A crise econômica mundial, que levou a uma forte retração na demanda de aço, ainda não acabou de vez para as siderúrgicas instaladas no país. Elas enfrentam a concorrência acirrada de material importado - cerca de 20% do consumo do mercado interno até agosto -, queda nos preços e mercado externo ainda fraco e com excesso de oferta.
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O reflexo disso, avaliam analistas de bancos que acompanham do setor, serão resultados menores neste semestre. Relatório da Itaú Securities projeta retração de 15% a 20% nas vendas domésticas deste trimestre e queda de 5% nos preços, além de aumento das exportações, que têm menores margens de ganho. "Nosso Ebitda (resultado operacional) do semestre para a Usiminas se situa 10% abaixo do consenso do mercado", informou.
A ArcelorMittal Tubarão, controlada de aços planos da lider mundial ArcelorMittal, ainda mantém paralisado seu alto-forno nº 2 desde dezembro de 2008, momento crítico da crise. A empresa chegou a anunciar a volta dele em abril deste ano, mas teve de adiar sua decisão. O aço desse forno é destinado à fabricação de placas para exportação ao mercado europeu, o qual ainda continua deprimido e sem perspectivas de melhoria no curto e médio prazos.
A empresa informou, por meio da assessoria de imprensa, que não tem data prevista para religamento do equipamento. Houve duas tentativas de reacendê-lo, em maio e junho, sem sucesso. "Está todo pronto para a retomada, mas continua parado devido à fraca situação do mercado internacional de aço", afirmou.
Segundo apurou o Valor, com preços das placas em baixa, na faixa de US$ 500 a a US$ 530 a tonelada, o aumento da ordem de 100% nos dos preços do minério de ferro e do carvão a partir de abril tornou inviável a retomada do alto-forno de Tubarão, que tem capacidade para produzir 1,2 milhão de toneladas por ano - 15% da capacidade total da siderúrgica. Os dois outros fornos estão operando normalmente.
A Cia. Siderúrgica Nacional (CSN), conforme, conforme informações obtidas pelo Valor, fará antecipações breves, de dois a três dias, de manutenções previstas em suas linhas de produção para fazer um ajuste nos elevados estoques de produtos acabados na usina da Volta Redonda (RJ). São consideradas ações pontuais. Procurada, a assessoria informou que a empresa preferia não se pronunciar sobre esse assunto.
Esse ajuste está sendo complementado por remanejamentos de parte do material para suas controladas nos Estado Unidos e Portugal. Essas unidades deixariam de comprar boa parte do aço que necessitam nos dois mercados e passariam a usar produto de sua controladora no Brasil.
No mercado interno, as três siderúrgicas de aços planos - CSN, Usiminas e ArcelorMittal - viram seus mercados - automotivo, construção civil, linha branca, máquinas e equipamentos - se contrair com a forte entrada de aços importados de várias partes do mundo, principalmente da Ásia. Ao todo, de janeiro a agosto, as importações desse tipo de aço somaram 2,55 milhões de toneladas, quase 70% de todo o aço internado pelo país no período: 3,8 milhões de toneladas. "As importações se transformaram no quarto 'player' do mercado brasileiro este ano", comentam analistas e especialistas do setor.
Com o aquecimento da demanda, por conta do reaquecimento da economia brasileira, com o PIB estimado em 7% a 7,5%, o consumo nacional de aço deverá bater recorde histórico. Se mantiver o ritmo atual, deverá fechar o ano em 27 milhões de toneladas. O Instituto Aço Brasil (IABr) deverá rever sua última projeção, de 25 milhões de toneladas, no fim deste mês, informou Marco Polo de Mello Lopes, presidente-executivo da entidade.
Mas, comenta Lopes, não são as usinas brasileiras que estão se beneficiando dessa exuberância do mercado. "São as usinas chinesas, russas, coreanas, espanholas, de Taiwan e ucranianas, de onde vem a maioria das importações". Segundo ele, a maior parte desse material entra com o estímulo do dólar desvalorizado em 20%, a moeda chinesa subvalorizada em 40% e incentivos concedidos por governos de diversos Estados brasileiros, numa 'verdadeira guerra fiscal'. "Estão criando emprego na Coreia", diz.
Levantamento, com base em números do Ministério do Desenvolvimento (MDIC), aponta que os portos de São Francisco do Sul (SC), de Pecém (CE), Santos (SP), Vitória (ES), Paranaguá (PR) e Suape (ES) responderam por mais da metade do aço plano que entrou no país até junho. O porto catarinense recebeu no período quase meio milhão de toneladas.
"Todo mundo viu este ano uma oportunidade de ganhar dinheiro no mercado de aço. Até gente que nunca havia comprado sequer um quilo do produto", comentou um executivo do setor. O rol de nomes vai de tradings, distribuidores tradicionais e novatos, montadoras de automóveis, como Fiat e Wolkswagen, fabricantes de autopeças, de máquinas e equipamentos e de linha branca até estaleiros navais e fabricantes de tubos, como Confab.
A longa lista inclui algumas siderúrgicas, visando para complementar o atendimento de clientes, principalmente montadoras. Além de Usiminas, CSN e ArcelorMittal aparecem ThyssenKrupp, Vallourec e Corus.
O IABr deverá também rever as 4,2 milhões de toneladas que previu de importações de aços planos, longos e especiais para 2010. Lopes evita falar no novo número, fontes do setor já apontam 5 milhões de toneladas - um quinto do consumo previsto e correspondente a 15% da produção do país
Para conter a perda de mercado, CSN, Usiminas e Mittal tiveram de reduzir drasticamente os prêmios cobrados nas vendas de seus produtos a partir de agosto. "Já se compra aço no mesmo preço do importado", informa um distribuidor. Os prêmios de até 25% do início do ano praticamente sumiram. "Deverão ser de no máximo 8% a 10%; assim, toda a cadeia vai sair ganhando e aventureiros não terão espaço", admite um executivo.
Em agosto, com essa estratégia, ameaças de ações antidumping e sinalização do governo em valorizar o dólar, os novos pedidos de importações caíram cerca de 80%. "Hoje, ninguém mais está se arriscando", relata uma fonte.
Fonte: valor Econômico/Ivo Ribeiro | De São Paulo