A ligeira valorização do real frente ao dólar registrada no primeiro trimestre e preços das commodities mais estáveis devem garantir algum alívio no nível de endividamento de algumas companhias e colaborar para que as exportadoras sejam o ponto de destaque na temporada de balanços das companhias brasileiras.
As companhias voltadas para o mercado doméstico, por outro lado, devem sentir os efeitos da crise econômica e o agravamento das incertezas políticas nos três primeiros meses de 2016.
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Na comparação com o encerramento do quarto trimestre, a cotação do dólar no último dia de março apresentou um recuo de 9%, o que deve retirar parte da pressão sobre o nível de endividamento das empresas expostas ao dólar. Para efeito de comparação, no fim do primeiro trimestre de 2015, a cotação do dólar havia subido 21% no período.
O dólar médio a R$ 3,90 nos três primeiros meses de 2016, 36% superior ao registrado no mesmo período do ano passado, deve beneficiar o resultado das companhias com negócios no exterior.
O Itaú BBA aposta que a variação cambial menos brusca e a relativa estabilidade das commodities, além de bases de comparação mais fracas no caso de algumas empresas, devam ajudar a aliviar o impacto sobre os balanços, além de oferecer trégua às ações.
Assim, São Martinho, Raia Drogasil, Smiles, Multiplus, Braskem, Comgás, Cosan e Vale devem registrar os melhores desempenhos do trimestre, na opinião do Itaú BBA. A estimativa é que as receitas agregadas de 108 empresas brasileiras cobertas pelo banco avancem 10% no trimestre na comparação anual, enquanto o lucro líquido conjunto deve subir 142%, também no ano contra ano.
Casos como o da Vale merecem atenção, principalmente porque, após registrar perdas de R$ 9 bilhões no primeiro trimestre de 2015, a estimativa é que a empresa reporte números melhores.
Na visão do UBS, é por essa base de comparação mais favorável que o consenso do mercado aponta para alta de 30% no lucro das empresas brasileiras no trimestre, enquanto as receitas congregadas devem expandir 13%.
"A maior parte das exportadoras devem colher benefícios das margens líquidas, como resultado da apreciação do real traduzido em ganhos para as companhias com dívida em dólar e devido ao aumento do preço médio das commodities - de dois dígitos para o minério de ferro e o aço", diz o banco.
Outros expoentes positivos são o setor de saúde, cujos resultados devem crescer 70%, e de telecomunicações, com avanço de 50%. Na ponta mais fraca, as companhias de petróleo e gás (-80%) e energia (-27%) devem chamar mais a atenção. A operadora de cartões Cielo, a empresa de logística Rumo, a elétrica Cteep (Transmissão Paulista) e a empresa do setor de educação Kroton são as principais apostas do UBS para o período.
O Itaú BBA cita o "modesto crescimento" da América Latina como um todo, sem indícios de que ainda este ano haja alguma recuperação. O banco classifica a crise no Brasil como "inabalável" e aposta que empresas como Marcopolo, Via Varejo e Usiminas entrem nos destaques do trimestre do lado negativo.
"Para as companhias brasileiras de shopping centers, esperamos um crescimento [no conceito] 'mesmas lojas' [unidades abertas há mais de um ano] ainda resiliente, já que os contratos são indexados à inflação, mas um crescimento 'mesmas lojas' estável no ano contra ano, devido a uma base de comparação suave e a um desempenho de vendas surpreendente entre janeiro e fevereiro, parcialmente compensado por um enfraquecimento em março", diz o BBA.
Mário Roberto Mariante, analista-chefe da corretora Planner, enxerga um trimestre igualmente difícil como foi o quarto, além de alguns setores sendo afetados pela sazonalidade, como o varejo.
A desvalorização do real frente ao dólar, na visão do economista, mesmo que em um patamar ligeiramente inferior ao trimestre passado, deve continuar a afetar os balanços das companhias e expor mais ações para reduzir a alavancagem. "Muitas empresas começaram a se preocupar com a dívida, alongando seus vencimentos. É um ponto de preocupação com as vendas baixas e a margem baixa, por razões óbvias", defende Mariante.
O representante da casa de análise indica que o alongamento da dívida tornou-se uma alternativa a possíveis vendas de ativos, uma vez que o mercado de aquisições também está contraído.
É do J.P. Morgan que vêm as avaliações mais duras para o trimestre no Brasil. Para a instituição financeira, de um total de dez setores avaliados, apenas tecnologia da informação deverá apresentar um aumento das receitas no primeiro trimestre, de 5%, em base anual. Ainda assim, o lucro conjunto das companhias desse setor deve recuar 23%. O banco, porém, utiliza métricas em dólar para medir o desempenho das empresas.
"O Brasil deve ter uma aceleração da atividade doméstica enquanto as taxas de juros permanecerem nos atuais patamares, mas essa relativamente boa condição deve ser ofuscada pelo ambiente de baixa base de crescimento deixado no quarto trimestre", afirma o J.P., em relatório.
Primeira a divulgar o balanço do primeiro trimestre, a Springs Global, controlada da Coteminas e dona das marcas Artex, Santista e MMartan, reportou na terça-feira um prejuízo líquido de R$ 22,2 milhões, contra um ganho de R$ 6,6 milhões de janeiro a março de 2015. A fabricante de máquinas e equipamentos WEG, segunda a divulgar os dados, registrou lucro líquido de R$ 282,4 milhões no intervalo, aumento de 14,9% em base anual.
Fonte: Valor Econômico/Juliana Machado e Rodrigo Rocha | De São Paulo