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O que o novo combustível dos navios e o kiwi neozelandês têm a ver com os fretes da carne brasileira?

Henrik SimonPor Henrik Simon

O ano de 2020 se aproxima e como ele a introdução global do novo regulamento da IMO, o “Sulphur CAP”, também chamado de IMO 2020, que reduzirá o teor máximo de enxofre do combustível dos navios de atuais 3,5% (IFO 380) para 0,5% (LSFO), porém a um custo por tonelada cerca de 30% superior.


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Alternativas já estão sendo avaliadas em todo o mundo, tais como: os "scrubbers" (depuradores que “lavam” os gases de exaustão e custam cerca de US$ 10 milhões por navio), os navios movidos a gás natural (que perdem parte da capacidade da carga para os tanques de gás e também custam cerca de 15% a mais) ou, ainda, a utilização do MGO (Marine Gas Oil, também cerca de 30% mais caro). Entretanto, todas as opções possuem prós e contras do ponto de vista operacional e, conforme descrito, necessariamente implicam custos maiores.

Ainda que a nova regulamentação venha causando apreensão aos armadores de navios de um modo geral, para os proprietários de navios “full reefer” a situação é mais difícil já que  os custos de combustível representam uma parcela maior de suas despesas e eles não têm outra alternativa senão usar os combustíveis mais caros LSFO ou MGO uma vez que os depuradores e o Gás Natural não são tecnicamente viáveis diante da já avançada idade média da frota.

De acordo com o último levantamento realizado pela Dynamar (2018 Reefer Analysis), os navios “full reefer”, que nos anos 2000 transportaram cerca de 55% da carga perecível internacional, composta majoritariamente por carnes e frutas, viram sua participação cair para 18% em 2017, no entanto a expectativa da consultoria é de que essa nova regulamentação dos combustíveis leve à demolição de navios menos eficientes já a partir do próximo semestre, em particular da frota de navios “full reefers”, proporcionalmente menores, mais antigos (muitos já com mais de 25 anos) e “beberrões” que seus concorrentes porta-contêineres, o que culminará na conteinerização de uma parcela significativa desse mercado.

Outro ponto importante a favor dos porta-contêineres nessa briga, além da economia de escala e da eficiência energética, é o poder de barganha dos 10 maiores armadores, que concentram 82% da capacidade desse segmento, para negociar com as refinarias, enquanto os 10 maiores armadores “full reefer” respondem por cerca 48%, restando, portanto, a esses se apegar aos diferenciais que lhe restam: alto nível de especialização no transporte de carga fria e as conexões diretas entre origem e destino (normalmente muito mais rápidas do que as linhas de contêiner e que podem ser determinantes para mercadorias com validade curta – "shelf life" – tais como algumas frutas e flores).

Por outro lado, os armadores de navios porta-contêineres tinham ao fim de 2018 uma frota de 2,9 milhões de TEUs "reefer", dos quais  97% sendo 40'rh ("reefer high cube"), sendo que a produção de novos equipamentos "reefer" em 2018 atingiu a faixa dos 130 mil TEUs, ou 12% mais que no ano anterior. Contudo, para 2019 estão previstos novos "reefers", mas com um crescimento da frota inferior ao registrado no último ano.

Em outras palavras, não é difícil imaginar o que vai acontecer no fim desse ano: a procura por equipamentos 40'rh vai crescer globalmente, os armadores vão alocar seus 40'rh nas rotas mais rentáveis e, com isso, os fretes para contêiner "reefer" tendem a subir globalmente, mas em especial para as carnes brasileiras que nos últimos anos conseguiram negociar tarifas muito abaixo da média internacional, basicamente em virtude do enorme poder de barganha de dois dos maiores exportadores de carne do mundo, JBS e BRF.

A título de comparação, esse mês começou a safra de kiwis na Nova Zelândia e que vai até outubro. A estimativa é de que sejam exportados ao longo dos próximos meses 600 mil "pallets" em contêiner (o equivalente a 18.000x40rh) e 45 navios "full reefer" com capacidade de 500 mil pés cúbicos cada (o equivalente outros 10.000x40’rh), com níveis de frete até três vezes maior do que os praticados pelos exportadores brasileiros de carnes!!!

Ou seja, é de se esperar que as exportações brasileiras de carga perecível, em especialmente a proteína animal, sintam um importante aumento dos fretes marítimos, muito embora ainda há de se esperar os reais desdobramentos das possíveis reações dos países árabes (segundo maior destinos das carnes brasileiras) à visita do presidente Bolsonaro a Israel e a instalação do escritório comercial do Brasil em Jerusalém.

Aconteça o que acontecer, a verdade é que os próximos meses até a entrada em vigor do IMO 2020 serão em todo o mundo repletos de muitos cálculos, simulações e negociações entre armadores e donos de carga. E algumas das perguntas a serem respondidas serão:

Quanta carga refrigerada os navios porta-contêineres terão capacidade de conteinerizar?

Os navios "full reefer" conseguirão proteger seu já decadente "market share", ou o IMO 2020 será a “pá de cal” desse segmento?

Os porta-contêineres conseguirão repassar integralmente o aumentos de custos relacionados ao IMO 2020 (em virtude do "overcapacity" e desaceleração do comércio mundial)?

Henrik Simon é sócio da Solve. Iniciou sua carreira na Alemanha em 1979 como trainee da Hamburg Süd, tendo sido transferido para São Paulo em 1984, onde quatro anos mais tarde foi nomeado diretor comercial. Participou ativamente do processo de conteinerização de cargas no Brasil e a partir de 2003 passou a dedicar-se mais exclusivamente às cargas refrigeradas, segmento no qual se tornou referência e um dos maiores especialistas em todo o mundo.






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