Em parecer, pasta conclui que taxa impacta a cadeia logística de transporte portuário e termina por prejudicar o consumidor final dos produtos; tema é alvo de disputas há O Ministério da Economia concluiu que a cobrança de uma tarifa adicional por operadores portuários para separação e entrega de contêineres nos portos é anticoncorrencial e gerou um prejuízo de R$ 720 milhões em 2021 ao mercado. Em parecer da Secretaria de Advocacia da Concorrência e Competitividade (Seae), a pasta conclui que a taxa impacta a cadeia logística de transporte portuário e termina por prejudicar o consumidor final dos produtos.
O tema é alvo de disputas há décadas no Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), na Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq) e no Poder Judiciário. Os operadores portuários já cobram uma taxa básica, mas, em alguns casos, as empresas têm que pagar uma segunda taxa - SSE/THC2 (Serviço de Segregação e Entrega ou Terminal Handling Charge 2) - para “segregação e entrega de contêineres”.
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Os operadores portuários afirmam que a cobrança da tarifa é justificada porque usualmente essas empresas também prestam serviços de armazenagem de contêineres. Assim, se a mercadoria precisa ser segregada e entregue a outras empresas concorrentes, haveria mais trabalho e, portanto, mais custos. Já os armadores - que são os responsáveis pelo transporte marítimo e entrega da carga do importador que o contratou no porto de destino -, contestam a cobrança e afirmam que a tarifa básica já cobre todos os custos e que outra taxa seria prejudicial à concorrência.
Desde o ano passado, há um memorando de entendimentos firmado entre Cade e Antaq que permite a cobrança da tarifa. No parecer, a Seae recomenda que a agência reguladora do setor altere sua resolução normativa que possibilita a cobrança, classificada anticompetitiva. “A atual regulação promovida pela Antaq se mostra lesiva à concorrência no mercado de armazenagem alfandegada”, conclui a Seae.
O Ministério da Economia também encaminha o processo à Advocacia-Geral da União (AGU), tendo em vista que a norma da Antaq pode contrariar a Lei de Liberdade Econômica. O Ministério da Infraestrutura também é notificado do parecer.
Apesar de se tratar somente de um parecer, sem força de determinação, pessoas envolvidas na discussão afirmam que o estudo da Seae pode dar argumentos às discussões, principalmente no Poder Judiciário, que há anos se divide sobre a possibilidade ou não da cobrança.
A análise da Seae foi feita após denúncia recebida por meio da Frente Intensiva de Avaliação Regulatória e Concorrencial (Fiarc), mecanismo criado pela pasta econômica para analisar potenciais prejuízos que determinadas regulações causam ao ambiente de negócios, principalmente infrações à concorrência.
Após receber uma queixa de abuso regulatório, as conclusões do Fiarc podem ser de três tipos: bandeira verde, quando não há prejuízos à concorrência; bandeira amarela, quando é possível que a regulação seja aperfeiçoada ou bandeira vermelha, quando determinada regra tem caráter anticompetitivo.
A cobrança da tarifa, de acordo com o Fiarc, “se classifica como sendo de bandeira vermelha”, uma vez que a permissão para cobrança do SSE/THC 2, particularmente no atual formato, traz caráter anticompetitivo, “sendo verificados fortes indícios de presença de abuso regulatório que acarreta distorção concorrencial”. Os prejuízos, de acordo com o órgão, foram de R$ 720 milhões em 2021 e, em média, de R$ 664 milhões desde 2019.
“O parecer é consistente com posições anteriores do próprio Ministério e com a jurisprudência do Cade. Esperamos que a Antaq mude seu posicionamento, em linha com a visão da equipe econômica”, afirmou ao Estadão/Broadcast o advogado Francisco Todorov, que defende a Usuport, autora da denúncia à Seae.
Cade
O Cade, até o ano passado, tinha posição majoritária consolidada no sentido de que a cobrança da THC2 era ilegal. No último dia do mandato do ex-presidente Alexandre Barreto, entretanto, a autarquia assinou um memorando de entendimentos com a Antaq permitindo a cobrança, sem que o texto fosse discutido com os demais integrantes do conselho.
A assinatura foi feita em cerimônia na Antaq e contou com a presença do ministro da Infraestrutura, Tarcísio Freitas, e do então superintendente-geral do Cade Alexandre Cordeiro, que hoje preside o órgão. Pouco depois, Barreto foi indicado ao cargo de superintendente-geral da autarquia antitruste e ainda aguarda ser sabatinado pelo Senado.
No memorando assinado com a Antaq, o Cade prevê que a taxa por si só não é irregular e só pode ser considerada lesiva à concorrência se forem verificados aspectos como abusividade dos valores aplicados, o caráter discriminatório da cobrança, e a falta de racionalidade econômica.
Além disso, o texto determina que, caso o Cade identifique irregularidades, formulará uma consulta prévia à Antaq sobre a existência ou não de abusividade. Diferentemente do Cade, o memorando foi ratificado pela diretoria colegiada da Antaq.
No fim do ano, uma ala do Cade crítica às posições de Barreto e Cordeiro tentou derrubar o memorando em plenário, mas o atual presidente se recusou a pautar o texto.
Fonte: Estadão