As indústrias do Rio Grande do Sul decidiram mudar o foco da negociação política em 2012, ao menos no que se refere à carga tributária. A briga passa da insistência pela redução das alíquotas para um pedido de legislação simplificada, meta a ser priorizada pela Federação das Indústrias do Estado (Fiergs), conforme o Jornal do Comércio noticiou ontem. "Se essa é a carga que o governo quer arrecadar, muito bem. Mas queremos que, pelo menos, as regras sejam claras", explica o presidente da Associação das Indústrias de Móveis do Estado, Ivo Cansan.
Segundo o industrial, o emaranhado de impostos, taxas e contribuições é muito grande e vem se complicando com intensidade há pelo menos cinco anos. "Dez anos atrás, as empresas tinham duas pessoas trabalhando na área contábil. Hoje, há tanta gente nesse setor quanto tem no departamento comercial e, ainda assim, ninguém tem certeza absoluta de que está recolhendo os impostos da forma correta, pois a cada dia tem uma novidade ou uma condicionante diferente. É impressionante", afirma.
O advogado tributarista Cristiano Xavier ajuda a mensurar o problema: "Temos mais de 65 tipos diferentes de tributos, entre federais, estaduais e municipais, e outros milhares de alíquotas e bases de cálculos que incidem em praticamente todas as operações do dia a dia. A carga é elevada e a cobrança é complexa, o que retira competitividade das nossas empresas frente às concorrentes internacionais", aponta.
O especialista lembra que o Banco Mundial estima que a competitividade brasileira em 2012 seja um pouco pior em função da carga tributária. No ranking que considera 180 países, o Brasil passou da 148ª posição em 2011 para o 150º lugar na projeção de 2012 - fundamentalmente porque aqui são necessárias 2,6 mil horas para o pagamento dos tributos a cada ano, enquanto a média dos países da América Latina e do Caribe é de 386 horas e 186 horas nos países da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômica (OCDE). Os impostos brasileiros, detalha Xavier, comprometem até 67,1% do lucro das empresas, enquanto nas demais países da região, o índice fica em 47,7%, frente a 42,7% na OCDE.
Cansan acredita que um número bastante reduzido de impostos seja suficiente para atender às necessidades de financiamento dos governos e, ao mesmo tempo, ajude as empresas a avaliar seus compromissos e a planejar suas atividades. Ele argumenta que a clareza nas regras é fundamental para que os empresários - sobretudo os micro, pequenos e médios, que predominam em setores como o moveleiro - consigam concentrar seus esforços em inovação e competitividade.
O presidente da Movergs afirma que mesmo as medidas que beneficiam os setores produtivos, como o Reintegra, geram muitas dúvidas entre o empresariado e os contadores. E a complexidade é tamanha que, muitas vezes, nem as próprias entidades setoriais conseguem elucidar. "A crise é uma consequência econômica, já a questão tributária é mais complicada e perigosa. Pois as regras mudam muito e, de uma hora para outra, uma decisão do governo ou da Justiça pode abrir um passivo enorme", afirmou. Já Xavier afirma que não é raro ver a própria Receita Federal dar orientações divergentes para consultas sobre o mesmo tema.
Preços para consumidor e salários dos trabalhadores sofrem impacto do excesso de taxas
O diretor-executivo da Associação Brasileira das Indústrias de Calçados (Abicalçados), Rogério Dreyer, explica que o impacto da carga tributária e da complexidade burocrática é sentido diretamente nos preços finais e nos salários pagos. Para ele, o problema se agrava quando a indústria nacional tem que competir com produtos feitos em outros países, sem a mesma carga, ou com quem sonega. A expectativa do industrial é que a medida que substituiu a tributação de 20% sobre a folha de pagamento por 1,5% sobre o faturamento dê resultados positivos. "Se o Reintegra tivesse saído dois anos atrás, o panorama hoje seria outro. Mas vamos ver a repercussão", diz, ao ressaltar que a indústria depende de custos adequados para não ser alijada do mercado pela concorrência - assim, com carga tributária alta, acaba limitando sua capacidade de oferecer bons salários.
O presidente do Sindicato das Indústrias Metalúrgicas, Mecânicas e de Material Elétrico e Eletrônico (Sinmetal), Gilberto Porcello Petry, afirma que o que está em jogo é a capacidade de repassar o peso da carga tributária para o consumidor - que é cada vez menor. "Se sou uma Petrobras, repasso a carga tributária sem problemas. Ou o consumidor paga o preço do combustível que eu estou cobrando, ou deixa o carro na garagem. Já para outras empresas não funciona assim, se os preços acompanham a escalada dos impostos, elas perdem clientes. Então essa diferença sai das margens de lucro e, num extremo, leva a empresa a um desequilíbrio financeiro que pode resultar em fechamento ou, ainda, à sonegação", descreve.
Os efeitos, conforme alerta o vice-presidente para o Rio Grande do Sul da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq), Ernani Cauduro, podem ser ainda mais graves. Ele argumenta que ao taxar a venda das máquinas e dos equipamentos, usados basicamente no processo de industrialização, o Brasil desestimula a geração de tecnologia nacional. "Uma máquina produzida aqui é, via de regra, 43,8% mais cara que um equipamento similar produzido na Alemanha, porque, como é comum em outros países, lá não se taxa a produção de máquinas industriais. Imaginando que estamos tratando de algo aplicado na indústria moveleira, por exemplo, o efeito dessa baixa competitividade é que, ao longo do tempo, praticamente deixaremos de fornecer para essa indústria e passaremos a depender de tecnologia estrangeira. Estrategicamente isso é ruim para o País", diz o representante da Abimaq.
Fonte:Jornal do Commercio (RS)/Clarisse de Freitas
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