Em consequência da falta de chuvas e do calor dos últimos meses em diversas regiões, colheita brasileira de soja poderá diminuir até 5% nesta safra 2018/19
Depois de comemorarem no ano passado resultados positivos que não estavam no radar no fim de 2017, a cadeia produtiva de soja têm pela frente perspectivas bem menos favoráveis, com quedas estimadas para a colheita, para o valor bruto da produção e para as exportações do grão e seus derivados (farelo e óleo).
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Como todas as projeções públicas e privadas vêm confirmando, a colheita, prejudicada pela falta de chuvas e pelo calor excessivo nos últimos meses em diversos Estados, deverá ser pelo menos 5% menor. E como o cenário externo dá sinais de se normalizar com a recuperação da safra argentina e o arrefecimento das disputas entre EUA e China, os preços pagos pelo grão brasileiro também não serão os mesmos.
Com essa combinação entre oferta e preços menores, o valor da produção ("da porteira para dentro") tende a ser pelo menos R$ 13 bilhões menor que em 2018, enquanto a receita obtida com as exportações do grão e seus derivados poderá encolher em cerca de US$ 10 bilhões, o que fatalmente espremerá as margens de lucro ao longo da cadeia, exceto na atividade de processamento.
Novas estimativas divulgadas ontem pela Agroconsult a partir de dados recolhidos durante a expedição técnica Rally da Safra 2019 confirmaram o quadro complicado no campo. Segundo a consultoria, mesmo com uma área plantada estável, a produção brasileira ficará em 116,4 milhões de toneladas nesta safra 2018/19, quase 3 milhões a menos que em 2017/18.
Em encontro com jornalistas ontem em Brasília, André Pessôa, sócio-diretor da Agroconsult, lembrou que, nesta temporada, o plantio, que começou em meados de setembro, evoluiu aceleradamente mas que, em dezembro, as lavouras de muitas regiões enfrentaram um clima atípico. Em janeiro, a situação não melhorou.
O volume previsto pela consultoria é superior ao estimado pela Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), que em relatório divulgado na semana passada dimensionou a colheita do grão em 115,3 milhões de toneladas, 3,3% abaixo do ciclo passado em consequência dos mesmos problemas.
Embora o volume ainda seja grande - a safra será, no mínimo, a terceira maior da história - e que as quedas previstas sejam relativamente pequenas, a redução da oferta não está sendo acompanhada por aumento de preços.
Na bolsa de Chicago, os contratos futuros de segunda posição de entrega do grão acumulam quedas superiores a 10% nos últimos 12 e 24 meses. No país, os valores praticados no porto de Paranaguá (PR), por exemplo, estão cerca de 20% menores que os de setembro, pico da influência da guerra sino-americana sobre o aquecimento da demanda do país asiático pelo grão brasileiro.
Como a colheita está em curso, é normal que os preços caiam no país nesta época do ano. Mas, segundo analistas, o espaço para recuperações é limitado. Daí porque o Ministério da Agricultura projeta o valor da produção do grão em R$ 129 bilhões em 2019, quase 10% abaixo do montante calculado para 2018.
"Estamos esperando preços médios conservadores nesta temporada, diante do provável recuo dos prêmios de exportação no caso da confirmação de um acordo comercial entre EUA e China", afirma Flávio Roberto de França Jr., analista da Datagro, em nota divulgada ontem.
Para a soja em grão, França espera que os embarques alcancem um preço médio de US$ 370 a tonelada neste ano, ante US$ 387 em 2018. Para o farelo, prevê queda de 8%, para US$ 365 a tonelada, e para o óleo, alta de 0,3%, para US$ 730 a tonelada.
No total, diz a consultoria, a receita com as exportações brasileiras do grão e seus derivados deverá somar US$ 31,1 bilhões, 24% menos que em 2018. O volume total a ser embarcado deverá cair 18%, para cerca de 84 milhões de toneladas.
É menos do que estima a Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais (Abiove), que representa as empresas que processam e exportam soja e derivados. Segundo a entidade, os embarques vão gerar US$ 32,8 bilhões em 2019, com quedas de volumes e preços para o grão, o farelo e o óleo.
Conforme a Abiove, os embarques do grão alcançarão US$ 26,6 bilhões, 20,1% menos que em 2018, os de farelo alcançarão US$ 5,8 bilhões (queda de 13,4%), e os de óleo, por causa da "volta" da Argentina ao mercado, recuarão quase 73%, para US$ 280 milhões.
É verdade que as cotações poderão reagir se Washington e Pequim fizerem as pazes. Mas, neste caso, os prêmios pelo grão brasileiro, que representa mais de 80% dos volumes exportados do complexo - serão 70,1 milhões de toneladas em 2019, segundo a Abiove - também cairão.
"China e Estados Unidos serão, com certeza, os principais parceiros comerciais em soja", afirmou ontem Han Changfu, ministro da Agricultura e Assuntos Rurais da China, à agência Dow Jones Newswires. No ano passado, com as disputas entre os dois países, a China reduziu as compras do grão americano e ampliou as importações da matéria-prima brasileira, que bateram recorde.
Fonte: Valor