Elaborado por:
Mauro Destri CEO, Destri Energy
Victória Alles Engenheira de Petróleo e Pós-graduada em Descomissionamento de Sistemas Petrolíferos
Guilherme Taylor Estudante de Engenharia de Petróleo
Macaé, 1º de Outubro de 2025
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RESUMO EXECUTIVO
O descomissionamento de ativos offshore demanda infraestrutura portuária altamente especializada, estruturada nas cinco etapas interdependentes conhecidas como 5Ds: Desativação, Descomissionamento, Desmantelamento, Disposição e Descarte.
Este artigo apresenta análise técnica dos requisitos infraestruturais críticos, com ênfase na fase de desmantelamento, que concentra as operações portuárias mais complexas. Aborda-se a necessidade de berços com calado mínimo de 12 metros, pátios pavimentados superiores a 200.000 m², sistemas de contenção de hidrocarbonetos dimensionados conforme CONAMA 430/2011, áreas controladas para materiais radioativos naturais (NORM) segundo CNEN NN 8.01, e infraestrutura alfandegária integrada. A análise revela que poucos terminais brasileiros possuem configuração completa para atendimento integral aos 5Ds, evidenciando gaps significativos em sistemas ambientais, capacidade náutica e certificações. A integração desses elementos constitui diferencial competitivo determinante para captura do mercado estimado em R$ 70 bilhões até 2029.
Palavras-chave:
Descomissionamento offshore. Desmantelamento naval. Gestão ambiental portuária.
1 INTRODUÇÃO
Com investimentos projetados de R$ 70 bilhões entre 2025-2029 (ANP, 2025) e 284 campos em declínio produtivo, a indústria brasileira de petróleo e gás demanda infraestrutura portuária capaz de processar estruturas offshore de grande porte com segurança operacional e conformidade ambiental rigorosa.
O descomissionamento estrutura-se em cinco etapas interdependentes denominadas 5Ds:
Desativação, Descomissionamento, Desmantelamento, Disposição e Descarte (DESTRI, 2025). Cada fase impõe requisitos específicos, desde capacidade náutica para FPSOs de 340 metros até sistemas especializados para gestão de materiais radioativos naturais (NORM) e bioincrustações invasoras.
A fase de desmantelamento concentra as operações portuárias mais complexas, envolvendo desmontagem estrutural, corte de materiais, segregação de resíduos e preparação para economia circular, demandando equipamentos robustos, sistemas ambientais sofisticados e conformidade regulatória ampla.
2 OS 5DS: REQUISITOS POR ETAPA
2.1 Desativação
Nesta fase inicial, o porto atua como base logística fornecendo: terminais para troca de turmas (200-400 trabalhadores/dia), suporte a manutenções intempestivas em embarcações (evitando custos de R$ 450-680 mil/dia), e pátios impermeabilizados com drenagem para caixas separadoras óleo/água (CPS) e gestão inicial de resíduos conforme CONAMA 275/2001.
2.2 Descomissionamento
Executam-se operações de abandono de poços (P&A) conforme ANP 817/2020, desconexão de linhas submarinas e recuperação de equipamentos subsea. Requisitos incluem: calado de 10-12 metros, bacia de evolução de 1,5-2,0 × LOA, pátios com capacidade >10 t/m² para equipamentos submarinos (manifolds, PLEMs, PLETs), e integração logística rodo-ferroviária.
2.3 Desmantelamento: Núcleo Operacional
Infraestrutura Náutica:
Berços de 390-400m (LOA ~340m + folgas)
Calado ≥12m (UKC 0,6m ou 5% conforme PIANC 2014)
Bacia de evolução 510-680m de diâmetro
Rebocadores com 60t bollard pull
Pátios e Equipamentos:
Áreas pavimentadas: 200.000-500.000 m² (capacidade 10-15 t/m²)
Pavimentação: concreto fck ≥35 MPa com impermeabilização
Guindastes: 300-1.200t SWL com spreader beams
Sistemas de corte: tesouras hidráulicas >1.000t, serras frias, oxicorte, shredders
Movimentação: SPMTs 200-500t, empilhadeiras 25-45t, reach stackers
Sistemas Ambientais:
CPS ≥500 m³ (eficiência ≥95%, CONAMA 430/2011)
ETEI com flotação, coagulação/floculação e filtração
Drenagem segregada com canaletas, bermas e tanques de equalização
Kits de resposta rápida (spill response) conforme PEI/CONAMA 398/2008
Gestão de Materiais Especiais:
NORM: Áreas controladas com piso impermeável, ventilação HEPA, sinalização radiológica (CNEN NN 3.01), detectores calibrados para Ra-226/Ra-228, embalagens tipo A homologadas. Multas por não conformidade: R$ 5-50 milhões (Lei 10.308/2001).
Bioincrustações: Protocolos para coral-sol (Tubastraea spp.) com remoção controlada, contenção em recipientes estanques e destinação licenciada (IBAMA 2021). Alternativa: coprocessamento em cimenteiras.
Amianto: Áreas climatizadas com contenção dupla e manuseio por equipes certificadas (NR-15 Anexo 12).
