Uma pergunta que quem não fez vai se fazer em algum momento nos próximos três anos, prazo que separa Porto Alegre da Copa do Mundo de 2014. Vai dar tempo? A dúvida tem como alvo a execução de obras de mobilidade, que, em alguns casos, saldarão atraso de 40 anos. O elenco de melhorias depende ainda da conclusão de projetos para entrar na fase de análise da Caixa Econômica Federal (CEF), que financiará a execução orçada em quase R$ 500 milhões (R$ 475 milhões serão crédito federal e o restante contrapartida do município) somente na área viária e revitalização de áreas.
O cronograma original previa que em dezembro de 2010 seriam deflagradas as concorrências, que agora ganharam um novo calendário: o final do ano. Outro item nevrálgico para a infraestrutura de transportes do Mundial, a ampliação da capacidade e a qualificação do Aeroporto Internacional Salgado Filho têm apenas parte em andamento.
Mas nem tudo está parado. Em execução estão a extensão do Trensurb para Novo Hamburgo, a construção da BR-448, o Aeromóvel que conectará a estação do trem metropolitano ao Terminal 1 do aeroporto, a duplicação da avenida Edvaldo Pereira Paiva (para melhorar o trânsito para o Beira-Rio, o estádio oficial dos jogos) e a instalação do Módulo Operacional Provisório (MOP) no Salgado Filho, ampliando os balcões de check-in. Mas a ampliação da pista e da área de pousos e decolagens ainda está indefinida. A direção da Infraero no Estado promete que tudo ficará pronto até 2013. A contratação da empresa que instalará um novo equipamento para permitir operações em dias de neblina está nos detalhes finais da licitação.
A medida é essencial, especialmente no inverno, quando ocorre o Mundial. “Vamos lançar todas as contratações das obras de mobilidade até dezembro”, compromete-se o prefeito José Fortunati, citando que parte do impacto das mudanças propostas para a Lei de Licitações (a 8.666) não será sentida, como a delegação da elaboração dos projetos básicos a quem fará a obra. Mas há expectativa de que a flexibilidade nas regras encurte os prazos e possibilidade de recursos na concorrência. “Esta etapa já está sendo resolvida com a parceria do Centro das Indústrias do Estado (Ciergs)”, disse Fortunati, em recente evento para relatar a situação das obras.
A prefeitura e o grupo técnico contratado pelo Ciergs aceleram a finalização dessa etapa, que envolve pelo menos dez grandes intervenções. Até o final de julho, é prometida a entrega do projeto do complexo da avenida Tronco, o mais delicado e considerado vital pelo governo local, por envolver desapropriações e remoção de cerca de 1,5 mil moradias. “Definimos três níveis de prioridade das obras: as absolutamente necessárias (avenidas Beira-Rio e Tronco), as necessárias, e as demais são oportunidade, que envolve as obras de arte da Terceira Perimetral”, elenca o secretario municipal de Gestão e Acompanhamento Estratégico, Newton Baggio. Em seu gabinete, no andar térreo do prédio da prefeitura, o entra e sai é constante, com interlocutores munidos de plantas e memoriais descritivos, como a comitiva da Infraero que busca liberar áreas do município para avançar as obras. O superintendente regional da estatal, Carlos Alberto da Silva Souza, e Jorge Herdina, que dirige o Salgado Filho, mantêm reuniões quase semanais com o secretário.
Servidor de carreira do município, Baggio se divide entre a cobrança pública, que só aumenta para colocar o time das grandes obras em campo, e a coordenação da seleção de empresas que formatam o projeto. “Temos um controle diário de como está a elaboração. A vantagem do convênio é de que não teremos custos”, argumenta o secretário. “O Centro das Indústrias tem responsabilidade. É sério”, posiciona-se o secretario extraordinário da Copa, João Bosco Vaz, que rechaça questionamentos sobre atrasos da execução para o Mundial. Mas mesmo na prefeitura há vozes que admitem a restrição à imposição de prazos sobre a Ciergs, que seria normal em contratos dentro das regras do serviço público. “Estaríamos mais adiantados”, diz uma fonte.
A iniciativa, que chega a merecer reconhecimento por buscar economicidade, um dos pilares da gestão pública de obras, não deixa de gerar preocupação em órgãos como o Tribunal de Contas do Estado (TCE). Neste caso, a atenção se volta à dificuldade de exigir o cumprimento de prazos. “É preciso que a prefeitura continue a cobrar os projetos básicos em tempo hábil”, previne o diretor de Controle e Fiscalização do TCE, Victor Hoffmeister. O órgão acompanha tudo diretamente pelo sistema eletrônico, disponibilizado pelo município para informar como está o cronograma.
