O sucesso das metáforas "guerra cambial" e "tsunami monetário" não encontra paralelo nas estratégias de enfrentamento da crise.
O ministro Mantega tornou-se mundialmente famoso ao cunhar, em 2010, a metáfora "guerra cambial" para caracterizar os problemas que as políticas monetárias expansionistas dos países centrais vinham causando a diversos países emergentes, notadamente o Brasil. Em recente viagem à Alemanha, a presidente Dilma reclamou do "tsunami monetário". Infelizmente, o sucesso das metáforas não se vem se refletindo nas estratégias econômicas de enfrentamento da crise. As reações alvoroçadas do governo sugerem que falta diagnóstico correto das causas dos nossos problemas, assemelhando-se mais a ações paliativas estumadas por lobbies setoriais.
É razoável mostrar preocupação com os efeitos colaterais das políticas monetárias expansionistas dos países centrais. Mas não é razoável esperar que tais queixumes venham a alterar tais políticas. A estratégia brasileira deve levar em conta que o "tsunami monetário" vai continuar enquanto persistir a ameaça recessiva nos EUA, Europa e Japão, empurrando para cá capitais em busca de maiores rendimentos, assim ajudando a apreciar o real.
Não há prova de que as medidas de controle sejam eficazes, a médio prazo, para segurar o câmbio
Ressalte-se que, vista de uma perspectiva mais ampla, a atual situação configura problema certamente muito menos grave do que as repetidas crises que vivemos até 2003, com enormes depreciações cambiais. A vida hoje, sobretudo do pobre, é muito melhor do que quando políticos ganhavam eleições reivindicando salário mínimo de US$ 100, o que corresponderia, hoje, a R$ 176, menos do que 30% do atual valor.
Como tudo que dá para rir, também dá para chorar, o que é renda para o trabalhador, é também custo para a indústria manufatureira, que pena com a concorrência externa. Frente a isso, o que faz o governo? Apesar de se conhecer, desde há muito tempo, fatores que causam o alto custo Brasil (carga tributária em permanente ascensão para financiar o grande e ineficiente setor público, elevados custos associados à mão de obra, infraestrutura deficiente, burocracia custosa e ineficaz, justiça morosa e cara, etc.), tudo que se tem ouvido das autoridades econômicas é que lançarão mão de um "arsenal infinito" para impedir que o real se aprecie, ou que lançarão mão de barreiras fortes para proteger a indústria nacional.
As medidas de controles cambiais, agora entronizadas na ortodoxia via estudos do Fundo Monetário Internacional (FMI), ganharam nova proeminência e credibilidade. O problema é que não há na literatura comprovação de que sejam eficazes, no médio prazo, para depreciar a taxa de câmbio. Caso as economias centrais não voltem a crescer nos próximos meses, a perspectiva é que as políticas monetárias ultraexpansionistas persistam, e, com elas, a entrada excessiva de capitais. As intervenções esterilizadas do Banco Central (BC) ou do Fundo Soberano, via mercado de câmbio à vista ou futuro, são extremamente onerosas. Já os controles de entrada de capitais são sempre porosos. Se durarem muito tempo, acabarão sendo driblados pelas instituições financeiras. Os controles podem ser usados, na melhor das hipóteses, temporariamente, enquanto são tomadas outras medidas, como um ajuste fiscal sério. Fazer dos controles de capitais o ponto central da política econômica é, em médio prazo, estratégia fadada ao fracasso.
Já as medidas protecionistas podem causar dano ainda muito maior à nossa economia. As medidas têm sido invariavelmente casuísticas: um IPI para proteger os carros nacionais, um crédito mais subsidiado para alguns poucos setores que pretensamente empregam mais que os demais, uma isenção para determinados bens, e assim sucessivamente. Nada que, verdadeiramente, ataque nossas reais deficiências. Como já sobejamente demonstrado, as medidas protecionistas são sempre tomadas em caráter temporário, mas tendem invariavelmente a se tornar permanentes, aumentando o custo Brasil e prejudicando ainda mais o aumento da produtividade e competitividade do produto brasileiro. Isso sem contar a perda do prestígio internacional, como demonstrado pela indireta constrangedora da primeira-ministra alemã durante a visita da presidente Dilma.
É sempre bom lembrar que, devido à nossa reduzida capacidade de gerar poupança interna (apenas 17,2% em 2011 contra mais de 40% na China), não parece ser possível atingir a meta de crescimento sustentado a taxas de 4% ou superiores sem contar com significativo ingresso de capital estrangeiro. A posição atual do Brasil como o mercado preferido dos investidores internacionais tem nos permitido contar com os elevados fluxos de capitais necessários para o financiamento do investimento produtivo, indispensável ao crescimento sustentado. Mas outros países também já estiveram em situação parecida, e perderam a oportunidade. Afugentar o capital estrangeiro não é muito difícil, basta errar muito. Mas isso não atende aos interesses de atingir o crescimento sustentado. Melhor seria conviver com a avalanche de capitais fazendo reformas e empreendendo políticas que possam reduzir o custo Brasil.
Fonte: Valor Econômico/Por Márcio Garcia é PhD por Stanford
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