Há um mundo por trás da produção de petróleo. Para viabilizar a engenharia necessária à extração do precioso óleo, é desenvolvida uma gama de pesquisas que envolvem inúmeras áreas do conhecimento e movimentam milhões de dólares todos os anos. Por conta desse panorama não é de se estranhar que o setor de Petróleo e Gás tenha se tornado nos últimos anos o mais celebrado na área de pesquisas no Rio Grande do Norte. A importância pode ser medida através de muitas variáveis, como a quantidade de pessoas envolvidas, os investimentos, patentes e artigos produzidos através do interesse na mais importante fonte energética da atualidade.
A Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) se beneficiou como poucas em todo o Brasil da “produtividade” científica e tecnológica advinda da exploração de petróleo e gás no país. O crescimento da universidade acompanhou o volume de dinheiro investido em pesquisas no setor. Nesse caso, não apenas financiados pelas agências governamentais, como Finep e CNPq. Com as bênçãos do petróleo, a UFRN conseguiu a sua mais importante parceira, responsável por gastar milhões de reais em pesquisa: a Petrobras. Auxiliadas pela Agência Nacional do Petróleo, a Petrobras e a UFRN movimentam hoje um verdadeiro batalhão de cientistas engajados em tecnologia e inovação.
De acordo com o diretor do Núcleo Interdisciplinar de Petróleo e Gás da UFRN, Djalma Ribeiro, a Universidade conta com 38 laboratórios, mais de 100 professores e 600 bolsistas, incluindo graduação e pós-graduação, envolvidos com a pesquisa e a formação de recursos humanos para a área. Juntando alunos-bolsistas e os demais alunos, há cerca mil pessoas trabalhando nessa parte energética. Os investimentos desde o ano 2000 chegam à soma de R$ 150 milhões somente em infraestrutura e equipamentos, além de R$ 20 milhões na formação de recursos humanos. No total, são 13 departamentos da Universidade com trabalhos na área.
Essa profusão de cursos e pesquisas dá origem um amálgama de conhecimento que envolve áreas afins, como geologia e geofísica do Petróleo, e totalmente diversas, como direito do Petróleo e Realidade Virtual. Há pesquisas para todos os gostos e todos os passos da engenharia de perfuração e extração de petróleo, tanto em terra quanto em mar. Algumas pesquisas já ficaram famosas, de tão divulgadas pela Universidade, como a que instituiu um software nacional para a automação dos poços em terra. Contudo, o universo é mais amplo.
Do revestimento dos tubos de vapor durante a perfuração até os fluidos utilizados para manter a pressão, resfriar a broca, entre outras funções, tudo isso é pesquisado na UFRN. As formas de conseguir apressar o licenciamento ambiental e o estudo das leis que regem a área de petróleo também. “Esse é um setor eminentemente multidisciplinar e a Universidade é pioneira em vários pontos, como na área de química do petróleo, cujo único curso no país é nosso, ou na área de direito do petróleo, que temos um grupo de estudos também pioneiro”, explica Djalma Ribeiro.
Entre as pesquisas mais recentes e importantes, destaca-se a área de desenvolvimento de cimentos com resistência a altas temperaturas, fluidos vegetais para a perfuração de poços com pouco dano ao meio ambiente, utilização da fibra de carnaúba no revestimento de tubos de vapor, genoma do petróleo e a modelagem 3D em tempo real dos poços, no laboratório de realidade virtual. De acordo com o contrato mais recente da UFRN com a Petrobras, a principal parceira desses projetos, as patentes são divididas entre as duas instituições, quando antes eram de propriedade somente da Petrobras.
Laboratório de Realidade Virtual na UFRN
Reuniões de trabalho na Petrobras só com óculos 3D. Não em todos os setores, obviamente, mas boa parte dos gerentes da empresa precisam pôr os óculos para conseguirem trabalhar. E ao invés de se reunirem em torno de uma prosaica mesa de reuniões, os gerentes se debruçam sobre imagens em três dimensões, modeladas matematicamente, e atualizadas em tempo real. O que está projetado na tela é o processo de perfuração de um poço de petróleo, numa réplica bastante parecida, o que possibilita a correção de qualquer erro praticamente na mesma hora em que acontece.
