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Artigo - Desafios da Descarbonização Portuária

O transporte marítimo e os portos são a espinha dorsal do comércio global, movimentando entre 80% e 90% das mercadorias do mundo em volume e mais de 70% em valor. No Brasil, a economia do mar representa cerca de 20% do PIB nacional, e aproximadamente 95% das exportações brasileiras utilizam o modal marítimo, tornando os portos um elo essencial na logística nacional. Entretanto, essa importância vem acompanhada de desafios ambientais significativos.

O Brasil, como signatário do Acordo de Paris, comprometeu-se a reduzir suas emissões de GEE e implementar medidas de mitigação climática em diversos setores, incluindo transporte e logística. Além disso, em 2023, a Organização Marítima Internacional (IMO) estabeleceu metas ambiciosas de redução de emissões para o setor marítimo global, com os seguintes objetivos:


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  • · Redução de 30% das emissões até 2030;
  • · Redução de 80% até 2040;
  • · Neutralidade de emissões líquidas até 2050.

Diante desse contexto, a modernização portuária e a adoção de combustíveis alternativos são essenciais para garantir que o Brasil cumpra seus compromissos internacionais e mantenha a competitividade de suas operações logísticas. Iniciativas como a eletrificação de terminais, a digitalização das operações portuárias e o uso de energias renováveis são algumas das alternativas que podem viabilizar essa transição. No entanto, a implementação dessas soluções enfrenta desafios técnicos e econômicos que precisam ser superados para garantir um futuro sustentável para os portos brasileiros.

A transição para operações portuárias mais sustentáveis enfrenta desafios estruturais, financeiros e regulatórios que tornam sua implementação complexa. Segundo a ANTAQ, apenas 4% dos portos públicos e 15% dos terminais registraram operações com embarcações movidas a combustíveis de baixa emissão de carbono. Além disso, a adoção do Onshore Power Supply (OPS), tecnologia que permite a conexão elétrica dos navios atracados para reduzir o uso de motores auxiliares, ainda é incipiente no Brasil. A modernização desses terminais exige altos investimentos iniciais, refletindo diretamente nos custos operacionais e nas tarifas portuárias, que, por sua vez, impactam os custos logísticos do comércio doméstico e internacional.

A adaptação da infraestrutura portuária para atender às exigências ambientais globais envolve investimentos robustos, tanto em eletrificação e eficiência energética quanto na digitalização e integração de modais. Esses custos podem ser classificados em CAPEX, referente aos investimentos em infraestrutura e equipamentos, e OPEX, que abrange os custos operacionais recorrentes após a implementação das novas tecnologias. No que diz respeito ao CAPEX, a adaptação dos portos para combustíveis alternativos, como gás natural liquefeito (GNL), biocombustíveis e hidrogênio verde, demanda a construção de novos terminais de armazenamento e distribuição, cujos investimentos podem variar entre US$ 50 milhões e US$ 150 milhões para infraestrutura de GNL e valores ainda mais elevados para o hidrogênio verde, devido à complexidade dos eletrolisadores e sistemas de armazenamento.

A eletrificação dos terminais portuários também exige investimentos significativos. A instalação de sistemas de Onshore Power Supply (OPS), que permitem que navios atracados se conectem à rede elétrica em vez de manterem seus motores auxiliares ligados, pode custar entre US$ 5 milhões e US$ 30 milhões por porto, dependendo da demanda energética e da infraestrutura existente. A substituição de guindastes, empilhadeiras e caminhões movidos a diesel por equipamentos elétricos, por sua vez, pode ultrapassar US$ 100 milhões por terminal, considerando não apenas a compra dos novos equipamentos, mas também a adaptação da rede elétrica para suportar essa demanda. A digitalização das operações portuárias também requer investimentos expressivos, especialmente em tecnologias como Internet das Coisas (IoT), inteligência artificial e blockchain, que otimizam rotas, reduzem desperdícios e melhoram a eficiência energética.

Além dos investimentos em infraestrutura, a transição energética dos portos implica custos operacionais adicionais, ou OPEX. A eletrificação das operações pode elevar o custo com energia elétrica, já que os equipamentos substituem os combustíveis fósseis pelo consumo da rede elétrica, cujos preços variam conforme a tarifa local. Equipamentos elétricos exigem manutenção especializada, o que pode gerar custos adicionais nos primeiros anos de operação, embora, no longo prazo, sua manutenção seja mais econômica do que a de equipamentos movidos a combustíveis fósseis. Outro fator relevante é a necessidade de treinamento da força de trabalho, já que a introdução de novas tecnologias exige capacitação profissional e, consequentemente, investimentos adicionais para qualificação dos trabalhadores portuários.

