O Banco Central (BC) subiu ontem o juro básico da economia brasileira, a taxa Selic, em 0,50 ponto percentual, para 8,5% ao ano. É a terceira alta seguida da taxa. A decisão foi unânime. O aumento confirmou a principal aposta dos economistas, baseada no atual cenário de pressão inflacionária. O resultado da inflação oficial medida pelo IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo) de junho, que, em 12 meses, ficou acima do teto da meta do governo, reforçou a percepção de que a Selic subiria mais 0,50 ponto hoje.
O IPCA ficou em 6,7% no período, enquanto o teto da meta do governo é 6,5% (o centro da meta é 4,5%). Neste ano, o teto já tinha sido ultrapassado em março, quando o índice em 12 meses ficou em 6,59%.
A elevação dos juros é um instrumento usado pelo governo para conter o consumo, uma vez que o crédito (tanto empréstimos em instituições financeiras quanto parcelamentos em lojas, por exemplo) fica mais caro. E, com menos demanda, a inflação tende a ceder.
Fernando Genta, economista-chefe da MCM Consultores, estava entre os que apostavam em aumento de 0,50 ponto percentual da Selic. O especialista destaca que, embora a produção industrial do País esteja ruim, o que poderia arrefecer o ritmo de alta do juro básico, o IPCA em 12 meses acima da meta deu sustentação para a continuidade do aperto monetário.
“Se colocarmos juntas as perspectivas negativas para a atividade econômica e as projeções de inflação, que indicam taxas elevadas, mas relativamente confortáveis em relação ao risco de rompimento do teto da meta, concluiremos que o atual ciclo de aperto monetário tende a ser de magnitude moderada”, afirma.
O economista prevê, além deste aumento de 0,50 ponto percentual, mais um em agosto e outro de 0,25 ponto percentual em outubro, o que levaria a Selic para 9,25% ao ano no fim de 2013.
Já Maurício Molan, economista do banco Santander, projeta a taxa em 9% ao ano em dezembro, mas também esperava aumento para 8,5% ao ano hoje.
“A última ata do Copom indicou uma mudança tanto na avaliação quanto na estratégia da autoridade monetária. Recentemente, a prioridade parece estar voltada totalmente ao controle da inflação, mesmo à custa de um menor crescimento econômico”, diz.
Para Fabio Akira, economista do JP Morgan, o juro básico deve terminar o ano em 9,5% ao ano. O especialista, porém, que inicialmente esperava aumento de 0,75 ponto percentual da taxa, reviu sua projeção para alta de 0,50 ponto. “Sinais de desaquecimento da economia e uma ajuda no lado fiscal, com corte nos gastos, deixaram o Copom mais calmo, apesar do enfraquecimento do real em relação ao dólar.”
Fiergs aponta dificuldades na competitividade após elevação
“O novo aumento da Selic, em um momento de queda da produção industrial, vem no sentido de atravancar ainda mais a já lenta retomada do setor produtivo, uma vez que inibe os investimentos e a expansão da oferta, gerando ainda mais pressões de preços. O combate à inflação alta, que é reflexo de problemas estruturais, passa impreterivelmente por ajustes importantes das contas públicas, que devem ser feitos sem manobras contábeis e nem aumento dos impostos”, afirmou o presidente da Federação das Indústrias do Rio Grande do Sul (Fiergs), Heitor José Müller, ao avaliar a elevação da Selic para 8,50% ao ano.
O presidente da Fiergs destacou ainda que a atividade da indústria gaúcha permanece instável, alternando ao longo do ano períodos de crescimento e retrações. A queda mais recente ocorreu na passagem de abril para maio (-1,8%).
Corte de gastos é mais eficiente do que alta de juros, dizem entidades
Na avaliação da CNDL (Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas) e do SPC Brasil (Serviço de Proteção ao Crédito), a política de aumento dos juros sem contenção de gastos públicos está abaixando os patamares de crescimento do País. “Neste momento, o governo brasileiro deveria fazer um sacrifício político e enxugar as despesas públicas para controlar a inflação. Aumentar os juros é um remédio que deve ser usado somente em último caso, porque reduz o consumo, diminui os investimentos e piora a situação das famílias endividadas”, afirmou, em nota, o presidente da CNDL, Roque Pellizzaro Júnior.