O ar futurista da operação empresta um clima de filme às reuniões da Petrobras. Mas isso não só é possível como largamente utilizado pela empresa. Um dos laboratórios de Realidade Virtual da empresa está sediado na UFRN, no Núcleo de Petróleo e Gás, e tem como coordenador o professor Sílvio Bezerra. Segundo Sílvio, as salas de visualização são uma realidade dentro da Petrobras, embora ainda seja necessário a construção de uma rede de banda larga para a integração dessas informações.
“Está em desenvolvimento a Rede Giga para interligar esses pontos. Com tudo terminado será possível fazer uma videoconferência em três dimensões onde técnicos em locais diferentes poderão visualizar a mesma imagem”, diz Sílvio. Outra pesquisa realizada pelo laboratório, ainda na fase inicial, é a captação e envio de imagens em tempo real também em 3D. Nesse caso, não é uma modelagem, um desenho, mas um filme mesmo transmitido em tempo real.
Enquanto esse mais novo processo não é desenvolvido, a Petrobras se beneficia de tecnologia de ponto, com a modelagem em 3D, para corrigir falhas na perfuração de poços. Quando vai se perfurar, ao contrário do que muitos acreditam, o ângulo de incidência da broca não é 90°, não é vertical. “A perfuração navega dentro do poço na horizontal, então é necessário muita precisão para que a broca não saia de dentro da área do poço”, diz.
Pesquisas solucionam problemas da extração
Você já imaginou que é necessário preencher de cimento parte do poço de petróleo em terra para dar mais estabilidade à perfuração? E como o cimento poderia se adaptar às condições de alta temperatura e pressão dentro dos poços – normalmente em profundidades quilométricas – sem ficar estragado? A Petrobras pensou nisso e, em conjunto com a UFRN, tem financiado vários projetos para desenvolvimento de material resistente e adequado para esse fim. No Laboratório de Cimentos, sob a coordenação do professor Antonio Martinelli, são produzidos cimentos ultra-resistentes ou adaptados a condições especiais.
De acordo com o professor Antonio Martinelli, o grupo de estudos à frente dos projetos na área de cimentação de poços de petróleo existe há 12 anos e começou a pesquisar nesse setor por iniciativa da própria Petrobras. “Não havia na região um grupo de pesquisas para tentar resolver esses problemas com o material”, diz Martinelli. Depois de tanto tempo, o Laboratório de Cimentos já recebeu investimentos de R$ 10 milhões, formando mais de 40 alunos, entre graduação e pós-graduação, além de ter conseguido aprovar seis patentes de novos produtos, tendo quatro atualmente em análise no Instituo Nacional de Propriedade Intectual (INPI).
O cimento é utilizado nos poços de petróleo para dar estabilidade mecânica aos tubos metálicos inseridos no poço. Há um espaço vazio entre o tubo e as paredes do buraco aberto pela sonda e é nesse espaço que o cimento é depositado. Além disso, o cimento impede o contato entre aqüíferos e gases provenientes da extração do óleo. Como se sabe, os poços têm quilômetros de profundidade, em condições especiais de temperatura e pressão. Além de “viajar” por uma extensão considerável, o cimento precisa ser resistente a esse ambiente diferenciado. Ele não pode endurecer antes da hora e nem quebrar por conta da alta temperatura.
O que os pesquisadores da UFRN fazem é desenvolver pastas de cimento com capacidade de atender a todos esses requisitos diferenciados. “Não é um cimento muito diferente do que é produzido nas cimenteiras, mas ele tem essa capacidade diferenciada”, explica Martinelli. Contudo, o produto desenvolvido pela UFRN não contém brita ou areia. O seu aspecto lembra a de uma tinta.
Em outros casos, a Petrobras tem demandas específicas. “Foi necessário fazer, por exemplo, um material mais leve para ser utilizado em poços com baixa pressão. Esse produto precisava também ser mais barato”, mostra o professor, ressaltando que em muitos momentos o Laboratório trabalha a partir de demandas específicas da Petrobras. “O interessante é que estamos constantemente sendo desafiados a encontrar novos materiais, adaptados a novas condições. Cada tipo de poço, em terra ou mar, exige uma especificidade na produção”, encerra.
Fonte: Tribuna do Norte (RN) Natal
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