O minério de ferro deveria reinstaurar a cotação por contratos anuais, segundo um ex-executivo da mineradora Rio Tinto. Ele está errado. Mal Randall, que passou mais de 25 anos na Rio Tinto e ajudou a criar uma mineradora de minério na Austrália, disse que a passagem a uma precificação à vista para o minério de ferro a partir de 2010 foi um desastre, segundo noticiado pelo "Australian Financial Review", ontem. Até há alguns anos, o minério de ferro era precificado em negociações anuais entre siderúrgicas e suas fornecedoras, em grande parte australianas.
Isso mudou, em grande parte a pedido do ex-executivo-chefe da BHP Billiton Marius Kloppers, que queria aproveitar a falta de oferta para obter maiores retornos em suas minas de minério de ferro.
PUBLICIDADE
"Isso foi orquestrado e criado por um sujeito que não tem responsabilidades [no setor], Kloppers que comandava a BHP", disse Randall, de acordo com o jornal australiano. "Foi ótimo fazer essas mudanças e, então, ele se foi".
Em vez de voltar aos contratos modelados a portas fechadas, seria melhor buscar aumento na transparência
Randall, que agora preside a empresa de areias minerais MZI Resources, está correto em dizer que os preços no mercado à vista não favorecem mais as grandes mineradoras. BHP Billiton, Rio Tinto e a Vale colheram os benefícios da mudança no período inicial em que a demanda chinesa por minério de ferro superava a oferta disponível, o que levou os preços à vista a patamares recorde.
O preço à vista na Ásia pelo minério de ferro chegou a US$ 191,90 por tonelada em fevereiro de 2011. Desde então, caiu 67%, para US$ 63,40, em 18 de fevereiro, o dia mais recente de negociações antes dos feriados do Ano Novo chinês.
A razão por trás do grande declínio, no entanto, não é a mudança para os preços à vista ou mesmo a manipulação de mercado pelos comercializadores, como sustentado por Randall no artigo.
O motivo, simplesmente, é que as grandes mineradoras de minério trouxeram oferta demais ao mercado ao mesmo tempo em que a demanda chinesa por aço parece estar chegando a seu pico.
As três grandes mineradoras, juntamente com a quarta, Fortescue Metals, encaminham-se a aumentar a capacidade de produção de minério de ferro em cerca de 400 milhões de toneladas anuais.
Embora as maiores mineradoras tenham obtido certo sucesso em usar suas grandes minas de baixo custo para prejudicar as concorrentes de alto custo, elas estão com tanta oferta que o mercado foi inundado por minério de ferro.
Randall, de fato, também criticou os planos de expansão das grandes mineradoras, mas sua opinião de que os preços à vista estão sujeitos à manipulação de comercializadores provavelmente precisa ser mais analisada.
Embora o mercado de ferro ainda esteja relativamente engatinhando em termos de abertura e transparência, nos últimos anos progrediu muito, com swaps e contratos futuros sendo negociados em Cingapura e na China.
Randall pode confortar-se com o fato de que as autoridades chinesas também acreditavam em 2012 que o minério era manipulado, mas culpavam os produtores por elevar o preço artificialmente ao segurar os carregamentos.
Os chineses, no entanto, se silenciaram quando o preço do minério despencou entre julho e setembro daquele ano, em meio às notícias de que comercializadores chineses estavam deixando de pagar carregamentos, só para comprá-los posteriormente a preços mais baixos.
A questão é que tanto produtores quanto compradores muitas vezes veem manipulação do mercado quando os preços não se movem na direção desejada, mas é muito difícil ver qualquer esforço sustentado de qualquer parte na distorção do mercado.
Embora os comercializadores tenham capacidade para influenciar as cotações de curto prazo por meio de ações no mercado, tentar isso por períodos mais longos normalmente resulta em correções significativas, evento em que os comercializadores com posições erradas perdem pesadamente.
Em vez de voltar aos contratos opacos modelados a portas fechadas, o mercado estaria em melhor situação com aumento na transparência, como com contratos futuros com entrega física, similares aos do mercado petrolífero.
Também é provável que as siderúrgicas chinesas não aceitem o retorno dos contratos de longo prazo. Tendo em vista que estão no volante, por que deveriam?
A mudança para os preços à vista tornou o minério de ferro mais volátil e isso nem sempre está no interesse dos produtores ou compradores, mas ainda assim é a melhor alternativa.
Também permite que o mercado e os investidores vejam, relativamente, em tempo real as consequências dos planos de expansão das grandes mineradoras.
Culpar Kloppers por arruinar o mercado de minério ao torná-lo mais aberto e com preços à vista é fora de propósito. Ele, assim como outros executivos do setor de minério, pode ser culpado, sim, por suposições ousadas quanto à demanda e por previsões irremediavelmente erradas quanto à oferta que resultaram na onda de minério que inundou o mercado.
Fonte: Valor Econômico/Clyde Russell | Reuters, de Launceston