Um terminal portuário conquistado pelo grupo Simpar, no fim de 2020, está sendo alvo de questionamento pela Intermarítima, empresa que ficou em segundo lugar no leilão e que agora acusa o governo de desvirtuar o objeto da licitação. O terminal em questão foi destinado à movimentação de grãos, em especial soja, no Porto de Aratu (BA). Porém, passado um ano, a Simpar já tem sinalizações positivas para transportar fertilizantes no local. Na visão do grupo, isso burla o leilão - o que o governo nega.
Recentemente, a Intermarítima protocolou uma denúncia no Tribunal de Contas da União (TCU) pedindo que a autorização para movimentar fertilizantes seja barrada. A empresa afirma que não foram feitos os estudos técnicos necessários, que a mudança seria arbitrária e desvirtuaria o processo licitatório. O argumento é que não faz sentido que o grupo altere os termos do contrato, assinado neste ano, antes mesmo de iniciar a operação.
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Além disso, representantes da empresa dizem que, se já houvesse no edital uma autorização para outras cargas, o cenário de competição teria sido outro. Durante o processo de concorrência, um grupo perguntou, nos pedidos de esclarecimento, se seria possível movimentar outras cargas além de grãos, o que foi negado.
Já o governo diz que, por enquanto, o que existe é apenas uma sinalização positiva para a movimentação de fertilizantes em caráter temporário (por três anos), com objetivo de garantir a continuidade do serviço. O Ministério de Infraestrutura deu uma autorização preliminar e a Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq) liberou a operação provisória - esta, porém, ainda não foi oficializada.
A empresa também já fez um outro pedido, de inclusão definitiva da carga no contrato. O pleito ainda não foi analisado. Porém, o ministério não vê, a princípio, empecilhos, segundo Diogo Piloni, secretário nacional de Portos. “Já há previsão normativa e vários casos precedentes em que houve esse tipo de alteração contratual. Nem assim haveria desrespeito ao instrumento convocatório.”
A Antaq afirma que “o pedido [de mudança definitiva] está sendo analisado pela área técnica e, em seguida, será apreciado pela Diretoria Colegiada”. A Simpar diz que “desconhece qualquer questionamento envolvendo o terminal e reitera o cumprimento irrestrito aos contratos”.
O leilão foi realizado em dezembro de 2020. Na ocasião, a CS Brasil, empresa do grupo Simpar, levou dois terminais: um deles é o ATU 18, de granéis sólidos vegetais (soja), com obrigação de investimentos de R$ 120 milhões - que agora está sendo alvo do questionamento. Houve intensa disputa pelo ativo, mas a Intermarítima acabou perdendo.
No mesmo dia, a CS Brasil também conquistou um segundo terminal em Aratu, o ATU 12 - este sim, de fertilizantes - com previsão de investimentos de R$ 245 milhões. Neste caso, grupo foi o único interessado.
No pedido protocolado pela CS para movimentar fertilizantes no ATU 18 (de soja), a empresa diz que as obras de melhoria no ATU 12 (de fertilizantes), que terão prazo de três anos, devem impactar a operação. Por isso, sem a autorização para movimentar fertilizantes também no terminal de grãos, haverá “grave déficit ao atendimento à demanda de usuários do porto” nesse período. Na visão de Piloni, do Ministério de Infraestrutura, trata-se de um pleito razoável, para garantir que o serviço não seja interrompido.
Para Matheus Oliva, sócio-diretor da Intermarítima, a mudança é um “gol de mão”. “O poder concedente permitiu, por mero casuísmo, a movimentação de fertilizantes sem levar em conta a regra estabelecida no edital, alterando substancialmente o valor do bem arrendado”, diz.
O advogado Fabio Viana Fernandes da Silveira, do Gallotti e Advogados Associados, que representa a Intermarítima, afirma que não faz sentido que seja concedida uma mudança em caráter emergencial para um contrato que acaba de ser licitado. “Essa transição já era prevista.”
Para ele, há uma tentativa da CS Brasil de extrair mais rentabilidade da operação no porto, porque o contrato do ATU 12 (de fertilizantes), em que o grupo foi o único interessado, não teria viabilidade. “Se o governo aceitar, será criado um precedente para todos os terminais no país, haverá uma enxurrada de pleitos.”
Do outro lado, afirma-se que a Intermarítima tem interesse em criar entraves para seguir operando no porto de Aratu. Hoje, a companhia atua como operadora independente, ou seja, não tem contrato de terminais, mas faz a movimentação para clientes em áreas públicas - que serão transferidas à CS Brasil. A companhia nega que haja qualquer intenção de prolongar sua estadia e diz que está pronta para sair.
Fonte: Valor