Segundo a Firjan (Federação das Indústrias do Rio), a nova alta era previsível, levando-se em consideração que a inflação medida pelo IPCA (índice oficial do governo) ultrapassou pela segunda vez no ano a meta estabelecida. A entidade também defendeu os cortes de gastos públicos.
“O sistema Firjan reforça a importância da adoção de uma política fiscal norteada pela redução dos gastos correntes e que efetivamente reduza a pressão exercida pelo consumo do governo sobre a inflação. Essa política deve ser pautada por mudanças institucionais que sinalizem maior responsabilidade fiscal, incluindo o comprometimento com um superávit primário maior para os próximos anos, livre de artifícios contábeis, bem como o estabelecimento de limites para o crescimento das despesas públicas.”
Para a CNI (Confederação Nacional da Indústria), o aumento da Selic é justificado pela elevação do IPCA, mas alerta que o ônus do controle dos preços não pode recair sobre o setor produtivo. “Não se pode negligenciar os efeitos negativos da elevação dos juros sobre a recuperação econômica”, afirma a instituição em nota. A entidade afirma que é necessária uma revisão da combinação de políticas fiscal e monetária, além de se readequar o ritmo de expansão dos gastos públicos.
A Força Sindical classificou o aumento como nefasto para a economia. “Essa medida mostra claramente a opção da equipe econômica do atual governo, amparada por insensíveis tecnocratas, de continuar privilegiando os especuladores, deixando em segundo plano a produção e a geração de novos empregos”, disse a central sindical em nota distribuída à imprensa, assinada pelo presidente da Força Sindical, Paulo Pereira da Silva (Paulinho). Na visão do sindicalista, o aumento do juro básico da economia contraria os “pilares” da política de governo voltada para a geração de empregos e distribuição de renda. Além disso, a alta se dá em um cenário político conturbado pela queda na produção e no emprego.
Ao contrário das demais entidades, a Fecomercio-SP (Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo) encarou como positivo o aumento da Selic. A federação afirmou que, mesmo que o nível de atividade não esteja em recuperação e que o mercado de trabalho apresente sinais de enfraquecimento, a alta é a melhor alternativa para combater a inflação.
Segundo a entidade, a desoneração de alguns setores não apresentou os efeitos esperados no nível de crescimento e de investimento da economia, não deixando outra opção ao governo que não fosse o aumento da taxa. “A Fecomercio-SP estima que o ciclo de aumentos na Selic só será interrompido quando os números do IPCA voltarem a ficar perto do centro da meta de inflação (4,5%)”, afirmou a entidade em nota.
Poupança rende mais que inflação
A elevação da taxa Selic para 8,5% ao ano beneficiou a poupança. Por causa da fórmula em vigor desde o ano passado, que atrelou a remuneração da caderneta aos juros básicos, o rendimento da aplicação subiu de 5,6% para mais de 6% ao ano, fazendo a poupança render mais que a inflação estimada para 2013.
O cálculo considera os juros básicos e também a taxa referencial (TR), que volta a incidir sobre os rendimentos quando a taxa Selic fica maior que 8% ao ano. A TR é variável e depende das expectativas do mercado, mas, segundo cálculos da própria equipe econômica, o rendimento final poderia ficar em até 6,17% ao ano. Sem a TR, o rendimento final da poupança corresponderia a 5,95% por ano.
Pela regra em vigor, quando a taxa Selic está maior que 8,5% ao ano, a poupança rende 0,5% ao mês (6,17% ao ano) mais a TR. Quando os juros básicos da economia estão iguais ou inferiores a 8,5% ao ano, a caderneta rende 70% da taxa Selic mais a TR.
A fórmula só vale para o dinheiro depositado na poupança a partir de 4 de maio de 2012. Para os depósitos anteriores, o rendimento segue a regra antiga, de 0,5% ao mês mais a TR. Os demais direitos de quem aplica na caderneta foram mantidos, como a isenção de taxa de administração e de impostos. Segundo o boletim Focus, a inflação oficial pelo IPCA deverá fechar o ano em 5,81%.
Fonte: Jornal do Commercio (POA)
PUBLICIDADE