O ano de 2020 promete ser movimentado para a indústria de óleo e gás. Na agenda do setor, estão previstos para este ano avanços na abertura dos mercados de refino e gás natural. Além disso, a expectativa é que a regulação seja rediscutida, frente à necessidade de preparação do terreno para a abertura desses dois segmentos. Na área de exploração, o calendário de leilões ofertará, pelo quarto ano consecutivo, novas oportunidades de aquisições para as petroleiras. Enquanto isso, as companhias vivem a expectativa de que, após a decepção das rodadas do pré-sal de 2019, o fim do regime de partilha entre na pauta do Congresso.
Em pleno curso, o programa de desinvestimentos da Petrobras deve agitar não só as aquisições, mas também o mercado de capitais. No refino, a previsão é que as primeiras privatizações comecem a ganhar corpo ao fim do primeiro trimestre, para quando a estatal espera receber as ofertas finais pelas unidades do primeiro pacote de ativos colocado à venda: Rnest (PE), Rlam (BA), Repar (PR) e Refap (RS). A petroleira acredita que os primeiros contratos de venda de refinarias serão assinados ainda neste ano, embora a conclusão dos negócios deva ficar para 2021.
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No caso do gás, os desinvestimentos devem avançar de forma mais rápida. Para 2020, a estatal espera cumprir o acordo com o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) para sair integralmente da distribuição e transporte de gás. A venda da fatia remanescente de 10% na Transportadora Associada de Gás (TAG) e na Nova Transportadora do Sudeste (NTS) não deve se alongar. A Petrobras já sinalizou também a intenção de realizar, no segundo semestre, a venda do negócio de distribuição de gás, por meio de um IPO (sigla em inglês para oferta pública inicial de ações) da Gaspetro.
Para além dos setores de refino e gás, outro destaque aguardado é a venda da Braskem. A exemplo da Gaspetro, a intenção da empresa é se desfazer da petroquímica por meio do mercado de ações até o fim do ano.
Na área de exploração de óleo e gás, a expectativa é que as petroleiras intensifiquem as perfurações no pré-sal, atrás de descobertas nas áreas adquiridas nos leilões dos últimos três anos. O sócio da área de energias e recursos naturais da KPMG, Anderson Dutra, destaca que 2020 deve ser marcado também pela sequência das licitações de blocos exploratórios. “Acredito também numa discussão muito forte sobre o regime de partilha”, afirma o especialista.
Em dezembro, a nova presidente do Instituto Brasileiro do Petróleo (IBP), Clarissa Lins, disse ao Valor que o setor vai tratar como prioridade a defesa do regime único de concessão para atividades de exploração e produção. No Brasil, as áreas exploratórias são licitadas sob o regime de partilha - quando os ativos estão dentro do polígono do pré-sal - e sob o modelo de concessão nos demais casos.
Segundo ela, o esvaziamento dos leilões de partilha de 2019 sugere que o regime se esgotou, após edições de sucesso nos anos anteriores. Desde 2017, as multinacionais investiram R$ 13,9 bilhões na aquisição de ativos, nas rodadas de partilha, mas, no ano passado, as petroleiras privadas se ausentaram por completo da 6ª Rodada do pré-sal e do leilão dos excedentes da cessão onerosa.
Uma eventual discussão sobre o marco legal do pré-sal pode afetar o calendário dos leilões previsto para 2020
O desejo das petroleiras encontra eco no próprio governo. O ministro da Economia, Paulo Guedes, atribuiu a frustração dos leilões de partilha de 2019 ao modelo de outorga adotado e defendeu a extinção da partilha. Para o chefe de pesquisa na área de exploração e produção da Wood Mackenzie na América Latina, Marcelo de Assis, porém, a agenda curta do Legislativo, em meio à corrida eleitoral, é um desafio para que a revisão do marco legal do pré-sal avance em 2020. “Acredito que o governo possa realizar o leilão de partilha, este ano, revisando os termos [os bônus de assinatura e percentuais de óleo destinada à União]”, disse.
Dutra, da KPMG, destacou que uma eventual discussão sobre o marco legal do pré-sal pode afetar o calendário dos leilões. “Enquanto o futuro da partilha não for definido, tenho dúvidas de que a 7ª Rodada do pré-sal será marcada para 2020. Mas não tenho dúvidas de que teremos uma 17ª Rodada de concessões forte e a oferta permanente [mecanismo pelo qual a ANP coloca à disposição do mercado um pacote de ativos para compra sob demanda]”, afirmou.
Reconhecendo que a discussão sobre a partilha pode colocar em risco o calendário de leilões, a presidente do IBP defende que as duas agendas ocorram em paralelo, sem mudança de datas das licitações. “Entendemos que talvez tenhamos que caminhar em paralelo por um tempo [com a discussão sobre o fim da partilha, concomitantemente à continuidade dos leilões], mas queríamos deixar claro para os formuladores de políticas públicas que, conceitualmente e economicamente, o regime de concessão é benéfico no longo prazo para o Brasil”, defende.
Pelo regime de partilha, as petroleiras destinam parte do volume de óleo que produzem para a União e pagam royalties, com base em alíquota de 15% - superior à alíquota de até 10% prevista no regime de concessão. A administração dos contratos é considerada mais complexa e burocrática, uma vez que, nesse regime, as companhias têm direito a recuperar parte dos custos de exploração e produção das áreas, mas para isso precisam contabilizar e apresentar uma série de planilhas à PPSA, estatal que representa a União nos contratos. Já na concessão, as empresas ficam com todo o óleo produzido, mas pagam royalties e participações especiais (compensação financeira que incide sobre os maiores campos). Segundo as petroleiras, esse modelo estimula mais a eficiência, uma vez que os custos não são recuperados.
Ainda no campo regulatório, a Agência Nacional de Petróleo (ANP) terá pela frente uma agenda intensa. Diante do avanço esperado na abertura do refino e gás, o órgão regulador se dedicará à revisão dos arcabouços regulatórios desses dois segmentos. Para 2020, estão previstas discussões sobre a separação entre a figura do transportador e dos agentes potencialmente competitivos dentro da cadeia de valor do gás; e diretrizes para o código de rede comum entre os diferentes transportadores. No abastecimento, a atualização das regras de controle de qualidade na revenda está na pauta.
Fonte: Valor