2.4 Disposição e Descarte
Triagem por famílias de materiais usando separadores magnéticos, pesagem com balanças rodoviárias (80-120t) e emissão de MTR/SINIR vinculado ao CDF. Parcerias estratégicas: siderúrgicas (reciclagem >95%), operadores de logística reversa (EEE/WEEE), cimenteiras (coprocessamento) e aterros classe I licenciados.
3 INFRAESTRUTURA ALFANDEGÁRIA: DIFERENCIAL COMPETITIVO
Áreas alfandegárias integradas constituem diferencial crítico, reduzindo tempo de desembaraço de 15-30 dias para 3-7 dias, custos logísticos em 15-25% e prazo total em 20-35%.
Vantagens: agilidade na liberação de equipamentos importados, certificação de origem para exportação de sucata (20-40% do aço), e controle de materiais sob regime especial (Exército, PF, ANVISA).
Terminais de destaque:
Porto do Açu (RJ): EADI integrada, 840.000 m² de pátios, calado 18,5m, referência nacional TMIB (SE): infraestrutura alfandegária robusta, posicionamento estratégico para Bacia Sergipe-Alagoas
Terminal de Niterói (RJ): capacidades alfandegárias em consolidação, proximidade da Bacia de Campos
Santos e Suape: estruturas alfandegárias consolidadas, porém com restrições de espaço para desmantelamento
4 CONFORMIDADE REGULATÓRIA
Licenciamento: LO específica com condicionantes para NORM (CNEN), efluentes (CONAMA 430/2011), resíduos perigosos (ABNT NBR 10004:2024) e emissões
(CONAMA 316/2002).
Certificações: ISO 9001/14001/45001, ISPS Code, CONPORTOS (controle 24/7, CFTV, treinamentos).
Planos de emergência: PEI e PAE integrados com Capitania, Bombeiros, IBAMA e Defesa Civil, simulados semestrais obrigatórios.
Gestão de resíduos: MTR/SINIR operacional, contratos com destinadores licenciados, inventário mensal e emissão de CDF por lote.
5 BENCHMARK E APLICABILIDADE
Aberdeen (Reino Unido): 127 estruturas processadas (2017-23), taxa de reciclagem 97%, 690.000 m² de pátios, calado 15m, 8 guindastes 500-1.200t.
Brasil: Porto do Açu lidera (12 projetos desde 2020), TMIB apresenta potencial regional significativo, e Terminal de Niterói desenvolve capacidades especializadas. Santos e Suape possuem excelência em cargas gerais, mas enfrentam limitações espaciais para desmantelamento.
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
O descomissionamento offshore demanda preparação técnica rigorosa nos 5Ds. Requisitos críticos incluem: berços com calado ≥12m, pátios >200.000 m², guindastes 300-1.200t, sistemas de contenção dimensionados, áreas controladas para NORM e infraestrutura alfandegária integrada. Poucos terminais nacionais possuem configuração completa. A presença de áreas alfandegárias reduz custos em 15-25% e prazos em 2035%, constituindo diferencial competitivo frequentemente subestimado.
Terminais que integrarem capacidade náutica, sistemas ambientais robustos, certificações reconhecidas e eficiência alfandegária consolidar-se-ão como hubs regionais, capturando parcela significativa do mercado de R$ 70 bilhões projetado até 2029 e contribuindo para economia circular sustentável da cadeia offshore brasileira.
REFERÊNCIAS
AGÊNCIA NACIONAL DO PETRÓLEO (ANP). Resolução nº 817, de 24 abr. 2020. Regulamento Técnico do Descomissionamento. Brasília: ANP, 2020.
ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS (ABNT). NBR 10004-1:2024: Resíduos sólidos – Classificação. Rio de Janeiro: ABNT, 2024.
COMISSÃO NACIONAL DE ENERGIA NUCLEAR (CNEN). Norma NN 8.01: Gerência de Rejeitos Radioativos. Brasília: CNEN, 2025.
CONSELHO NACIONAL DO MEIO AMBIENTE (CONAMA). Resolução nº 430, de 13 maio 2011. Condições e padrões de lançamento de efluentes. Brasília: MMA, 2011.
DESTRI, Mauro José Teixeira. Os 5Ds do Descomissionamento: Gestão integrada do ciclo de vida de ativos offshore. Rio de Janeiro: Sinergia, 2025.
INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE (IBAMA). Plano Nacional de Prevenção, Controle e Monitoramento do Coral-sol. Brasília: IBAMA, 2021.
INTERNATIONAL MARITIME ORGANIZATION (IMO). Guidelines for the Control and Management of Ships' Biofouling. London: IMO, 2011.
PERMANENT INTERNATIONAL ASSOCIATION OF NAVIGATION CONGRESSES (PIANC). Harbour Approach Channels Design Guidelines. Report 121. Brussels: PIANC, 2014.
PORT OF ABERDEEN. Decommissioning Report 2023: South Harbour expansion and sustainability metrics. Aberdeen, 2023.
Mauro Destri CEO, Destri Energy
Victória Alles Engenheira de Petróleo e Pós-graduada em Descomissionamento de Sistemas Petrolíferos
Guilherme Taylor Estudante de Engenharia de Petróleo