Os custos da descarbonização não impactam apenas os operadores portuários, mas também as cadeias logísticas e o comércio exterior. A modernização das infraestruturas portuárias tende a elevar as tarifas cobradas para movimentação de carga, pois os operadores precisam amortizar os investimentos realizados. Esse impacto é particularmente preocupante para setores que operam com baixa margem de lucro, como a exportação de commodities agrícolas e minerais, que podem perder competitividade no mercado global. Além disso, a adoção de políticas ambientais mais rígidas pode levar à criação de taxas ambientais e encargos regulatórios, como já ocorre na União Europeia, onde embarcações que não atendem a determinados padrões de emissões precisam pagar tarifas adicionais para operar nos portos europeus. Esse tipo de regulação pode pressionar os exportadores brasileiros, tornando seus produtos menos competitivos.

Outra consequência dos custos da descarbonização é o impacto na escolha de rotas e portos alternativos. Se os custos operacionais nos portos brasileiros aumentarem significativamente, algumas cadeias logísticas podem buscar alternativas em países vizinhos da América do Sul, desviando cargas para portos que ofereçam custos menores ou condições ambientais mais favoráveis. Isso poderia reduzir a movimentação de cargas nos portos nacionais e comprometer o fluxo logístico do comércio exterior brasileiro.

Apesar dos desafios financeiros, os investimentos em descarbonização portuária podem gerar benefícios econômicos e operacionais a longo prazo. Portos que adotam tecnologias mais limpas tendem a reduzir custos com combustíveis fósseis e manutenção, além de melhorar sua eficiência e atratividade para investidores comprometidos com metas ambientais globais. A eletrificação e digitalização das operações também podem gerar economia de escala e maior previsibilidade logística, reduzindo desperdícios e otimizando a movimentação de cargas.

A experiência internacional tem demonstrado que a transição para portos mais sustentáveis pode ser viabilizada com incentivos adequados e planejamento estratégico de longo prazo. Nos Estados Unidos, o Porto de Los Angeles se tornou um dos principais modelos globais de descarbonização portuária ao implementar o Clean Air Action Plan (CAAP), um programa que combina incentivos financeiros para operadores que utilizam combustíveis alternativos, regulamentação ambiental mais rígida e investimentos em infraestrutura elétrica. Como resultado, o porto reduziu em mais de 70% suas emissões de óxidos de enxofre (SOx) e material particulado (PM) nas últimas duas décadas. Além disso, a implementação do sistema de OPS (Shore Power) tornou-se obrigatória para determinados tipos de embarcações, permitindo que navios de cruzeiro e porta-contêineres desliguem seus motores auxiliares enquanto atracados, reduzindo significativamente suas emissões de GEE. O Porto de Long Beach, vizinho a Los Angeles, também se destacou ao investir mais de US$ 4 bilhões em um plano de eletrificação e modernização de terminais, apostando na digitalização de operações e na substituição de equipamentos movidos a diesel por versões elétricas e híbridas.

Na Europa, o Porto de Rotterdam, o maior do continente, lidera iniciativas de descarbonização ao investir em infraestrutura para combustíveis alternativos e no desenvolvimento de um hub de hidrogênio verde. Em parceria com empresas privadas, o porto tem construído instalações para produção, armazenamento e distribuição de hidrogênio, antecipando-se às novas regulamentações europeias que exigem a redução progressiva das emissões de GEE do transporte marítimo. O porto também implementou um extenso programa de digitalização das operações logísticas, permitindo o rastreamento e a otimização das rotas de embarcações, resultando na diminuição do tempo de espera e, consequentemente, na redução do consumo de combustível e das emissões associadas.

Outro exemplo europeu relevante é o Porto de Hamburgo, que investiu fortemente na eletrificação da sua frota de veículos internos e na implementação de corredores verdes logísticos, que priorizam o transporte ferroviário e fluvial em detrimento do rodoviário. Esse modelo reduz a emissão de carbono das operações e serve como referência para portos que buscam alternativas sustentáveis de integração modal.

No Brasil, a falta de políticas similares e incentivos financeiros pode impactar negativamente a competitividade dos portos nacionais. O alto custo de investimento em infraestrutura sustentável pode resultar no aumento das tarifas portuárias, repercutindo nos custos logísticos do comércio doméstico e internacional.

 

250214-montagem-paulo-campos-fernandes-felipe-castilho-advogados-divulgacao-kincaid.jpgPaulo Campos Fernandes e Felipe Castilho são advogados do escritório Kincaid Mendes Vianna






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