No final de 2010, os conselheiros do TCE emitiram alertas para a passagem do tempo. “Estamos em cima. É importante que todas as obras sejam feitas”, demarca Hoffmeister. A resolução especial do ano passado regula o acompanhamento, que deve ser feito mesmo antes da expedição da licitação. O diretor avisa que a atuação seguirá o exemplo da duplicação da primeira fase da avenida Edvaldo Pereira Paiva. A execução foi interrompida em 2010, pois foi identificado preço da brita acima da cotação apurada pelo órgão. “A prefeitura foi impedida de pagar o fornecedor”, lembra o diretor do TCE. “Se as obras não saírem não será por culpa do tribunal.”
Equipes da Ciergs e da prefeitura aceleram para não atrasar os projetos
O engenheiro que chefia a força-tarefa da Ciergs, Paulo de Tarso Dutra, garante que os trabalhos estão na reta final. Há dois meses outro engenheiro, Miguel Balischansky, se somou ao grupo para dividir atribuições e acompanhar os trabalhos das 15 empresas responsáveis pelos projetos. “A atenção é total para não perdermos o prazo”, justifica Dutra, que foi chamado no segundo semestre de 2010 pela entidade para formar um time de primeiro nível para cumprir a oferta da Ciergs e entregar gratuitamente ao prefeito José Fortunati os projetos das obras.
O chefe da força-tarefa antecipa que os estudos que envolvem infraestrutura, desenho dos traçados, soluções de engenharia e impacto na mobilidade estão sendo moldados em contato direto com secretarias, como a de Obras, de Planejamento e até da Fazenda, que fará as desapropriações, além da EPTC. Esse cuidado permite nivelar as propostas dos engenheiros com as normas e preceitos do Plano Diretor para cada região envolvida nas intervenções de mobilidade.
A integração é essencial para antecipar eventual impasse na hora de gerar as referências para as licitações, que estarão a cargo das pastas municipais. Os dados terão de ser precisos para posterior análise e liberação pela CEF.
Dutra informa que já ocorreram mudanças em traçados, principalmente na avenida Tronco, nas proximidades do Estádio Olímpico, com o redimensionamento de uma rótula, e na região do Hipódromo do Cristal, que terá um terminal de ônibus, que antes ficaria mais próximo à avenida Edvaldo Pereira Paiva. Também na trincheira, que é prevista para a conexão da avenida Farrapos com a Perimetral, será preciso instalar uma casa de bombas para evitar alagamentos. “Estimamos que os orçamentos devem ficar 20% acima da previsão lançada para o convênio firmado com a CEF em 2010”, adianta Dutra.
Na Secretaria da Fazenda, a supervisora de Aquisições Especiais de Imóveis, Maria Alice Michelucci, já listou 600 desapropriações para liberar as áreas em todos os projetos. Somente na avenida Tronco, serão 350 unidades. A duplicação da rua Voluntários da Pátria exigirá outras cem. A duplicação da avenida Severo Dullius, próxima ao aeroporto, exige desocupação de 70 imóveis e as obras de arte da Perimetral avançarão sobre 60 terrenos com edificações. “Depois de definir as necessidades, temos meios para fazer os processos. Há reserva de R$ 28 milhões no orçamento de 2011 para as aquisições”, detalha Alice, que ainda tenta resolver outro problema - pressa é um fator de pressão nesta área. Conforme a supervisora, a CEF exige os decretos de utilidade pública para liberar os projetos na primeira fase. “Não vamos fazer tudo ao mesmo tempo. A prioridade será das avenidas Tronco e Perimetral”, adianta Alice, que depende ainda do sucesso na negociação para a compra de 33 áreas destinadas à construção de loteamentos para as famílias que serão removidas dos trechos de duplicação da avenida. O caixa é de R$ 9 milhões, mas a dúvida é se a cifra será suficiente.
Enquanto aguarda a entrega dos projetos, a prefeitura decidiu que contratará empresas que se dedicarão exclusivamente ao gerenciamento geral das obras de mobilidade, que inclui o cumprimento de cronogramas, gestão ambiental e fiscalização. A medida é um antídoto para evitar percalços e preenche carência estrutural, como deslocar equipes de carreira para monitorar passo a passo cada execução. O Departamento Nacional de Infraestrutura e Transportes (Dnit) adota o sistema, que reduz erros e questionamentos de órgãos externos como tribunais de Contas e Ministério Público.
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Dentre uma das principais obras em Porto Alegre está a Travessia fluvial do Guaíba - dois barcos com capacidade para transportar 2,5 mil passageiros por dia. Empresa vencedora da licitação aguarda liberação e obras na hidrovia pela Superintendência de Portos e Hidrovias (SPH).
Fonte: Jornal do Commercio (RS)/Patrícia Comunello