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Artigo - A Lei do “BR do Mar” com alíquotas reduzidas do AFRMM

No dia 01/12/2021, o Senado Federal aprovou o Projeto de Lei (PL) 4.199/2020, encaminhado pela Câmara dos Deputados, que institui o Programa de Estímulo ao Transporte por Cabotagem, conhecido como “BR do Mar”. No plenário virtual do dia 15/12/2021, os deputados aprovaram as alterações feitas pelos senadores e submeteram o projeto à sanção presidencial no dia 21/12/2021.

Em edição extra do Diário Oficial da União do dia 07/01/2022, a Presidência da República sancionou parcialmente o referido projeto, que foi convertido na Lei nº 14.301/2022, vetando trechos importantes do texto.


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Alguns vetos foram inesperados, especialmente aquele relativo às alterações das alíquotas do Adicional ao Frete para Renovação da Marinha Mercante (AFRMM), pois havia grande expectativa das empresas atuantes no setor, ante a possibilidade de reduzir os custos das operações, especialmente na importação.

O AFRMM é disciplinado pela Lei 10.893/2004 e incide sobre a remuneração do transporte aquaviário, entendido como custo do transporte porto a porto, acrescido dos custos com o manuseio da carga, realizada antes e depois desse transporte (art. 5º, §1º, Lei 10.893/2004). As alíquotas do tributo estão previstas no seu artigo 6º, da seguinte forma: (1) 25% para navegação longo curso; (2) 10% para cabotagem; e (3) 40% para navegação fluvial e lacustre, no transporte de granéis sólidos e líquidos para as regiões Norte e Nordeste.

A versão final do PL, aprovada pelos congressistas, contava com uma redução significativa desses percentuais. O artigo 21, do PL, alterava o artigo 6º da Lei 10.893/2004, para prever as seguintes alíquotas: (1) 8% para navegação longo curso; (2) 8% para cabotagem; (3) 40% para navegação fluvial e lacustre, quanto ao transporte de granéis líquidos para as regiões Norte e Nordeste; e (4) 8% para navegação fluvial e lacustre, quando do transporte de granéis sólidos destinados à região Norte e Nordeste.

Como justificativa para o veto desses pontos, a Presidência da República apontou que “a proposição legislativa incorre em vício de inconstitucionalidade e em contrariedade ao interesse público, pois acarretaria renúncia de receitas sem a apresentação da estimativa do impacto orçamentário e financeiro e das medidas compensatórias (...)”.

Apesar desses vetos, foi aprovada a criação do § 4º para o artigo 6º, da Lei 10.893/04, permitindo ao Executivo estabelecer descontos nas alíquotas do AFRMM, “desde que não diferenciados de acordo com o tipo de carga e com os tipos de navegação, levando em consideração apenas o fluxo de caixa do FMM.”

Ou seja: com a manutenção desse trecho do projeto, os descontos nas alíquotas do tributo somente seriam possíveis por meio de ato normativo da Presidência da República.

Para as atividades dos importadores, a redução da alíquota incidente sobre a navegação de longo curso (transporte de mercadorias entre diferentes países) era defendida inclusive pelos Ministérios da Economia e da Infraestrutura[1], pois traria um grande impacto inclusive sobre o valor dos produtos internos, podendo reduzir o preço dos itens da cesta básica em, pelo menos, 4%, além de contribuir para a redução do “custo Brasil”. No entanto, com a publicação da Lei em 7 de janeiro, as novidades esperadas não se concretizaram imediatamente, já que se manteve a alíquota de 25% incidente sobre o valor do frete nas transações internacionais.

De outro lado, a Lei do “BR do Mar” alterou o art. 37, § 3º, II[2], da Lei 10.893/2004, para dispensar o pagamento da Taxa de Utilização do Sistema Mercante (TUM) na navegação de cabotagem, interior fluvial e lacustre, cuja origem ou destino seja porto localizado na Região Norte e Nordeste. A medida visa promover o desenvolvimento econômico dessas regiões.

