A demanda por lanchas e iates, que cresceu no ano passado, continua aquecida nos primeiros meses deste ano. O isolamento social, as restrições a viagens e até os juros baixos são apontados pelos fabricantes como razões para o aumento das vendas de barcos de luxo.
“Compre um barco e ganhe uma ilha”. O slogan, cunhado por um amigo, é usado por Eduardo Colunna para justificar o aquecimento do mercado de lanchas e iates no Brasil. “O barco não deixa de ser uma forma de isolamento”, diz o executivo do ramo e presidente da Associação Brasileira dos Construtores de Barcos e seus Implementos (Acobar).
Duas das maiores empresas do segmento no país - a brasileira Intermarine e a italiana Azimut - não só passaram incólumes pela recessão de 2020 como seguem com a carteira de encomendas abarrotada. Colunna estima que a receita do segmento tenha crescido 20%, em média, no ano passado ante 2019.
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Depois da inquietação provocada no primeiro semestre pela chegada da pandemia ao Brasil, os fabricantes de barcos perceberam um aumento da procura pelo produto entre julho e agosto, conta o presidente da Acobar. A partir de setembro, a procura se converteu em negócios.
“Todo o nosso plano de produção deste ano e do próximo está ‘sold out’ [vendido]”, diz Roberta Ramalho, presidente-executiva da Intermarine (ver ao lado).
Dados compilados pela Acobar junto ao Departamento de Portos e Costas (DPC), da Marinha do Brasil, indicam que há 690 mil barcos ativos no país. O número abrange embarcações de todos os portes e finalidades. O total de profissionais habilitados a atuar em atividades de navegação é de 1,013 milhão, incluindo capitães e pilotos de jet ski, entre outros. “Ainda temos 300 mil barcos para vender”, brinca Colunna, referindo-se à diferença entre a quantidade de profissionais e embarcações.
Fabricantes como a Intermarine miram uma fatia muito específica desse público, a que abriga o consumidor de alta renda. Na Azimut, o preço de um iate de 88 pés (cerca de 27 metros) ultrapassa US$ 10 milhões (mais de R$ 55 milhões). Feito de fibra de carbono, material usado na Fórmula 1 e em foguetes, o modelo vem equipado com banheira de hidromassagem e tem garagem na popa (a parte de trás do barco) capaz de acomodar uma pequena embarcação.
“Cinco anos atrás produzíamos embarcações de 42 a 50 pés, mas a demanda sofreu muito com a crise econômica”, diz o italiano Davide Breviglieri, presidente-executivo da Azimut no Brasil. Para reverter a queda nos negócios, a saída foi ampliar o tamanho dos barcos, de forma a atrair outras faixas de consumidores. E, também, fortalecer as exportações, como proteção natural contra as variações da taxa de câmbio. A estratégia produziu resultados, mesmo em meio à crise provocada pela pandemia. O faturamento no período de 12 meses encerrado em 30 de setembro de 2020 cresceu 25%.
Para o mesmo período de 2021/2022, a expectativa de Breviglieri é de um percentual de expansão da receita no patamar de dois dígitos, entre 18% e 20%. “Estamos com 90% do nosso portfólio vendido até fevereiro, março de 2022”, diz o executivo, referindo-se às encomendas que terão de ser atendidas pela fábrica de Itajaí (SC), aberta em 2010.
O bom momento para os fabricantes de barcos e iates se reflete também nas marinas que abrigam estas embarcações. Entre fevereiro de 2020 e o mesmo mês deste ano, a BR Marinas viu o número de vagas molhadas ocupadas subir 12%. “O resultado surpreendeu muito”, diz Gabriela Lobato, presidente-executiva da BR Marinas.
A empresa tem oito marinas no Estado do Rio de Janeiro, que abrigam 1.646 barcos. No ano passado, o faturamento somou R$ 70 milhões, mesmo patamar de 2019, apesar da interrupção na programação de eventos das marinas por causa da covid-19. A maior demanda por vagas e serviços levou a BR Marinas a traçar planos para a entrada em São Paulo. “Vamos ter mais duas marinas este ano”, diz Gabriela, sem especificar o local exato das novas unidades.
A pandemia não impediu a realização da feira São Paulo Boat Show, em novembro do ano passado, numa versão híbrida (presencial e virtual). “O mercado estava aquecido e os expositores estavam pedindo”, diz Ernani Paciornik, presidente do Grupo Náutica, organizador do evento. Para respeitar as normas sanitárias vigentes, a feira foi transferida a um espaço aberto - a raia olímpica da Universidade de São Paulo (USP). Movimentou R$ 155 milhões, com 215 embarcações vendidas.
Entre as consequências negativas da pandemia para a indústria náutica, tanto Roberta, da Intermarine, como Davide, da Azimu, apontam a escassez de matérias-primas e de componentes como uma das maiores dores-de-cabeça. Os fabricantes de barcos relatam falta de insumos básicos como inox, vidros e até espuma.
Fonte: Valor