Para que um livro ou caderno produzido no Brasil possa ser vendido na Argentina, o exportador precisa obter um atestado de laboratório argentino provando que a tinta não faz mal à saúde.
No Japão, bolachas e biscoitos brasileiros com certa dose de conservantes não entram. Os Estados Unidos costumam sobretaxar lotes de sucos de laranja mais doces vindos do Brasil.
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São barreiras técnicas que muitas vezes passam invisíveis nos acordos de abertura comercial e drenam a capacidade de competir de empresas exportadoras brasileiras.
Estudo encomendado pela CNI (Confederação Nacional da Indústria) à Fundação Getulio Vargas mostra que o Brasil poderia ter exportado 14% a mais no ano passado, não fossem essas barreiras, o que significou US$ 30 bilhões a menos para o país.
Um dos problemas para reduzir esses entraves ou mesmo para eliminá-los é que são de difícil identificação.
Muitas vezes, as barreiras não são explícitas ou mudam de acordo com país ou produto de origem.
O governo brasileiro finaliza a elaboração de uma plataforma em que exportadores poderão denunciar casos quando desconfiarem de que há uma barreira técnica.
A iniciativa mobiliza três ministérios (Indústria, Comércio Exterior e Serviços, Agricultura e Relações Exteriores), além de Anvisa e Inmetro. Segundo fontes governamentais, o sistema está pronto, deve se chamar "Sem Barreiras" e tem previsão de lançamento em novembro.
A visão oficial é que o tema vem se tornando cada vez mais relevante, dado o declínio das tarifas alfandegárias.
O assunto toca especialmente o Brasil, que neste momento negocia acordos de abertura comercial com União Europeia e México, focando principalmente reduções tarifárias e eliminação de cotas de exportação.
MONITORAMENTO
As barreiras técnicas, porém, persistem. Há poucos dias, o embaixador francês no Brasil, Michel Miraillet, indicou que a França pretende recorrer à "segurança alimentar" para barrar a carne do Mercosul, tendo em vista as falhas na fiscalização expostas na Operação Carne Fraca.
A gerente de política comercial da CNI, Constanza Negri, diz que, afora países como EUA, Coreia do Sul e Japão, são raros os que têm um sistema de acompanhamento permanente de barreiras.
O Brasil será o primeiro latino-americano. "O monitoramento de barreiras é claramente uma estratégia de ampliar o acesso a mercados consumidores", afirma.
O sistema brasileiro será alimentado por exportadores. A ideia é que seja criado um acervo das barreiras que freiam o comércio exterior, o que será útil para empresários que desejem buscar novos mercados. Além disso, pode municiar o governo em negociações comerciais.
Constanza observa que os americanos costumam levar as barreiras técnicas à mesa de negociação, mesclando demandas em questões tarifárias e não tarifárias em acordos de abertura comercial. O Brasil poderia seguir o exemplo.
Em consulta a exportadores, a CNI identificou cerca de cem barreiras técnicas que afetam 50 setores econômicos, industriais e também do agronegócio. A entidade faz pressão para que o governo lance logo a plataforma, em elaboração há meses.
"Sensibilizamos o setor privado para que os empresários passem a entender o que são essas barreiras e deixem de assumi-las como custo, o que reduz a sua capacidade de competir no exterior", disse Constanza.
Fonte: Folha SP