Na prática, o benefício ainda não foi percebido pelos transportadores, pois o Sistema Mercante da RFB, até o momento, não está parametrizado para dispensar o pagamento da TUM. Isto é, desde a entrada em vigor da nova Lei, os transportadores aquaviários estão recolhendo indevidamente a referida taxa. Com efeito, enquanto persistir a falha sistêmica, a dispensa do pagamento da taxa demandará o prévio reconhecimento do direito por meio de ação judicial.

Outro ponto a ser destacado sobre o AFRMM é que ele desrespeita dois acordos internacionais dos quais o Brasil é signatário: (1) GATT[3] (Acordo Geral de Tarifas e Comércio) e (2) AFC (Acordo de Facilitação do Comércio).

No caso do primeiro, há a violação do princípio do tratamento nacional, na medida em que se tributa as mercadorias importadas de maneira mais gravosa do que a tributação das mercadorias nacionais[4]; e no caso do segundo, se viola a necessidade de justificativa de sua existência, pois, como se sabe, não há justificativa razoável para que um tributo da década de 1950 permaneça válido atualmente do mesmo modo que antes.

Como esperado pelo setor, os vetos foram derrubados pelo Congresso na sessão conjunta do 17/03/2022[5] e, no dia 25/03/2022, foi feita nova promulgação da Lei do “BR do Mar”, dessa vez, com a entrada em vigor dos percentuais reduzidos.

Nesse sentido, a redução das alíquotas do AFRMM, inicialmente proposta pelos congressistas, é válida para as operações ocorridas após a nova promulgação, uma vez que o trecho com os novos percentuais não integrava a norma publicada em janeiro. Assim, entre a primeira e a segunda promulgação vigorou as alíquotas antigas — a RFB se manifestou no mesmo sentido, com a publicação da Notícia Siscomex nº 008/2022[6], em 28/03/2022.

A derrubada do veto é muito comemorada pelos importadores e transportadores brasileiros, pois contribuirá para a redução dos custos no transporte internacional de mercadorias e para a melhoria do ambiente de negócios nacional, além de contribuir para que o Brasil fique em conformidade com os tratados internacionais dos quais é signatário, promovendo a modernização de sua legislação aduaneira.

Michel Alkimin é advogado da área de tributário aduaneiro contencioso e consultivo da Lira Advogados
Ana Paula Ronchi é advogada da área de Contencioso Tributário e Aduaneiro do escritório LIRA Advogados

[1]https://www.gov.br/economia/pt-br/centrais-de-conteudo/publicacoes/notas-informativas/2021/dezembro/ni-a-importancia-da-aprovacao-do-projeto-br-do-mar.pdf

[2]Lei 10.893/2004, Art. 37. Fica instituída a Taxa de Utilização do MERCANTE. (...) § 3º A taxa de que trata o caput não incide sobre: (...) II – as cargas isentas do pagamento do AFRMM, conforme previsto no art. 14 desta Lei, ou aquelas transportadas nas navegações de cabotagem, interior fluvial e lacustre, cuja origem ou cujo destino final seja porto localizado na Região Norte ou Nordeste, nos termos do art. 17 da Lei nº 9.432, de 8 de janeiro de 1997;

[3]General Agreement on Tariff and Trade.

[4]Situação que foi corroborada pela BR do Mar ao prorrogar até 08/01/2027 a não incidência do AFRMM nas navegações de cabotagem, interior fluvial e lacustre, originadas ou destinadas à porto localizado na Região Norte ou Nordeste do País (art. 24), contribuindo para a manutenção de 99% da arrecadação do AFRMM decorrer das navegações de longo curso.

[5]Sessão conjunta do Congresso Nacional. Disponível em: https://www.congressonacional.leg.br/materias/vetos/-/veto/detalhe/14994#tramitacao_10258007. Acessado em 18/03/2022.

[6]Novos percentuais se aplicam aos Conhecimento de Embarque Eletrônico (CE) posteriores à publicação da norma. Para os emitidos antes de 25/03/2022, o contribuinte deve recolher a diferença em DARF. Disponível em:http://siscomex.gov.br/importacao/importacao-n-008-2022/. Acessado em 04/04/2022.






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