequar”, explica o diretor da SPU.

Sobre o valor de pagamentos, Roda admite que alguns grandes empreendimentos do segmento implicarão altas cifras. Ele revela que um único complexo, que ele prefere não citar o nome, terá que desembolsar aproximadamente R$ 8 milhões, mas, em compensação, outros empreendimentos não chegam a pagar R$ 1 mil mensais. Roda também enfatiza que a portaria deixa claro que algumas áreas são isentas da taxa, como é o caso de terminais pesqueiros e de interesse público, implantados a partir das necessidades dos municípios e dos estados. Ele ressalta ainda que não há retroatividade de taxas. A retroatividade recairá somente sobre as ocupações irregulares em terra, quando serão cobradas as taxas não prescritas referentes há cinco anos. A Portaria 24 estabelece o prazo de seis meses, a partir da publicação do documento em janeiro, para as empresas regularizarem sua situação. A partir desse prazo, Roda ressalta que o uso irregular pode acarretar a remoção da estrutura que estiver sobre a água.

Fonte: Jornal do Commercio (RS)/Jefferson Klein


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